Corrupção: com nova lei, empresas que fraudarem licitações ou subornarem agentes públicos podem ter de pagar multa de até 20% de seu faturamento bruto anual (Getty Images)
Luísa Melo
Publicado em 6 de setembro de 2016 às 17h48.
São Paulo - Fraudar licitações ou subornar agentes públicos pode custar às empresas infratoras até 20% de seu faturamento bruto anual, de acordo com a Lei Anticorrupção (lei 12.846), que entra em vigor a partir desta quarta-feira.
A multa, apesar de salgada, não extingue a responsabilidade da companhia de ressarcir o prejuízo causado aos cofres públicos pelas ações ilícitas.
Além do dano financeiro, com a nova lei, a empresa que comprovadamente corromper o poder público terá também a sua imagem prejudicada. Isso porque ela será obrigada a publicar uma espécie de resumo da sentença em veículos de comunicação de grande circulação e também a expor o documento em suas sedes e sites corporativos – além de ficar registrada em um cadastro de empresas punidas.
Todas essas medidas serão tomadas na esferas civil e administrativa e não na judiciária. Ou seja: o processo não precisará passar pela abarrotada Justiça comum e será analisado pela autoridade máxima do órgão envolvido na corrupção ou, em casos especiais, pela CGU (Controladoria Geral da União).
Na prática, isso significa que a punição ocorrerá de forma muito mais rápida, segundo Sérgio Seabra, secretário de Transparência e Prevenção da Corrupção da CGU.
Haverá ainda outras penalidades decorrentes de ações judiciais. A empresa poderá perder os bens ou dinheiro obtidos direta ou indiretamente da infração e ser proibida de receber incentivos, subsídios, empréstimos ou doações de entidades públicas – o que pode significar, por exemplo, que a companhia não poderá tomar emprestados recursos do BNDES ou receber investimentos federais.
Além disso, a empresa envolvida em corrupção de agentes públicos poderá ter suas atividades parcialmente suspensas ou interditadas e até mesmo ter o CNPJ dissolvido. "Isso apenas em casos extremos, quando uma pessoa jurídica é criada para fraudar uma licitação, para ser 'laranja'", exemplifica Sérgio Seabra.
O que muda
A Lei Anticorrupção não estabelece nenhuma obrigatoriedade às empresas. As punições severas que ela impõe, porém, devem estimular a adoção de uma série de medidas preventivas nas companhias.
Se antes uma empresa precisava ter a culpa comprovada para ser responsabilizada por um ato de corrupção, agora, a garantia de que o ato ilícito ocorreu é suficiente. É a chamada responsabilização objetiva. Isso significa que a companhia não poderá mais alegar que um funcionário que cometeu alguma infração agiu sozinho, sem o seu conhecimento, por exemplo.
"Uma coisa é a culpa da empresa, outra a do funcionário. Antes, as pessoas jurídicas não estavam alcançadas pela lei. Agora, independente da comprovação do dolo ou da culpa da empresa ou de seus diretores, ela terá responsabilidade", explica Seabra.
Quanto mais transparente for a companhia, menos chances ela tem de ser fortemente punida. A lei estabelece atenuantes nas penas de empresas que comprovadamente tiverem um sistema de compliance ou que se denunciarem espontaneamente aos órgãos públicos.
Em casos de acordo, por exemplo, pode ser retirada a obrigação da publicação do caso na mídia e a multa (que varia entre 0,1 e 20% do faturamento bruto da organização) pode chegar a ser reduzida em dois terços.
Um decreto que deve estabelecer o que é realmente um bom sistema de compliance e como esses programas serão usados como atenuantes deve ser publicado ainda nesta semana, segundo a CGU. Além disso, cada estado da federação deverá regulamentar a nova lei para indicar qual será o órgão responsável pelos processos e como as investigações devem correr em seu território. A legislação, porém, já está valendo.
"A lei vai mudar o jeito de se fazer negócio no Brasil. As empresas terão que trabalhar sobre a tríade "prevenir, detectar e remediar", reforça o advogado Giovanni Falcetta, do escritório Aidar SBZ. Sérgio Seabra concorda. "A lei anticorrupção é uma mensagem clara de que é melhor investir em ética e integridade do que apostar na impunidade. A partir do momento em que as empresas reconhecerem isso, o mercado será mais pautado pela meritocracia, já que as empresas eficientes terão mais condições de prosperar", diz Seabra.
Muitas empresas, porém, parecem estar longe de se preparar para isso. Um estudo da KPMG realizado com 80 companhias revela que 80% delas ainda não têm bom conhecimento da lei e 36% ainda não começaram a reformular suas políticas por causa da nova legislação.