Rússia proibiu críticas às suas Forças Armadas com uma série de leis de censura, e aprisionou dezenas de opositores desde o início da guerra, em 2022 (Mikhail Klimentyev/Getty Images)
Agência de notícias
Publicado em 31 de janeiro de 2024 às 13h10.
O Parlamento russo aprovou, nesta quarta-feira, uma lei que permite que as autoridades confisquem os bens de pessoas condenadas por questionar o Exército e a ofensiva militar na Ucrânia. A lei, aprovada pela Duma (câmara baixa) na terceira leitura, autoriza as autoridades a tirar dinheiro, propriedades e bens dos críticos da guerra e agora seguirá para o presidente Vladimir Putin para ratificação.
A Rússia proibiu críticas às suas Forças Armadas com uma série de leis de censura, e aprisionou dezenas de opositores desde o início da guerra, em 2022. O presidente da Duma, Viacheslav Volodin, disse que a lei visa os “canalhas e traidores, aqueles que hoje cospem nas costas de nossos soldados, os que traíram sua pátria, aqueles que enviam dinheiro para as Forças Armadas de um país que está em guerra contra nós”.
— É necessário punir canalhas, incluindo figuras culturais e [pessoas] que apoiam nazistas e jogam sujeira em nosso país, soldados e oficiais envolvidos na guerra. Qualquer um que tente destruir e trair a Rússia deve ser punido como merece e compensar o dano causado ao país às custas de sua propriedade — afirmou Volodin.
A lei ainda visa permitir que as autoridades confisquem honorários recebidos por jornalistas ou pesquisadores condenados por escrever “informações falsas” sobre a invasão da Ucrânia, ou confiscar outros bens mais valiosos, como carros ou apartamentos, como substituição. As propriedades deverão ser confiscadas caso a pessoa seja considerada culpada por praticar atos que “ameacem a segurança do Estado”.
Ao Guardian, especialistas legais alertaram que a lei torna mais fácil para o governo punir russos anti-guerra. Para Maria Nemova, advogada do grupo de direitos humanos Memorial, “as emendas visam principalmente combater o ‘inimigo interno’, os opositores da guerra que expressam suas opiniões e tentam convencer os outros”. Segundo Evgeny Smirnov, chefe do escritório de advocacia First Department, a lei é uma “ferramenta para pressionar aqueles que discordam da política das autoridades russas”.
As medidas também se aplicam aos centenas de milhares de russos que deixaram o território desde o início da ofensiva militar, um grupo que é frequentemente atacado por Moscou. No país, “difamar” ou propagar “informações falsas” sobre as Forças Armadas russas são crimes que podem resultar em até 15 anos de prisão. O Kremlin insiste que a sociedade russa está unida em seu apoio à guerra na Ucrânia.
A maioria dos críticos mais proeminentes de Putin, liderados por Alexei Navalny, foi presa ou exilada. Num caso raro de protesto público que não foi reprimido, o opositor Boris Nadezhdin apresentou, nesta quarta-feira, sua candidatura para as eleições presidenciais de março. Nas últimas semanas, Nadezhdin animou a oposição com sua mensagem pró-paz e recolheu milhares de assinaturas para registrar sua candidatura.
Boris Nadezhdin, de 60 anos, é um discreto veterano da política russa. Ele surpreendeu ao conseguir mobilizar milhares de russos que desejam a paz na Ucrânia, e ao anunciar que pretende desafiar Vladimir Putin nas eleições presidenciais de março. Num país onde criticar o Kremlin é algo punido com a prisão, sua candidatura representa um pouco de ar fresco para cidadãos anônimos que buscam uma forma de expressão sem colocar a liberdade em risco.
Nesta quarta-feira, Nadezhdin apresentou mais de 100 mil assinaturas de apoio, uma etapa obrigatória para validar sua candidatura. Em entrevista à imprensa local, ele agradeceu aos apoiadores e declarou que “ninguém acreditava há um mês, e alguns ainda duvidavam há duas semanas”, mas que “milhões de pessoas apoiam”. A Comissão Eleitoral deve tomar uma decisão em um prazo de 10 dias, durante o qual verificará a “autenticidade” das assinaturas.
Em entrevista à AFP na última semana, Nadezhdin chamou de “pesadelo” a ofensiva na Ucrânia, e denunciou os 25 anos de guinada autoritária de Putin. Afirmou, ainda, que sua candidatura “dá às pessoas uma oportunidade única de protestar legalmente contra a política atual”. Entre suas promessas eleitorais estão o fim dos combates, acabar com a “militarização” da Rússia e libertar “todos os prisioneiros políticos”.