Crianças sírias caminham sob a chuva em campo de refugiados: muitos sírios vivem em tendas ou em casas maltratadas, com acesso limitado a água potável e serviços sanitários (Murad Sezer/Reuters)
Da Redação
Publicado em 4 de setembro de 2013 às 09h44.
Beirute - Um sentimento de amargura prevalece entre os refugiados sírios no Líbano, que estimam que o povo será o único perdedor caso haja um ataque estrangeiro, e culpam tanto o regime quanto os rebeldes por seu sofrimento.
Muitos dos mais de 700 mil sírios que abandonaram seu país para se refugiar no Líbano desde o início do conflito há dois anos e meio continuam com medo.
Um deles é Walid (nome fictício que prefere usar para evitar represálias), que já passou pelo Egito e pela Jordânia antes de encontrar um trabalho no Líbano.
"Nós, jovens, tememos que nos detenham e nos obriguem a combater", contou à Agência Efe o advogado, que tem seus cinco irmãos espalhados por vários países da região enquanto seus pais ainda vivem em um bairro residencial de Damasco.
Walid diz viver "angustiado" diante da possibilidade de que os Estados Unidos e seus aliados ataquem a Síria para punir o regime de Bashar al Assad pelo suposto uso de armas químicas contra a população.
Ele acredita que os mísseis Tomahawk, capazes de atingir alvos a mil quilômetros de distância, poderiam não só alcançar instalações militares, mas também bairros que atualmente são considerados seguros.
"As casas dos dirigentes estão no meio da população, que pagará o preço da guerra", afirma o sírio, que lembra que a situação na capital é "muito ruim" e que os enfrentamentos acontecem a todo momento.
Quando foi visitar seus pais em Damasco, em agosto desse ano, Walid disse ter se impressionado ao ver apenas idosos, mulheres e crianças. "Os jardins e as mesquitas estão cheios de pessoas que dormem em tendas", garantiu.
Walid põe em dúvida as consequências de uma provável intervenção militar e desconfia do governo e dos rebeldes, já que "ninguém trabalha para melhorar as condições do povo".
"Não quis permanecer em meu país porque não posso fazer nada pelas pessoas que morrem e sofrem, e não ia ficar lá para morrer por nada", ressaltou o jovem, com pessimismo.
Na mesma ONG em que Walid trabalha no Líbano, há outro sírio que compartilha da opinião de que "todos se estão aproveitando do que está acontecendo e que o único prejudicado é o povo".
"A guerra não terminará, há muitos interesses em jogo", afirmou Jad, que nasceu em Aleppo e deixou a oficina de pintar carros que tinha devido à "trágica" crise econômica.
Ele se queixa de que a libra síria não para de se desvalorizar e de que os preços não têm subido muito, enquanto produtos de primeira necessidade como o leite se tornam cada vez mais escassos.
"Os caminhões com comida sofrem ataques ou são assaltados, e para obter qualquer coisa é preciso entrar em filas intermináveis", acrescentou Jad, que optou por sair do país com a esposa e as filhas para tentar dar a elas uma vida "mais digna".
Mesmo assim, tanto Walid como Jad se sentem privilegiados em comparação a outros compatriotas que vivem no Líbano, onde encaram uma "rejeição" contra o povo sírio, que passou a ser culpado por qualquer problema que surge.
A grande quantidade de refugiados está pondo a toda prova a capacidade das organizações humanitárias e das autoridades locais para responder às necessidades de uma população cada vez mais vulnerável, alertou a ONG "Ação contra a Fome".
Muitos sírios vivem em tendas ou em casas maltratadas, com acesso limitado a água potável e serviços sanitários.
Embora as autoridades libanesas não tenham fechado suas fronteiras com a Síria, elas estabeleceram controles mais severos e passaram a negar a entrada daqueles que não têm passaportes válidos, documentos oficiais ou "motivos justos" para se mudarem para o Líbano, segundo o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (Acnur).
O governo libanês garante que não aplicou os novos requisitos de entrada aos sírios e que está preparando um centro de para acolher os refugiados na fronteira caso ocorra um eventual ataque estrangeiro, embora rejeite abrir campos de refugiados no país, que já tem 4 milhões de habitantes e sofre os efeitos da crise.