Há mais de dez anos, o desenvolvimento do programa nuclear na República Islâmica é observado com preocupação por Washington e seus aliados na Europa (AFP/AFP Photo)
Agência de notícias
Publicado em 18 de janeiro de 2024 às 13h26.
Em meio à instabilidade geopolítica no Oriente Médio, o Irã assumiu protagonismo em ações ofensivas nesta semana, mostrando suas capacidades de alcançar inimigos além de seu território, com ataques a mísseis e drones contra alvos no Paquistão, Iraque e Síria. Membro do Eixo da Resistência e principal fornecedor de armas para grupos como Hamas, Hezbollah e houthis, Teerã motiva outra preocupação recorrente do Ocidente: o desenvolvimento de armas nucleares.
Há mais de dez anos, o desenvolvimento do programa nuclear na República Islâmica é observado com preocupação por Washington e seus aliados na Europa, que temem que o desenvolvimento de ogivas atômicas possam criar ainda mais instabilidade em uma região marcada por desacordos geopolíticos entre grupos islâmicos xiitas e sunitas, bem como tensões envolvendo a existência de Israel, principal aliado Ocidental no Oriente Médio.
Sob a liderança do então presidente americano, o democrata Barack Obama (2009-2017), Washington e Teerã costuraram em 2015 um acordo chancelado pelos membros do Conselho de Segurança da ONU e pela União Europeia para manter o desenvolvimento nuclear no país apenas para fins energéticos e pacíficos. Em troca, EUA e UE aceitavam retirar sanções aplicadas ao regime. Contudo, a saída dos EUA do acordo nos anos de Donald Trump (2017-2021) praticamente revogou o acordo — e acelerou a produção de urânio enriquecido (a matéria-prima da bomba atômica) pelo Irã.
De acordo com um relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), publicado no fim do ano passado, o programa iraniano dispunha de 4.486,8 kg de urânio em 28 de outubro, 22 vezes mais do que os 202,8 kg estabelecidos pelo acordo nuclear de 2015. A mesma agência também registrou uma aceleração no programa de enriquecimento de urânio, estimando que Teerã já dispõe de algo próximo a 128 kg de urânio enriquecido a 60% — para a fabricação de uma bomba atômica no padrão utilizado por EUA e Rússia, esse valor precisa chegar a 90%. Em março do ano passado, a agência notificou ter encontrado "partículas" de urânio enriquecidas com 83,7% de pureza.
A preocupação com o urânio a 60% não é apressada, de acordo com analistas. Em um ensaio publicado em 2021 — quando o enriquecimento do urânio iraniano começou a chamar a atenção das autoridades — o Instituto Internacional para Estudo da Paz de Estocolmo (Sipri, na sigla em inglês), apontou que as centrífugas utilizadas no processo são projetadas para cumprir em etapas. O salto de enriquecimento de 60% para 90%, portanto, poderia acontecer "em um período muito curto", na avaliação dos pesquisadores do instituto.
Autoridades da AIEA consideram a possibilidade de o Irã já ter reunido tecnologia e matéria-prima suficientes para fabricação de ogivas. Contudo, admitem que é difícil ter uma imagem próxima da realidade com as limitações impostas pelo Irã à fiscalização internacional. O presidente da agência, Rafael Grossi, criticou a falta de transparência de Teerã durante uma entrevista à agência Bloomberg, durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos, classificando as tentativas de fiscalização como "um ciclo frustrante".
Inspetores da AIEA foram proibidos pelo governo iraniano de entrar em instalações no último ano. Uma fonte diplomática revelou, em dezembro do ano passado, que as autoridades do país teriam vetado ao menos oito especialistas da agência, entre eles franceses e alemães. A fiscalização rotineira das instalações era uma das exigências impostas a Teerã pelo acordo de 2015, que na prática, na ausência dos EUA, não é cumprido.
Publicamente, Teerã nega que o programa nuclear do país tenha qualquer finalidade ofensiva. Ao mesmo tempo, autoridades que administram o desenvolvimento da tecnologia afirmam que o país já reúne capacidades técnicas para produzir uma bomba nuclear. O chefe da Organização de Energia Atômica iraniana, Mohammad Eslami, afirmou, recentemente, que o Irã possui capacidade técnica para fabricar uma bomba atômica, mas que a doutrina militar do país não admite o uso de armas de destruição em massa.
(Com AFP e Bloomberg)