Biden e Putin na Rússia: criticado por direitos humanos, Putin rebateu citando caso George Floyd (Sputnik/Mikhail Metzel/Pool/Reuters)
Carolina Riveira
Publicado em 16 de junho de 2021 às 17h51.
Última atualização em 16 de junho de 2021 às 18h04.
Citar a violência para criticar os Estados Unidos vem se tornando uma constante geopolítica. Depois que a morte de George Floyd foi citada pela China em uma reunião no começo do ano, o tema voltou a aparecer nesta quarta-feira, 16, quando o presidente russo Vladimir Putin e o americano Joe Biden tiveram seu primeiro encontro desde a posse de Biden.
Criticado por Biden por desrespeito aos direitos humanos na Rússia, com sabida perseguição a opositores, Putin rebateu citando a violência policial nos EUA.
"Você não tem tempo de abrir a boca e já é morto por um tiro", disse Putin em entrevista coletiva após o encontro com Biden, fazendo referência aos tiroteios em massa nos EUA. Só neste ano, mais de 200 massacres do tipo ocorreram no país, um dos mais notórios levando à morte de mulheres asiáticas em Atlanta, na Geórgia.
"Olhe para as ruas americanas. As pessoas estão sendo mortas lá", disse. "Você pode levar uma bala no pescoço."
Putin foi criticado por Biden sobretudo devido ao episódio de Alexei Navalny, opositor do regime na Rússia e que foi envenenado em circunstâncias ainda suspeitas. Seus apoiadores dizem que o atentado é obra do governo Putin.
Navalny também está preso por ter deixado o país para ir se tratar do envenenamento na Alemanha, o que, segundo a Justiça russa, estava fora do acordo que garantia sua liberdade -- Navalny havia sido condenado anos antes por liderar protestos. Putin voltou a dizer hoje que Navalny sabia dessas condições e sabia que seria preso se voltasse à Rússia.
Apesar das alfinetadas, Putin disse que Biden é "um chefe de Estado experiente" e "muito diferente" de Trump. Também chamou o diálogo de hoje, realizado em Genebra, na Suíça, de "construtivo".
As relações entre Rússia e EUA estão em um de seus piores momentos em anos, abaladas por temas como ataques de hackers russos, direitos humanos, interferência no Oriente Médio e a intervenção russa na Ucrânia, que a Rússia acusa de ter violado os termos de um cessar fogo.
No encontro desta quarta-feira, os dois presidentes tomaram algumas medidas para sinalizar tentativas de avanço, mas sem grandes mudanças por ora.
As discussões duraram três horas - menos do que os assessores de Biden esperavam, segundo a Reuters -, mas Biden disse que as conversas foram intensas e detalhadas e que não "não precisávamos passar mais tempo conversando".
Uma medida diplomática que tende a ser simbólica é o fato de os dois líderes terem concordado em devolver seus embaixadores aos respectivos postos no país rival.
Já sob gestão de Biden, o embaixador russo em Washington D.C foi chamado de volta pelo governo Putin após Biden dizer que a Rússia "pagaria o preço" por tentativas de interferência de hackers russos na última eleição -- acusação parecida já havia acontecido em 2016, quando Trump foi eleito.
O embaixador americano em Moscou seria chamado a deixar seu posto depois que a Rússia impôs sanções econômicas a americanos.
A cyber segurança foi um dos principais temas do encontro, e é um dos mais sensíveis para ambas as partes. Em entrevista coletiva, Putin disse que ele e Biden chegaram a um acordo para novas conversas sobre o tema, mas não deu detalhes.
Na fala, Putin disse que os dois lados "não compartilham das mesmas posições" em muitos temas, mas que viu uma "disposição de entenderem um ao outro". "No que tange à cyber segurança, chegamos a um acordo principalmente para começar negociações sobre isso", disse. "Acho que isso é extremamente importante."
O líder do Kremlin disse ainda que a Rússia também foi alvo de vários ataques cibernéticos com origem nos Estados Unidos.
Em comunicado conjunto divulgado após a reunião, os dois presidentes também falaram sobre a questão nuclear. Escreveram que "hoje, nós reafirmamos o princípio de que uma guerra nuclear não pode ser vencida e nunca deve ser lutada". Como herdeira da União Soviética, a Rússia é até hoje dona de um dos maiores arsenais nucleares do mundo, assim como os EUA.
Biden desembarcou em Genebra na terça-feira, 15, após suas primeiras reuniões com os líderes do G7 e da Otan, aliança militar ocidental.
Em ambos os eventos, tradicionalmente importantes para a hegemonia dos EUA, Biden tentou se reaproximar dos aliados, como Europa e Japão, alianças que haviam se enfraquecido durante os anos de governo Trump.
A aproximação das potências teve dois alvos claros: Rússia e China. Clássicas tensões com os dois rivais foram abordadas, como a guerra comercial com a China, a discussão sobre a origem do coronavírus e, no caso da Rússia, acusações de espionagem e de ameaças aos aliados da Otan.
Após o encontro da Otan, Biden disse que os líderes mundiais o agradeceram pela reunião com Putin. "Todos os líderes aqui, a maioria mencionou isso [o encontro] e me agradeceu por estar me reunindo com Putin", disse.
(Com informações da agência Reuters)
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