Cabul, no Afeganistão: jovem linchada tinha problemas mentais (Getty Images)
Da Redação
Publicado em 21 de março de 2015 às 16h43.
Cabul - Pelo menos 11 pessoas foram detidas por suspeita de envolvimento no linchamento de uma jovem com problemas mentais em Cabul, a capital do Afeganistão, que foi acusada de queimar o Corão, o livro sagrado do Islã, informou neste sábado à Agência Efe uma fonte policial.
A mulher, chamada Farkhonda, de 27 anos, morreu depois que foi brutalmente agredida na sexta-feira por um grupo de pessoas.
"Detivemos até agora 11 pessoas, entre eles vigias do santuário e escritores de talismãs. Acredita-se que eles foram responsáveis por confundir centenas de transeuntes", disse o chefe do departamento de investigação criminal da polícia de Cabul, Farid Afzali.
A polícia não encontrou provas de que a jovem havia queimado uma cópia do livro sagrado muçulmano, por isso "foi um mal-entendido das pessoas e só encontramos alguns pedaços de papel queimados em um forno metálico", afirmou Afzali.
A família da vítima garantiu para a polícia que a mulher já foi uma especialista na religião e completou vários graus de estudos, mas sofria de transtornos psicológicos há 16 anos.
Os vídeos divulgados nas redes sociais mostram uma multidão, em sua maioria homens jovens, agredindo a mulher com pedaços de pau, pedras e golpes. Em seguida, o grupo aprece ateando fogo a seu corpo para depois jogá-lo no rio Cabul.
O crime ocorreu em uma área movimentada da cidade dentro do santuário de Shah-Do-Shamshira, aonde muitas mulheres vão para rezar e comprar amuletos dos escritores de talismãs.
Organizações civis condenaram o linchamento, do qual foram divulgadas muitas imagens e vídeos nas redes sociais. Nas imagens, a vítima garantiu que não havia queimado o Corão, mas apenas "papéis sem uso, que estavam jogados".
"Ela foi enviada pelos americanos, que vergonha, está queimando o Corão", gritavam algumas pessoas nos vídeos, que foram utilizados pela polícia para efetuar as detenções.
"A surra durou cerca de 45 minutos, foi presenciada por policiais e aconteceu a apenas um quilômetro de distância do Ministério do Interior e de vários edifícios das forças de segurança, mas ninguém prestou socorro", declarou à Efe o ativista de direitos sociais Abdul Wadoud Pedram.
Vários grupos foram criados no Facebook para exigir uma investigação por parte do governo, com o slogan "Justiça para Farkhonda".
Afzali declarou que os policiais presentes fizeram o possível, mas foram incapazes de evitar o linchamento, pois havia "milhares" de pessoas.
O presidente afegão, Ashraf Gani, ordenou ontem uma investigação completa do incidente. Gani afirmou em comunicado que o incidente foi um ato de "extrema violência" e advertiu que "fazer julgamentos pessoais está em clara contradição com a Justiça islâmica".
A conservadora sociedade afegã é muito sensível aos casos de blasfêmia e profanação do Corão.
Pelo menos quatro civis morreram e cinco ficaram feridos em 2013 depois que homens não identificados abriram fogo durante um protesto contra um policial que profanou um Corão no sul do país.
Em fevereiro de 2012, a suposta queima de exemplares do Corão na prisão de Bagram, perto de Cabul, suscitou uma onda de violência em diferentes pontos do país na qual morreram mais de 30 pessoas.