O papa Bento XVI: pontificou por quase oito anos entre a sua eleição e o discurso desta semana no qual anunciou que por causa da idade e da saúde frágil havia decidido deixar o cargo (REUTERS/ Alessandro Bianchi)
Da Redação
Publicado em 14 de fevereiro de 2013 às 09h41.
Cidade do Vaticano - A renúncia do papa Bento 16, na segunda-feira, surpreendeu muita gente no mundo todo, embora quem soubesse para onde olhar pudesse encontrar presságios em abundância.
É o caso do filme "Habemus Papam", de Nanni Moretti, lançado em 2011. Nele, um papa recém-eleito, deprimido e tomado pelo pânico, foge durante alguns dias dos seus mentores no Vaticano antes de voltar e anunciar, no seu primeiro pronunciamento, que não se sentia qualificado para o cargo.
Já Bento 16, de 85 anos, pontificou por quase oito anos entre a sua eleição e o discurso desta semana no qual anunciou, em latim, que por causa da idade e da saúde frágil havia decidido deixar o cargo. Foi a primeira abdicação voluntária de um papa em mais de 700 anos.
Pedindo "perdão por todos os meus defeitos", o papa disse que o cargo exige "uma força mental e corporal" que ele não tem mais.
O canal italiano Sky Cinema não perdeu a chance de re-exibir "Habemus Papam", onde o pontífice fictício interpretado por Michel Piccoli diz que "a Igreja precisa de um guia que tenha força para trazer grandes mudanças", e também pede perdão.
Moretti, cujo filme foi recebido com frieza pela Igreja, está sendo bombardeado por telefonemas de jornalistas.
"O que vou dizer?", comentou ele ao jornal La Repubblica, admitindo graciosamente estar tão surpreso quanto o resto do mundo pela decisão de Bento 16. "De vez em quando o cinema consegue antecipar a realidade." Mas esse filme não era o único presságio pairando sobre Roma.
No ano passado, o bispo emérito de Ivrea, Luigi Betazzi, que conhece o papa há 50 anos, especulou que ele poderia renunciar ao seu cargo vitalício se eventualmente considerasse estar sem condições de comandar a Igreja.
"Eu lhe desejo uma vida longa e lucidez duradoura, mas acho que, se chegar o momento em que ele vir que as coisas estão mudando, acho que ele tem a coragem de renunciar", disse Bettazzi à RAI, emissora pública italiana de TV.
Na época, o Vaticano disse que não havia chance concreta de que Bento 16 abdicasse. Mas, na verdade, o próprio pontífice passava esses sinais.
Desde sua eleição como papa, ele rezou em duas ocasiões junto aos restos mortais de são Celestino, que em 1294, sob o nome de Celestino 5o, foi o último pontífice a deixar o cargo voluntariamente, voltando à vida de ermitão. Para isso, ele precisou antes assinar um decreto autorizando os papas a abdicarem.
Se alguém ficou curioso sobre esse interesse de Bento 16 por seu antecessor, as pistas estavam em uma longa entrevista concedida pelo pontífice ao jornalista alemão Peter Seewald para um livro lançado em 2010, "Luz do mundo".
"Se um papa claramente percebe que não está mais física, psicológica e espiritualmente capacitado para lidar com as obrigações do seu cargo", disse Bento 16, "então ele tem o direito, e sob algumas circunstâncias a obrigação, de renunciar".