Mundo

Primeiro ano de relação Cuba-EUA é marcado pela desconfiança

Após a reconciliação diplomática, os velhos inimigos da Guerra Fria estão longe de uma relação normal, e se comportam como um civilizado casal divorciado


	EUA e Cuba: após a reconciliação diplomática, os velhos inimigos da Guerra Fria estão longe de uma relação normal, e se comportam como um civilizado casal divorciado
 (Ueslei Marcelino / Reuters)

EUA e Cuba: após a reconciliação diplomática, os velhos inimigos da Guerra Fria estão longe de uma relação normal, e se comportam como um civilizado casal divorciado (Ueslei Marcelino / Reuters)

DR

Da Redação

Publicado em 18 de julho de 2016 às 16h01.

"Não há nada a temer, já que serão muitos os benefícios de que gozaremos", prometeu o secretário de Estado americano, John Kerry, a uma Cuba que um ano depois continua demonstrando desconfiança em relação aos Estados Unidos.

No dia 20 de julho, a reabertura da embaixada cubana em Washington completa um ano. Foi um mês após Kerry ter pronunciado essas palavras, depois de ver a bandeira americana ser hasteada na ilha depois de mais de meio século.

Após a reconciliação diplomática, os velhos inimigos da Guerra Fria estão longe de uma relação normal, e se comportam como um civilizado casal divorciado que defendem os próprios interesses.

"Acho que Cuba e Estados Unidos nunca foram amigos e dificilmente chegarão a ser", disse à AFP Jesús Arboleya, ex-diplomata e analista cubano especializado na agenda bilateral.

"Prefiro definir essa relação como "uma convivência entre contrários". O acadêmico e ex-embaixador britânico em Cuba, Paul Hare, acredita que ambos os governos falam em "normalidade" por receio de que isso seja interpretado como uma "rendição ideológica".

"Eles querem manter relações discretas: nem amigáveis, nem antagônicas", diz a AFP.

Investimentos pioneiros

Desde que iniciaram a aproximação no final de 2014, Estados Unidos e Cuba trataram civilizadamente suas diferenças, mas sem remover os históricos obstáculos de sua relação.

Do lado americano persiste o embargo que tanto prejudica os cubanos, apesar das medidas de alívio adotadas pelo presidente Barack Obama.

Mesmo que Cuba as considere "insuficientes", a flexibilização do castigo permite que alguns americanos se animem a investir em Cuba, um destino econômico por explorar, que oferece mão-de-obra barata e qualificada.

Hoje, é possível ver atracar em Havana um cruzeiro da Carnival proveniente de Miami e hospedar-se no Four Points by Sheraton, da rede Starwood, as primeiras grandes empresas a incursionar em décadas na ilha.

Espera-se que a partir de setembro comecem os voos comerciais entre ambos os países. Entretanto, só "um pequeno grupo de companhias americanas teve a permissão de fazer negócios em Cuba", por conta do "bloqueio", reclamou recentemente o embaixador cubano em Washington, José Ramón Cabañas.

Obama, que marcou o ápice da nova era com Cuba com uma visita a Havana em março, onde deu por enterrada a Guerra Fria, fracassou em sua tentativa de convencer o Congresso, de maioria republicana, de suspender o embargo depois de 54 anos.

O governo cubano continua esperando que o anúncio da Casa Branca de permitir que a ilha use o dólar em suas transações internacionais se concretize. Isso facilitaria e reduziria os custos em importação de alimentos.

Por mais paradoxal que pareça, "o bloqueio não permite aos Estados Unidos exercer sua política a Cuba", que é a de "penetração do capital, da cultura", comenta Arboleya.

Suspeitas

Um mês depois da simbólica visita de Obama, Cuba ratificou o rumo socialista da economia e o sistema de partido único, ignorando os pedidos de abertura política feitos pelo presidente americano.

O presidente Raúl Castro ficou alerta aos programas americanos de "promoção da democracia", e os vinculou a uma tentativa de "acabar com a revolução e com o socialismo em Cuba por outras vias".

Enquanto os governos em Cuba lidam com a desconfiança, os milhares de cubanos continuam tentando entrar nos Estados Unidos, por meio de precárias embarcações ou seguindo longas travessias por terra, estimulados pelos benefícios migratórios criticados por Havana.

Entre outubro e junho, pelo menos 4.807 cubanos tentaram chegar em solo americano por balsas, segundo dados da Guarda Costeira dos EUA. No ano fiscal anterior (outubro 2014-setembro 2015), foram 4.473.

Enquanto isso, os americanos ainda não podem viajar como turistas por causa das restrições do embargo, e devem obedecer uma série de condições ou categorias para viajar a ilha.

Apesar disso, as visitas dispararam até 84% em comparação ao ano passado, chegando a 161.000 americanos em Cuba.

"O aumento do turismo e do comércio com os Estados Unidos poderá ser um impulso importante para uma economia (cubana) esclerosada, que sofre com o colapso da Venezuela", sua maior aliada, opinou Michael Shifter, presidente do centro de análise Diálogo Interamericano, com sede em Washington.

Diante dos que criticam a falta de maiores avanços, Arboleya lembra que este "é um processo muito jovem" que partiu "de um divórcio absoluto".

Acompanhe tudo sobre:América LatinaCubaEstados Unidos (EUA)Países ricos

Mais de Mundo

Imigração dos EUA se desculpa após deter cidadãos americanos que falavam espanhol

EUA congelam financiamento federal para ONGs que atendem migrantes

Trump confirma contatos com Moscou para repatriar vítimas russas de acidente aéreo

Após acidente, Trump ordena revisão de protocolo aéreo e mudanças de contratação feitas com Biden