(Leandro Fonseca/Exame)
Agência O Globo
Publicado em 14 de maio de 2021 às 20h19.
Última atualização em 14 de maio de 2021 às 21h01.
Depois de ouvir o relato de conhecidos e amigos que conseguiram se vacinar nos Estados Unidos com facilidade e sem ter de comprovar residência, o curitibano Kenny Tsushima comprou uma passagem no domingo, 9, para tentar antecipar sua imunização contra a covid-19.
Com 34 anos, sua perspectiva de ser vacinado em Curitiba é no fim do ano ou em 2022. A vacinação anda a passos lentos no Brasil, com frequentes interrupções nas aplicações por falta de doses. Em Miami, na Flórida, Tsushima espera ser imunizado no mês que vem.
Como os Estados Unidos não aceitam passageiros vindos diretamente do Brasil, os turistas têm de fazer a quarentena em outro lugar. Tsushima escolheu ficar nestas duas semanas na Cidade do México, dentro do hotel, pois prefere manter o isolamento social. Mas a maioria dos turistas que buscam esta rota tenta unir a vacinação a uns dias de lazer nas praias do mar do Caribe.
É de olho nesses dois perfis que buscam por vacinação no exterior que agências brasileiras de viagem criaram os chamados “pacotes da vacina” para quem tem visto em dia e pode arcar com esses custos.
Os combos incluem passagem e hospedagem de ida e volta, geralmente, para Miami ou Nova York, com 14 dias na Costa Rica, República Dominicana ou México — sendo este o destino mais procurado, em especial a famosa Cancún.
A maioria dos compradores são jovens, na faixa dos 20 a 40 anos, e muitas vezes viajam em família. Cada pacote custa de 17.000 a 20.000 reais. Mas o tempo é tempo da estada é suficiente apenas para a primeira dose.
A vacina da Johnson & Johnson é de dose única. Mas imunizantes da Moderna e da Pfizer-BioNTech precisam ser aplicados duas vezes, com intervalo de 28 e 21 dias, respectivamente. Nesses casos, o custo da viagem pode subir cerca de 500 a 700 reais por dia, valor médio da hospedagem, totalizando de 10.000 a 14.000 reais a mais — fora alimentação e outras despesas.
As agências afirmam que não há garantia de que o cliente será vacinado. É por conta e risco de quem compra. No entanto, eles reforçam que as pessoas estão conseguindo ser imunizadas mesmo sem ser residentes ou trabalharem nos Estados Unidos. É necessário apresentar o teste de PCR negativo feito 72 horas antes de entrar no país.
Outro motivo que reforça o discurso das empresas é a sinalização, por parte de algumas autoridades americanas, de que pretendem incentivar o “turismo de vacina”.
Uma agência da Flytour em Salvador, na Bahia, publicou na última sexta-feira um post em sua rede social e enviou para clientes o anúncio de um pacote de vacinação em Nova York depois de quarentena no México.
A dona da agência Marcia Rosa conta que desde o início do ano, quando os Estados Unidos adotaram restrições para quem chega do Brasil, já havia uma grande procura de pessoas por esta entrada via México. No final de abril, ela e o marido, que têm dupla cidadania, fizeram a rota e foram imunizados em solo americano.
"Vi que seria um pacote bom para quem quisesse, mas não lançamos porque não tem como garantir a vacina nos Estados Unidos, é o governo quem dá. Quando o prefeito de Nova York disse que queria vacinar turistas, vimos a demanda e aproveitamos. De sexta [da semana passada] até agora, muita gente nos procurou."
Para ela, quanto mais pessoas vacinadas melhor: "Não condeno quem quer vir. Se tem país com sobra e oferecendo, por que não?", questiona.
O dono da agência Doutor Viagem, Albino Ferreira Neto, onde Tsushima comprou a passagem, também apostou nesta corrida pelo bilhete premiado, e divulgou o trecho passando por Costa Rica, República Dominicana ou México.
A hospedagem é por conta do cliente, diz, assim como o teste PCR que é exigido antes de entrar nos Estados Unidos.
"Quando vi na semana passada que as pessoas estavam conseguindo se vacinar, mudamos a temática do pacote de passagens para que pessoas possam aproveitar. Tem pessoas que querem viajar para lá ou para ver a família, mas a maioria de quem entrou em contato é para se vacinar mesmo", relata.
Além das agências que criaram e divulgam o combo para se vacinar nos Estados Unidos, há outras que não fazem publicidade, mas, diante do aumento da procura pelo roteiro, já têm pacotes à mão caso o cliente peça.
A Nix Travel, por exemplo, disse que não vale fazer propaganda porque são pacotes caros. A empresa informa que a procura aumentou na última semana, especialmente na dobradinha Cancún com Orlando, na Flórida.
Há muitos relatos de brasileiros que conseguiram tomar a vacina por lá sem necessidade de comprovação de residência ou trabalho. Em Nova York, a vacinação de turistas já foi autorizada.
O prefeito de Nova York, Bill de Blasio, disse que pretende instalar postos de vacinação na Time Square. Em Miami, oficialmente, só residentes podem se vacinar, mas turistas têm tido sucesso com a imunização.
Ao O Globo, a prefeitura de Miami esclareceu que somente residentes do estado da Flórida podem receber a vacina em Miami. “Os turistas podem não receber a vacina e os estrangeiros que não residem oficialmente na Flórida por parte do ano também”, disse por e-mail.
Segundo a prefeitura, para os residentes permanentes (que moram lá durante todo o ano) é exigida na hora da vacina uma cópia de uma carteira de motorista ou de identidade válida da Flórida. Já os residentes sazonais do estado (que moram parte do ano fora) devem fornecer comprovante de residência.
No início do mês, porém, o prefeito de North Miami Beach, Anthony DeFillipo, disse que sua cidade estava aberta para turistas se vacinarem e que, inclusive, já havia imunizado muitos. Depois da repercussão, ele tentou voltar atrás, mas a notícia já tinha se espalhado.
Já em Nova York, o prefeito Bill de Blasio anunciou que pretende disponibilizar a vacinação para estrangeiros em pontos turísticos populares da cidade, como a Times Square. O plano ainda depende da aprovação do governador Andrew Cuomo e da mudança de leis locais.
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