Donald Trump: em tuíte, presidente eleito dos EUA ameaça não levar em frente o acordo firmado entre Obama e Raúl Castro (Scott Olson/Getty Images)
Gabriela Ruic
Publicado em 28 de novembro de 2016 às 15h57.
Última atualização em 28 de novembro de 2016 às 16h09.
São Paulo – Dias depois da morte de Fidel Castro, o futuro da ilha caribenha mergulha em incertezas. O líder da Revolução Cubana morreu na madrugada do último sábado, aos 90 anos, mas havia renunciado à presidência em 2008, após 50 anos no poder.
No que depender de Donald Trump, presidente eleito dos Estados Unidos, o histórico acordo de retomada de relações anunciado em 2014 por Barack Obama, atual presidente americano, e Raúl Castro, líder de Cuba, pode ir por água abaixo.
Em um tuíte publicado na tarde desta segunda-feira, o polêmico republicano disse que, se o país não estiver disposto a negociar algo melhor para o seu povo e os americanos, então o acordo não será finalizado.
If Cuba is unwilling to make a better deal for the Cuban people, the Cuban/American people and the U.S. as a whole, I will terminate deal.
— Donald J. Trump (@realDonaldTrump) November 28, 2016
Não ofereceu mais detalhes acerca dos pontos que deveriam ser melhorados, incluídos ou retirados do documento firmado entre as partes. No domingo, um de seus assessores se limitou a dizer que o acordo poderia ser revisto, caso Cuba não sinalize estar se movimentando “na direção certa”, citando a liberdade de religião como exemplo.
No sábado, momentos após o anúncio da morte de Fidel, Trump emitiu um comunicado no qual chamou o líder de “ditador cruel” e disse que o legado deixado por ele é o de “sofrimento inimaginável, pobreza e a negação de direitos humanos básicos”. Seu vice, Mike Pence, disse que o momento, agora, é de esperanças renovadas para o povo cubano.
A normalização das relações entre os Estados Unidos e Cuba foi anunciada com muita expectativa no final de 2014, quando Obama e Raúl vieram à público decretar fim às hostilidades. Os países estavam afastados desde 1960.
Desde então, a embaixada americana no país foi reaberta e a ilha recebeu a visita de Obama em março de 2016, foi a primeira vez que um líder americano em exercício visitou Cuba em 88 anos.
O acordo prevê, entre outros pontos, o restabelecimento da liberdade de expressão e de reunião no país, assim como o acesso à informação para todo o povo e o apoio ao desenvolvimento de negócios privados. O embargo econômico, entretanto, ainda vigora.
Com a morte de Fidel, especialistas em política internacional e diplomacia, como Ted Piccone, pesquisador da Brookings Institution, avaliam que a melhor saída, para Washington, é a de manter o que foi acordado entre Obama e Raúl.
Na sua visão, uma resposta equivocada dos EUA daqui em diante poderá fortalecer a voz do grupo "fidelista" que ainda existe dentro Partido Comunista, contribuindo para um novo afastamento entre os países e a consequente reaproximação entre Cuba, Rússia e China.
O novíssimo governo Trump deve, portanto, "manter a política do presidente Obama de engajamento construtivo e trabalhar com a liderança pós-Castro para proteger os interesses dos EUA em uma Cuba mais estável, independente e aberta."
Em uma pesquisa conduzida em março de 2016 pela rede de televisão americana CBS e o jornal The New York Times, o apoio do povo americano ao fim dos embargos e retomada das relações com Cuba era de 55%. Já o restabelecimento das relações diplomáticas recebeu o apoio de 58% dos americanos. A forma como Obama conduziu as negociações foi aprovada por 52% dos entrevistados.
Na comunidade internacional, a repercussão da morte de Fidel foi de críticas ao regime, mas reconhecimento de suas conquistas.
Para Victor Bulmer-Thomas, professor da Universidade de Oxford e pesquisador da Chatham House, a luta contra o chamado “imperialismo dos Estados Unidos” foi bem-sucedida, mas tornou a ilha caribenha dependente ao extremo da União Soviética. “E isso significa que a economia de Cuba nunca aprendeu a ser autossustentável”, explicou.
Ainda de acordo com Bulmer-Thomas, por outro lado, as conquistas sociais, culturais e esportivas, sob comando de Fidel, são “extraordinárias”, lembrando que a expectativa de vida em Cuba, hoje, é mais alta que nos Estados Unidos.
Para o presidente francês François Hollande, Fidel foi uma das figuras mais importantes do século XX. “Ele encarnou a Revolução Cubana, em suas esperanças e desilusões”, disse em comunicado, lembrando que a França sempre condenou os abusos de direitos humanos perpetrados pelo regime da mesma forma que condenou os embargos dos EUA contra o país.
Em um perfil emocionante, Paul Reynolds, correspondente da BBC britânica, disse que a história da vida de Fidel é “a história do nosso tempo”. “Seu nome é expressado com afeto por alguns, hostilidade por outros, mas é sinônimo de história para todos”, pontuou.