Equador: protestos ocorrem há dias no país. (Ivan Alvarado/Reuters)
AFP
Publicado em 10 de outubro de 2019 às 19h17.
Última atualização em 10 de outubro de 2019 às 19h18.
Os indígenas no Equador derrubaram presidentes e chegaram a ser parte de uma troica que governou brevemente em 2005. Eles estão agora de volta às ruas, contra os ajustes acordados pelo governo com o FMI.
Os povos indígenas compõem 13 nacionalidades e fazem do Equador um país multicultural e multilíngue. Sua população representa 25% dos 17,3 milhões de habitantes. Eles são temidos por sua coragem e capacidade organizacional em protestos.
Desde 1990, eles são um setor influente que tem escalado posições. Atualmente, uma indígena Shuar, Diana Atmaint, preside o órgão eleitoral.
Eles também ocuparam ministérios, tribunais superiores e embaixadas.
Culqui faz parte da guarda indígena que vigia um acampamento aonde chegaram milhares de indígenas para protestar em Quito contra a eliminação de subsídios que impactaram em até 123% no preço dos combustíveis. Ele procura por "infiltrados" para expulsá-los.
Os povos indígenas enfrentam a falta de serviços básicos. Neste século, ainda existem aldeias sem eletricidade ou água potável. Cerca de 50% das crianças indígenas com menos de quatro anos sofrem de desnutrição crônica, segundo estatísticas do Ministério da Saúde.
Os nativos são vistos pelos mestiços, maioria no Equador, como teimosos e rudes. "O mundo indígena tem sido historicamente segregado. É uma questão de resposta ao racismo que eles vivem diariamente; eles confiam apenas em seus pares", explicou à AFP o especialista da Universidade Salesiana de Quito Pablo Romero.
Grande parte da população indígena acata as diretrizes da poderosa Confederação das Nacionalidades Indígenas (Conaie), que, em 1990, promoveu a primeira revolta dos povos nativos no Equador, mobilizando milhares para Quito.
Os indígenas deixaram de ser invisíveis e receberam 2,3 milhões de hectares de terra.
A Conaie, que agrupa a Ecuarunari (serra andina) e a Confeniae (Amazônia), tem no Pachakutik seu braço político de esquerda, criado em 1995.
Hoje esse partido ocupa cinco dos 137 assentos do Legislativo, embora tenham chegado a obter até 10% do total.
Diante de medidas consideradas impopulares, a Conaie promoveu protestos, que junto a outros setores derivaram na queda dos ex-presidentes Abdala Bucaram (1997), Jamil Mahuad (2000) e Lucio Gutiérrez (2005).
Cerca de 68% dos pobres no Equador são indígenas. As reformas acordadas com o Fundo Monetário Internacional (FMI) implicam no fim da ajuda, no valor de 1,3 bilhão de dólares por ano, que o Estado destinava à redução do preço dos combustíveis no país petrolífero.
Por trás dessa medida está o medo de inflação generalizada. Dedicados ao trabalho agrícola e comercial, o primeiro impacto para os indígenas será o aumento do preço do que eles produzem, geralmente na monocultura de batatas, trigo, cevada, cebola comprida, brócolis ou cenoura.
A colheita é levada ao mercado por estradas secundárias ou terciárias. Em seus territórios, eles se deslocam principalmente em caminhonetes e pequenos caminhões, na maior parte a diesel. O preço do galão de diesel passou de 1,03 para 2,30 dólares (123%) e o da gasolina comum de 1,85 para 2,40 (123%).
Isso também implicou um aumento de 30% nas passagens de transporte dentro de suas províncias.
"No meu caso, somos sete irmãos. Vocês como você não sabe que a passagem nas aldeias é mais cara", diz Lucrecia Caiza, nativa de Otavalan.
Para o professor Romero, "na visão indígena do mundo é normal ter muitos filhos, eles são sua própria força de trabalho para o futuro, é uma questão econômica e de sobrevivência".
A Conaie quer que o governo reverta a eliminação dos subsídios, que Moreno disse que foram mantidos por 40 anos e custaram ao Estado cerca de 60 bilhões de dólares.
Os aumentos levaram milhares - o Conaie fala de 20.000, estima a polícia em cerca de 10.000 - a deixar os Andes e os territórios da Amazônia para protestar.
Os aumentos levaram milhares de indígenas - a Conaie fala de 20.000, a polícia estima em cerca de 10.000 - a deixar os Andes e os territórios da Amazônia para protestar.
"Estamos em Quito para rejeitar um modelo econômico capitalista que vai contra diferentes níveis da economia", explica Jorge Herrera, ex-chefe da Conaie.
"Não temos nenhuma outra intenção, pior, menos ainda, de derrubar governos", disse o líder Salvador Quishpe.
Moreno disse que, sem os subsídios, o executivo recuperará cerca de 1,4 bilhão para ser alocado aos mais pobres. No entanto, os povos indígenas desconfiam.
"Eles não confiam em alguém que toma medidas antipopulares e os reprime severamente nas ruas", disse Romero.