Mundo

Peru não sabe o que fazer com "Cristo da Corrupção" dado pela Odebrecht

Presente de Marcelo Odebrecht para Alan García, o monumento que era pra ser o "Cristo do Pacífico" agora é associado a roubo de dinheiro público

Cristo do Pacífico: Monumento religioso é associado à corrupção, pois foi doado pela Odebrecht (Luis Jaime CISNEROS/AFP)

Cristo do Pacífico: Monumento religioso é associado à corrupção, pois foi doado pela Odebrecht (Luis Jaime CISNEROS/AFP)

A

AFP

Publicado em 18 de julho de 2019 às 12h32.

Um enorme monumento que representa o Cristo Redentor carioca se transformou no pomo da discórdia no Peru, onde milhares de cidadãos exigem que seja retirado por se tratar de "um símbolo da corrupção".

O Cristo do Pacífico foi inaugurado em 29 de junho de 2011 na colina de Chorrillos, na costa sul de Lima, pelo então presidente Alan García, e foi financiado pela construtora brasileira Odebrecht, ambos protagonistas de um megaescândalo de corrupção que atinge outros ex-chefes de Estado peruanos.

Há algumas semanas, uma ONG iniciou uma campanha para que o monumento seja retirado do país.

"Pedimos a retirada do monumento Cristo do Pacífico, conhecido como 'Cristo do Roubo, ou Cristo da Odebrecht', porque é um símbolo da corrupção, que foi doado por Marcelo Odebrecht a Alan García", afirma à AFP Cristhian Rojas, líder do movimento "É o Momento".

Desde que a Odebrecht se tornou sinônimo de corrupção no Peru, o monumento é uma pedra no sapato do governo.

A empresa brasileira admitiu que pagou para subornar milionários e, com isso, vencer licitações de obras públicas em vários governos, incluindo o segundo de García (2006-2011).

De acrílico e concreto, o monumento de 37 metros de altura custou 800.000 dólares. Foi financiado principalmente pela Odebrecht. García contribuiu com 30.000 dólares.

"É um Cristo parecido com o do Corcovado, que eu chamei de Cristo do Pacífico. Juntei um grupo de amigos e empresas e também coloquei minhas economias, porque gostaria que fosse uma figura que abençoasse o Peru", explicou Garcia na época.

Quando foi inaugurado, um mês antes do término do mandato de Garcia, a Odebrecht se preparava para iniciar a Linha 1 do Metrô de Lima, obra que, como se sabe agora, custou sete milhões de dólares em subornos para a construtora brasileira vencer a licitação.

Sem recursos

O grupo enviou ao governo o pedido de retirada do monumento um mês após o suicídio de García. O ex-presidente deu um tiro na cabeça em 17 de abril, quando seria preso no âmbito de uma investigação por receber doações da Odebrecht.

A petição tinha a assinatura de 4.700 pessoas que pediam a retirada do monumento.

Sem se pronunciar sobre o mérito do assunto, o governo de Martín Vizcarra respondeu, dizendo que falta o orçamento para retirar a controvertida estátua.

"O governo não tem recursos suficientes para cobrir as despesas que seriam necessárias para o desmantelamento e a transferência do monumento", diz uma carta oficial enviada em 10 de julho pela Presidência do Conselho de Ministros ao movimento "É o Momento".

Rojas diz que sua organização não procura demolir o monumento, mas transferi-lo para um local religioso.

Muito pouco visitada, a obra não tem uma placa que indique que foi doada pela Odebrecht.

Além disso, parece negligenciado e sujo, em contraste marcante com o brilho de dois monumentos militares aos heróis da guerra contra o Chile (1879-1883) localizado a cerca de 200 metros de distância.

Silêncio dos bispos

Os ativistas de "É o Momento" evitaram bater de frente com a Igreja, em um país predominantemente católico e conservador.

"Não é nossa intenção demolir, ou atacar o aspecto religioso do monumento, mas atacar o simbolismo da corrupção", enfatiza Rojas. "García usou uma imagem religiosa para limpar um símbolo de corrupção", insistiu.

Quando foi inaugurado, o papa Bento XVI enviou uma mensagem de felicitações.

Já o cardeal ultraconservador peruano Juan Luis Cipriani convidou os fiéis a torná-lo "um objeto de peregrinação para milhares de pessoas", algo que não aconteceu.

Agora, os bispos preferem se manter em silêncio a pedido do "É o Momento".

"A questão é delicada", disse uma fonte da Conferência Episcopal à AFP.

Em meio à polêmica, o monumento também conta com a simpatia de pessoas comuns.

"Acho que deveria ficar porque, desde que o trabalho foi concluído, muitas famílias o visitam, principalmente no verão", comenta o taxista Elio Olázabal.

Acompanhe tudo sobre:CorrupçãoNovonor (ex-Odebrecht)Peru

Mais de Mundo

Como hotéis de luxo de Washington fazem para receber presidentes com discrição

Venezuela mobiliza 150 mil homens em exercícios militares para 'garantir soberania'

Em Davos, Milei pede que países abracem 'batalha pela liberdade'

Secretário-geral da Otan elogia fala de Trump sobre novas sanções à Rússia