Para Abu Khalil, que fez parte da coalizão eleitoral dos Jovens da Revolução, a primeira coisa que o Egito precisa é ter "um novo Governo com poder real", ou seja, que não esteja nas mãos da cúpula militar (Mahmud Hams/AFP)
Da Redação
Publicado em 25 de novembro de 2011 às 20h06.
Cairo - Faltando três dias para a realização da primeira fase das eleições legislativas no Egito, os revolucionários da Praça Tahrir continuam desconfiados do pleito organizado pela Junta Militar e esperam que uma possível consulta popular seja realizada somente após o poder passar para uma autoridade civil.
A prioridade dos manifestantes é a renúncia dos dirigentes militares, que, segundo eles mesmos, ficaram "desmascarados" com suas tentativas de permanência no poder, assim como pelo "continuísmo" com o regime do ex-presidente Hosni Mubarak, que renunciou no dia 11 de fevereiro.
"Não é o momento, as eleições devem ser adiadas", disse à Agência Efe o ativista Ahmed Abu Khalil, que teme a participação dos chamados "fulul" (remanescentes do dissolvido partido de Mubarak). A falta de segurança por conta dos "baltaguiya", os pistoleiros do antigo regime, também pode ameaçar as eleições.
Para Abu Khalil, que fez parte da coalizão eleitoral dos Jovens da Revolução, a primeira coisa que o Egito precisa é ter "um novo Governo com poder real", ou seja, que não esteja nas mãos da cúpula militar.
Essam Sharaf, que renunciou ao cargo de primeiro-ministro, era considerado uma marionete do Conselho Supremo das Forças Armadas (CSFA) pelos revolucionários, já que o ex-premiê era acusado de ser submisso às decisões dos dirigentes militares que estavam presentes na época de Mubarak.
A nomeação na última sexta-feira de Kamal Ganzouri, que já foi primeiro-ministro de Mubarak, também parece não convencer os manifestantes da Praça Tahrir.
A formação de um novo Executivo com prerrogativas verdadeiras para guiar o Egito neste período de transição são requisitos imprescindíveis para grande parte da população. Essa medida teria que ser adotada antes mesmo de qualquer tipo de consulta eleitoral.
Esse é a opinião de Khaled Awad, pesquisador da Universidade Ain Shams, que declarou à Agência Efe em Tahrir que as eleições "não devem ser realizadas antes do poder ser transferido aos civis".
Segundo Awad, as eleições "não são importantes", mesmo sendo o primeiro pleito democrático na história do país. "Para fazer com que os dirigentes militares deixem o poder é preciso estar em Tahrir", completou o pesquisador.
A ideia de que as mudanças serão alcançadas com pressão na rua, como ocorreu na revolução em janeiro, é compartilhada também pelo médico Mohamed Kamel, que trabalha como voluntário em um dos hospitais de campanha instalados na praça.
Enquanto atendia vários feridos, vítimas dos confrontos com a Polícia, Kamel disse à Efe que "a Junta Militar deixará o poder pela força e não após as eleições".
"Acham que nós voltaremos para casa, mas estão errados. Se conseguimos derrubar Mubarak também faremos isso com o Conselho Supremo das Forças Armadas, que são a mesma cara", ressaltou o médico.
O fato é que, para muitos, a sombra de Mubarak parece pairar sobre os atuais dirigentes e sobre as eleições, ainda mais com a desconfiança nas forças políticas e não só nas formadas por ex-integrantes do dissolvido Partido Nacional Democrático (PND).
As palavras da jovem médica Ramia Salem, companheira de Kamel no hospital de campanha, resume bem este sentimento: "Achamos que Mubarak continua controlando o país e não estamos satisfeitos nem com os políticos nem com o Governo".
Neste mesmo sentido, o artista Nabil Bahgat, que participou durante toda a semana dos confrontos com a Polícia em Tahrir, explicou que se as eleições forem realizadas ele não votará. "Tudo continua do mesmo jeito e os partidos não são confiáveis", declarou Bahgat.
"Quem devo apoiar? Um regime religioso, um novo militar ou o antigo de Mubarak?", perguntou Bahgat, fundador de um grupo de teatro. "Não há em quem votar", completou o artista.