BOMFIM, DA CENTAURO: regras para conviver com o novo presidente da companhia que ele criou / Germano Luders
Da Redação
Publicado em 29 de abril de 2016 às 21h20.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h24.
Em dezembro de 2015, semanas depois de anunciar a promoção do executivo Pedro Zemel, de 32 anos, ao cargo de presidente do Grupo SBF, dono das lojas Centauro e By Tennis, Sebastião Bomfim Filho, fundador e presidente da companhia, tirou 60 dias de férias. Desde que voltou ao batente, em fevereiro de 2016, o empreendedor dá expediente numa sala fechada, enquanto o CEO mantém a mesa no meio da operação. Ao mesmo tempo que muda o comando, a Centauro aproveita a crise para ajustar a operação. Em 2015, a empresa teve um crescimento mínimo de 0,14% e faturou 2,53 bilhões de reais. O novo presidente tem o desafio de cortar custos para passar pela crise e ainda precisa renegociar uma dívida que chegou a 600 milhões de reais. “Será um ano de investimentos menores e maior esforço em eficiência”, diz Bomfim Filho. Bomfim, de 62 anos, falou a EXAME sobre os desafios da sucessão num momento como este.
Como foi a escolha do sucessor?
É difícil encontrar o substituto ideal. A escolha nem sempre é óbvia. Estive muito próximo de contratar um profissional no mercado, mas recuei. Fiz um processo com uma empresa de busca de executivos, chegamos a bons nomes. No final, achei que ninguém tinha o perfil.
Quando o senhor começou a considerar um nome interno?
Alguns anos atrás, quando eu negociava com a GP (fundo de investimento sócio da companhia), tinha um garoto do outro lado da mesa que me impressionou muito. O Pedro Zemel não era o principal negociador do investimento, era o segundo, mas ficou claro que ele estava vibrando com o negócio. Quando terminaram as tratativas de investimento, eu liguei para o Fersen (Lambranho, sócio da GP e presidente do conselho da Centauro) e disse: “Olha só, tô precisando daquele garoto aqui”. Pedro gostava de esporte e achava a companhia superlegal. Quando abriu a possibilidade de vir, ele se agarrou a ela. Seu currículo é especial, ele já tinha MBA em Harvard.
Houve uma preparação para que Zemel se desenvolvesse?
Sim, porque ele veio com uma formação excelente, mas ainda era jovem, estava totalmente cru de varejo. Primeiro ele fez um projeto de planejamento e orçamento. Depois passou dois anos aprendendo na área comercial. Ele fez um trabalho brilhante, mudou o modelo operacional. E teve a humildade, o desprendimento de ouvir. Às vezes, você pega um jovem muito bem preparado e ele acha que sabe tudo. O Pedro fez o esforço de ouvir não só a mim, mas também os pares e os subordinados.
Como o senhor amadureceu a decisão de sair?
Foi uma decisão que levou muitos anos, não foi repentina. A posição de ser o fundador te dá uma perspectiva interessante. Até o negócio atingir determinado tamanho, podemos dizer que ele trabalha para você. Mas depois de um ponto isso muda: aí é você quem trabalha para o negócio, mesmo que ele seja seu. Isso sempre foi claro para mim e foi uma visão importante na decisão de trocar o comando. O negócio aponta o caminho. Se você é um líder consciente, você obedece. Eu transferi a sede de Belo Horizonte para São Paulo pensando assim. Por vontade própria, ficaria em Minas, onde estão minha família e meus amigos. O mesmo raciocínio se aplica à mudança no comando. Não quero ficar aqui com alguém achando que eu atrapalho. Fundador é como atleta: tem de saber a hora de parar.
E como estão sendo as primeiras semanas afastado do dia a dia?
Fiz uma coisa importante para a transição: viajei e fiquei quase 60 dias fora. Antes a turma batia na minha sala e me perguntava o que fazer. Sabia que tinha de ceder espaço. Saí para que todos fizessem as perguntas ao Pedro. Na volta, peguei minhas coisas e criei uma sala para mim. É a primeira vez, desde que fundei a empresa, que fico num espaço fechado. Porque eu gosto mesmo é de ficar lá no meio, conversar, ver como estão as vendas, acompanhar de perto.
A tentação de se envolver é grande?
Você tem de se policiar. Pedro e eu criamos regras de convivência. Chamamos um especialista em sucessão e escrevemos juntos cinco regras. Parece uma coisa banal, mas foi difícil. Chegar à versão final das regras levou dois meses e muito tempo de conversa. A gente tem fazer acordos, qual é o papel de cada um, como é que cada um se comporta. Por exemplo: se eu quero subir lá e conversar com o diretor de marketing, eu posso. A decisão passa por ele, mas eu quero ter a liberdade de transitar entre os executivos. É preciso entender as diferenças e as proximidades da forma de gestão de um e de outro. Se você perguntar se eu sei as regras de cor, não sei. Mas aprendi o que posso e o que não posso fazer.
A Centauro não cresceu em 2015 e tem um endividamento alto. Como a empresa está passando por 2016?
Quando se trata de crise, você tem de falar em aprimorar. Não há mais recurso para abertura e reforma de loja? Então vamos melhorar a operação. É isso que se deve fazer em tempo de crise. Não se para nunca. Costumo dizer que a bandeira do Brasil tem duas palavras que estão escritas lá e não se conversam. Numa empresa, ou você tem ordem, ou você tem progresso. Progresso pressupõe um pequeno caos. E agora, na crise, quando você não está crescendo, aproveita para fazer ordem: investir na operação, encontrar oportunidades de melhorar os processos. Num ano difícil como 2016, nunca nos preocupamos tanto com ordem. Agora não é mais questão de escolher o investimento, e sim de como trazer o melhor retorno. As coisas ficam mais calculadas. Acho que as empresas saudáveis sairão deste período mais produtivas.
E senhor gosta mais de ordem ou de progresso?
De progresso, claro. Eu jogo na frente, sou atacante. Meu negócio é ir lá e fazer gol, abrir uma loja, criar um negócio novo.
(Murilo Ohl)