Vance relembrou a Guerra Fria para criticar a Europa
Agência de notícias
Publicado em 14 de fevereiro de 2025 às 14h15.
Em um discurso durante a Conferência de Segurança de Munique, na Alemanha, o vice-presidente dos EUA, J.D. Vance, afirmou que os europeus devem fazer mais para cuidar da própria segurança, enquanto os americanos concentram suas forças “em regiões do mundo que correm grande perigo”. A fala, que não citou a Ucrânia, também foi marcada por críticas aos líderes europeus, a quem acusou de se afastarem dos “valores democráticos”.
Havia expectativa por declarações de Vance sobre a guerra na Ucrânia: mais cedo, ele se encontrou com o presidente Volodymyr Zelensky, e os americanos sinalizaram que levariam a Munique sua proposta para acabar com o conflito de quase três anos. Mas o que se viu no plenário foi um vice-presidente na ofensiva, e que cobrou mais compromissos dos líderes europeus com a própria segurança.
"Como o presidente [Donald] Trump deixou bem claro, ele acredita que nossos amigos europeus precisam ter um papel maior no futuro do continente", disse Vance. "Como parte de uma aliança compartilhada, nos parece importante que os europeus façam um esforço maior, enquanto os Estados Unidos se concentram em regiões do mundo que correm mais perigo", falou.
Em seu primeiro mandato, Trump pressionou os países da Otan, a principal aliança militar do Ocidente, liderada pelos EUA, para que aumentassem seus orçamentos de Defesa, e de certa forma foi bem sucedido, com quase todos os países da organização atingindo o patamar recomendado de gastos equivalentes a 2% do PIB. Mas o presidente tem sinalizado que quer elevar esse patamar para até 5% do PIB, e prometeu, no mês passado, reduzir a presença militar americana no continente.
Mas se alguém esperava palavras e alguns acenos à cooperação entre os EUA e a Europa, a sensação ao final do discurso de Vance não deve foi animadora. Ao invés de discutir questões urgentes de segurança, como o conflito na Ucrânia, os desejos expansionistas da Rússia ou os riscos associados à China, Vance afirmou que a ameaça que mais lhe preocupa é “o distanciamento da Europa de seus valores democráticos mais fundamentais”.
Ele criticou o que considera serem ataques contra a liberdade de expressão, citando a recente decisão da Romênia de anular os resultados da eleição presidencial na Romênia, onde um candidato de extrema-direita surpreendeu ao terminar o primeiro turno à frente — a medida veio em meio a evidências de que a Rússia interferiu no processo através de publicações pagas em aplicativos como o TikTok. A votação foi remarcada para 4 de maio.
"Se sua democracia pode ser destruída com algumas centenas de milhares de dólares de publicidade digital de um país estrangeiro, então ela não era muito forte para começo de conversa", disse.
Vance sugeriu que a imigração é o tema mais importante para os europeus neste momento, algo visto como um aceno a partidos como o Alternativa para a Alemanha (AfD), que caminha para se tornar a segunda força do cenário político alemão nas eleições do dia 23. Ele ainda criticou a objeção das siglas mais tradicionais à extrema direita, não apenas na Alemanha.
"Não há espaço para barreiras de proteção",afirmou. "Se você está com medo de seus próprios eleitores, não há nada que a América possa fazer por você", contou.
Sobraram críticas para decisões relacionadas ao controle de desinformação em redes sociais, sugerindo que restringir conteúdos falsos ou com discurso extremista era algo de quem “simplesmente não gosta da ideia de que alguém com um ponto de vista alternativo possa expressar uma opinião diferente”.
"Na memória viva de muitos de vocês nesta sala, a Guerra Fria posicionou os defensores da democracia contra forças muito mais tirânicas neste continente.[...] Você não pode forçar as pessoas a pensar, sentir e acreditar. Infelizmente, quando olho para a Europa hoje, às vezes não fica tão claro o que aconteceu com alguns dos vencedores da Guerra Fria", afirmou. "Se a democracia americana conseguiu sobreviver a 10 anos de ataques de Greta Thunberg, vocês conseguem sobreviver a alguns meses de Elon Musk", ironizou.
As primeiras reações não foram as melhores.
"Esse assunto é nosso", disse Thomas Silberhorn, um membro do parlamento pela União Social Cristã, o partido irmão bávaro dos Democratas Cristãos (CDU), e um ex-oficial de defesa federal, citado pelo New York Times. "Minha mensagem para a administração dos EUA é: extremistas alemães que se referem explicitamente ao nacional-socialismo, parte da AfD, são claramente contra os EUA que nos libertaram do nacional-socialismo", argumentou.