Manifestante queima pneus durante manifestação após a demissão do primeiro-ministro Ariel Henry, em Porto Príncipe, Haiti (Jean-Daniel SENAT com Gerard MARTINEZ em Miami/AFP Photo)
Agência de notícias
Publicado em 13 de março de 2024 às 17h09.
Última atualização em 13 de março de 2024 às 17h22.
Partidos políticos e personalidades do Haiti se esforçavam, nesta quarta-feira, 13, para pactuar a composição do conselho presidencial de transição que substituirá o governo do primeiro-ministro demissionário, Ariel Henry, e tentará dar alguma estabilidade ao país caribenho, devastado pela violência de facções criminosas.
A tarefa é complicada pelo curto prazo exigido pela comunidade internacional — 48 horas, segundo os Estados Unidos — e a necessidade de distribuir os sete membros do conselho entre partidos políticos diferentes e o setor privado.
Mas a maioria destes partidos ainda não apresentou candidatos enquanto seguem as conversações, segundo averiguou um correspondente da AFP.
Apenas uma coalizão, EDE/RED/Compromis historique, próxima do falecido presidente Jovenel Moïse — assassinado em 2021 —, apresentou como sua representante a ex-ministra da Condição Feminina, Marie Ghislaine Mompremier.
A escolha é mais complicada nas fileiras do coletivo 21 de dezembro, do primeiro-ministro Henry, que está dividido sobre quem deve ser o candidato. A maioria elegeu o ex-deputado Vikerson Garnier, mas alguns membros se opuseram.
"Estamos falando de partidos políticos que não souberam entrar em acordo nos últimos anos", explicou à AFP Ivan Briscoe, diretor do Programa para a América Latina e o Caribe do International Crisis Group.
Agora que Henry está de saída, "talvez olhem para o interesse nacional e deixem de lado seus interesses partidários durante algum tempo, até as eleições. Mas é evidente que há dúvidas sobre sua capacidade de chegar a um acordo", acrescentou.
O êxito ou não das novas autoridades dependerá, em grande parte, da capacidade de restabelecer a segurança em um país submetido a poderosos grupos armados.
As facções aliaram-se no começo do mês para atacar locais estratégicos como o palácio presidencial, delegacias e prisões, em um desafio aberto a Henry, cuja renúncia exigiam, alertando que, caso contrário, haveria um "genocídio".
"As gangues se tornaram muito poderosas. Entraram profundamente nas comunidades", adverte Briscoe. "Não vão desaparecer e adotaram uma retórica política cada vez mais beligerante."
Seu líder, o ex-policial Jimmy Chérizier, apelidado de "Barbecue", já deixou claro que não aceitaria um governo proposto pela Comunidade do Caribe (Caricom).
Na segunda-feira, o bloco regional anunciou a instauração do conselho presidencial de transição no Haiti, após uma reunião na Jamaica com representantes da ONU e de países como Estados Unidos e França.
Henry anunciou pouco depois que renunciaria, em mensagem enviada de Porto Rico, onde está há dias após não conseguir voltar ao seu país.
O primeiro-ministro, no poder desde o assassinato do presidente Moïse, era muito questionado em um país que não realiza eleições desde 2016.
Enquanto isso, em Porto Príncipe, sacudido pela violência nas últimas semanas, as atividades comerciais foram retomadas nesta quarta-feira, segundo um corresponde da AFP.
Era possível ver o transporte público nas ruas e alguns escritórios da administração pública reabriram após permanecerem fechados por mais de duas semanas.
No começo do mês, as autoridades haviam declarado estado de emergência e toque de recolher na capital, mas essas medidas não descomprimiram a situação.
Nesta quarta-feira, no entanto, as escolas permanecem fechadas, assim como o aeroporto internacional.
Muitos moradores da capital comemoraram a partida do primeiro-ministro, mas alguns questionam o papel que as gangues, que controlam amplas áreas do país, vão desempenhar.
Henry "era o maior obstáculo que tínhamos [...] Não tinha um verdadeiro plano para o país. Mas deveríamos ter um mecanismo rápido para substituí-lo", declarou Emmanuel, um homem que não quis revelar seu sobrenome.
Agora, "cabe ao povo haitiano decidir quem deve ser o primeiro-ministro e o presidente. Estas pessoas devem ser haitianos patriotas e ter senso da soberania nacional", acrescentou Jean Dieuchel.
Fritz Fils Aimé, por sua vez, acredita que "agora não se pode fazer nada se não for coordenado com as gangues".
Em um sinal de que a situação está longe de se estabilizar, o Quênia decidiu suspender o envio de policiais ao Haiti como parte de uma missão internacional apoiada pela ONU.
Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), mais de 360.000 pessoas foram deslocadas no Haiti.
A União Europeia (UE), que evacuou todo o seu pessoal do país, anunciou, nesta quarta, que enviaria 20 milhões de euros (cerca de R$ 109 milhões) em ajuda humanitária ao Haiti, devido ao "nível sem precedentes de violência entre quadrilhas".