Suíça: vários bancos foram usados para canalizar propinas da Odebrecht para a Petrobras, disseram procuradores brasileiros
Da Redação
Publicado em 13 de dezembro de 2016 às 18h02.
Rio de Janeiro/Genebra - A Procuradoria-geral da Suíça está mudando seu foco para os bancos que operam no país enquanto continua investigando o escândalo da Lava Jato no Brasil.
Os acordos de delação premiada firmados individualmente com executivos forneceram novas pistas sobre o fluxo de recursos ilegais no sistema financeiro.
O procurador-geral suíço Michael Lauber disse em entrevista que está analisando de que forma os bancos suíços foram usados para canalizar propinas a funcionários da Petrobras e avaliando se esses bancos foram negligentes do ponto de vista penal.
Em entrevista concedida na semana passada, em Berna, Lauber preferiu não mencionar quais bancos estão sendo investigados, nem informar o cronograma para a tomada de qualquer medida, limitando-se a dizer que “quanto antes, melhor”.
“Temos a responsabilidade de acompanhar as instituições financeiras suíças, e essa certamente será uma, eu diria, de uma série de investigações que terão maior foco”, disse Lauber.
Lauber explicou que está trabalhando de perto com seus pares brasileiros e americanos que investigam um amplo esquema de corrupção no Brasil na investigação conhecida como Operação Lava Jato.
Mais de uma dúzia de pessoas na Petrobras e em suas empreiteiras admitiram às autoridades brasileiras que pagaram ou receberam propinas, e centenas de milhões de dólares em recursos transferidos ilegalmente foram devolvidos à estatal.
Mais de 60 executivos da construtora brasileira Odebrecht e de uma afiliada estavam assinando acordos de delação premiada na semana passada com as autoridades dos EUA e do Brasil, admitindo as acusações sob a Lei de Práticas de Corrupção no Exterior dos EUA, disseram pessoas informadas sobre o assunto.
A Odebrecht, que construiu refinarias e outras instalações para a Petrobras, reconheceu que participou de “práticas inapropriadas” e que “não admitiremos que isso se repita."
A investigação da Suíça, que surge após anos de medidas severas dos EUA sobre o sigilo bancário suíço, mostra como as autoridades do país estão adotando uma postura mais agressiva sobre possíveis irregularidades cometidas por seus próprios bancos.
Os procuradores suíços também estão investigando suspeitas de má conduta de bancos relacionadas ao fundo de investimento da Malásia conhecido como 1MDB.
Vários bancos foram usados para canalizar propinas da Odebrecht para a Petrobras, disseram procuradores brasileiros com base em entrevistas com executivos.
O Brasil não apresentou acusação contra nenhum banco. Lauber preferiu não dar mais detalhes sobre sua investigação, mas as autoridades suíças poderão querer saber se instituições com operações no país mantinham controles inadequados para impedir lavagem de dinheiro.
A Suíça não acusou nenhuma instituição financeira específica de irregularidade. No ano passado, procuradores brasileiros afirmaram que as unidades suíças dos bancos HSBC, Royal Bank of Canada e Deutsche Bank haviam sido usadas em uma operação de lavagem de dinheiro de Bernardo Freiburghaus, cidadão suíço-brasileiro que teria montado o esquema.
E a Lombard Odier, gestora de ativos e banco privado com sede em Genebra, foi descrita como canal de pagamento de propinas em depoimento do ex-executivo da Petrobras, Paulo Roberto Costa, condenado pelo recebimento de propinas, que começou a colaborar com os procuradores brasileiros em 2014.
Representantes das unidades suíças do HSBC, do Deutsche Bank e da Lombard Odier preferiram não comentar.
Um porta-voz do Banque Syz, que comprou a unidade suíça do RBC em 2015, disse que o Syz não é investigado e que está cooperando com as autoridades.
Uma porta-voz da unidade de gestão de patrimônio do Royal Bank of Canada, que gerenciava a divisão suíça do banco, disse que não foi feita nenhuma acusação contra a instituição.
Fernanda Telles, advogada de Freiburghaus, não respondeu aos pedidos de comentário. No ano passado, ela disse que seu cliente nunca facilitou pagamentos de propina e que “não é operador de nada, nem de ninguém”.
Os procuradores suíços trabalham em cerca de 60 processos penais ligados a pagamentos de propinas e lavagem de dinheiro na Petrobras.
Cinquenta e seis desses processos investigam indivíduos cujos nome não foram divulgados pelas autoridades; os outros quatro são contra empresas, incluindo a Odebrecht, segundo um porta-voz da Procuradoria-Geral.
Não está claro quantos indivíduos, se houver algum, estão entre aqueles que estavam assinando acordo de delação premiada nos EUA e no Brasil.
No ano passado, o procurador-geral congelou US$ 400 milhões em ativos de mais de 30 bancos na Suíça por suspeita de laços com o escândalo da Petrobras, sem identificar os bancos.
A Autoridade de Supervisão do Mercado Financeiro da Suíça, órgão regulador conhecido como Finma, abriu processos contra quatro bancos suíços, que também preferiu não identificar.
O PKB Privatbank, que tem sede em Lugano e é indiretamente controlado pela família italiana de comerciantes têxteis e alfaiates Trabaldo Togna, é um dos que estão sujeitos aos processos da Finma, segundo uma pessoa familiarizada com o assunto. Uma porta-voz do PKB preferiu não comentar.
O número de pedidos de assistência jurídica das autoridades brasileiras aos seus pares suíços, englobando uma série de casos, cresceu para 25 nos 10 primeiros meses de 2016, contra 21 em todo o ano de 2015, segundo o Escritório Federal de Justiça da Suíça, que coordena os pedidos feitos por meio do tratado de assistência jurídica mútua dos países, ou MLAT, pela sigla em inglês.
No mesmo período, a Procuradoria-Geral suíça apresentou 18 pedidos ao Brasil, contra 10 em 2015.
A cooperação maior mostra que os procuradores suíços estão desempenhando uma dupla função no caso Petrobras, disse Lauber.
Uma é ajudar os procuradores brasileiros a desmantelar a estrutura financeira suíça por trás de transações específicas e outra, que agora ganha força, é coletar evidências para montar sua própria acusação contra os bancos suíços, disse ele.
“Quando estabelecemos o delito prévio em outras partes, temos que usar isso como base para analisar as irregularidades das instituições financeiras suíças”, disse Lauber, que também lidera uma investigação sobre a Fifa.
A Operação Lava Jato, a maior investigação de corrupção da história do Brasil, começou com a apuração de crimes de lavagem de dinheiro.
Parte do dinheiro pago à Petrobras acabava financiando partidos políticos do país, afirmam os procuradores. Funcionários da Petrobras e um cartel de empresas contratadas teriam canalizado grandes somas de dinheiro por meio de contratos inflados de construção e serviços.
Em março deste ano, os investigadores levaram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para responder a um interrogatório, provocando vários dias de manifestações.
A Petrobras afirmou repetidas vezes que foi vítima do esquema de corrupção e que está trabalhando para recuperar o dinheiro perdido com desvios.