Tim Howard, goleiro titular da seleção dos Estados Unidos na Copa de 2014 (Getty Images)
Da Redação
Publicado em 16 de setembro de 2014 às 23h32.
Portland/Nova York - No dia seguinte da derrota dos EUA para a Bélgica na Copa do Mundo, em julho, o goleiro de 35 anos de idade da seleção perdedora dominou o noticiário, apontado como um herói por seu recorde de 16 defesas.
Carlton Sedgeley, que representa oradores públicos remunerados há quase cinco décadas por meio de sua empresa, a Royce Carlton, com sede em Nova York, viu Tim Howard na TV naquele dia e teve uma ideia: o futebolista poderia transformar seus 120 minutos de valentia em palestras lucrativas pelos próximos 12 meses.
“Trata-se de visibilidade”, diz Sedgeley. “Quanto maior a visibilidade, maior a tarifa”.
Em uma mudança inesperada nesta era de domínio digital, a revista Bloomberg Pursuits reportará em sua edição Autumn 2014, as pessoas estão dispostas a pagar grandes somas de dinheiro por um contato humano analógico.
“Todos querem dizer ‘eu almocei com Michael Lewis ontem’”, diz Don Epstein, fundador da Greater Talent Network, que representa o ator de best-sellers desde a publicação de ‘Liar’s Poker’, em 1989.
“Pode ser você e outras 500 pessoas, mas mesmo assim aconteceu”.
Cerca de 225 milhões de pessoas cumprimentaram, compartilharam bebidas e fizeram anotações em 1,8 milhão de convenções, reuniões empresariais e feiras em 2012, segundo o Conselho da Indústria de Convenções dos EUA.
Essas multidões se traduzem em quantiosas taxas de participação para figuras públicas famosas em busca de lucrar com suas prestigiosas, e às vezes parcimoniosas, antigas profissões.
Lucrando
Ari Fleischer, secretário de imprensa do presidente George W. Bush durante os ataques de 11 de setembro, cobrou com gosto.
Imediatamente depois de deixar a Casa Branca - e seu salário anual de US$ 151.000, em 2003, Fleischer discursou para audiências pagas várias vezes por semana, recebendo US$ 40.000 por apresentação, segundo sua agência, a Washington Speakers Bureau, com sede em Alexandria, Virgínia.
“De repente, eles enviam carros para te buscar e você viaja na primeira classe e fica em bons hotéis e te pagam”, diz Fleischer. “Foi o pouso mais suave do mundo para qualquer um que deixa o governo”.
Os ex-presidentes conseguem os maiores pagamentos. Em 1977, Gerald Ford se tornou o primeiro ex-presidente dos EUA a cobrar por um discurso, levantando US$ 25.000 por apresentação.
Desde então, nenhum presidente se saiu melhor do que Bill Clinton, que recebia apenas US$ 200.000 por ano como comandante em chefe, mas que na sequência chegou ao circuito de oradores e colheu US$ 106 milhões com 544 discursos entre fevereiro de 2001 e janeiro de 2013, uma média de US$ 200.000 por evento, segundo as declarações financeiras de sua esposa Hillary.
Por duas vezes Clinton arrecadou US$ 700.000 em eventos em Lagos, Nigéria, patrocinados por Nduka Obaigbena, CEO e editor-chefe do jornal nigeriano ThisDay, que é amigo de Beyoncé e Ice-T.
Banqueiros centrais também se dão bem, pelo menos quando acabaram de deixar as reuniões a portas fechadas nas quais estabeleceram as taxas de juros.
Ben S. Bernanke, por exemplo, deixou seu emprego de US$ 200.000 ao ano como chefe da Reserva Federal dos EUA no fim de janeiro; em março, ele estava lucrando pelo menos isso por discurso, segundo uma pessoa que o contratou.
Nos próximos meses, Bernanke deverá falar a assessores de investimento reunidos pela Charles Schwab em Denver e a gestores de fundos hedge na SkyBridge Alternatives (ou SALT) Conference, em Cingapura.
Apesar das somas às vezes estratosféricas, a maior parte da ação no circuito de oradores está concentrada em níveis sub-clintonianos.
Milhares de oradores, representados por dezenas de agências, lotam com suas malas de rodinhas os compartimentos superiores dos aviões com destino a Las Vegas, Nova Orleans ou St. Louis, onde comem bife bem-passado e discursam para engenheiros elétricos, agentes de seguro e endocrinologistas.
Greater Talent
Epstein fundou a Greater Talent em 1982, após assegurar gente como o jornalista Hunter S. Thompson, famoso por sempre atrasar, para fazer discursos em universidades nos anos 1970.
“Eu sempre tinha que mentir para o Hunter”, diz Epstein. “Se ele tinha que estar no palco às 7, eu dizia a ele que era às 5”.
Muito antes da Greater Talent, contudo, existia a Harry Walker Agency, a gigante de 68 anos de antiguidade com sede em Nova York que representa o casal Clinton, o estrategista político republicano Karl Rove e outros grandes nomes da elite de Washington.
A empresa agora é administrada por Don Walker, filho do homem que dá nome à empresa, que, polidamente, recusou-se a conceder entrevista sobre a firma, assim como fizeram todos os oradores (e a maioria de seus clientes) quando o assunto dinheiro veio à tona.
A última coisa que alguém deseja que você saiba, pelo que se vê, é quanto ele ou ela lucra no circuito.
Cada contrato assinado com um orador tem uma cláusula de confidencialidade, diz Brian Hamburger, fundador da MarketCounsel, uma empresa de consultoria de compliance regulatória com sede em Englewood, Nova Jersey.
Hamburger deve saber o que diz: de 2006 para cá ele construiu e tornou sua empresa conhecida com uma conferência anual de palestrantes famosos -- não em púlpitos, mas em painéis, confrontando-se.
Las Vegas
Em dezembro, diz Hamburger, ele espera receber 550 pessoas no Four Seasons Hotel em Las Vegas.
Mark Cuban, dono do Dallas Mavericks, da NBA, está na programação, juntamente com o ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC, na sigla em inglês), Christopher Cox.
Em outubro de 2013, Cuban saiu vitorioso após uma investigação da SEC iniciada na gestão de Cox.
Um júri de Dallas rejeitou as acusações de que ele usou informação privilegiada para vender sua participação em uma empresa de internet canadense, nove anos antes, para evitar um prejuízo.
Se tudo ocorrer como Hamburger espera, vai fechar o tempo em Nevada durante o encontro entre Cuban e Cox.
O prêmio de melhor uso dos oradores como isca para conferências, contudo, vai para Anthony Scaramucci, que dirige o fundo hedge SkyBridge Capital LLC.
Em 2008, Scaramucci viu os ativos de sua empresa dessangrarem quando os mercados despencaram. Na época, como Bugsy Siegel, ele olhou para Las Vegas em busca de redenção, preparando uma grande conferência para mostrar ao mundo que ele ainda estava nos negócios.
Na conferência SALT inaugural, em 2009, Scaramucci recorreu ao financista e filantropo Michael Milken e ao ex-presidente da SEC Harvey Pitt para entreter seus 500 espectadores.
No ano seguinte, ele gastou US$ 175.000 para assegurar Bill Clinton e em 2011, pagou aproximadamente o mesmo por George W. Bush.
Mesmo os oradores pagos mais populares -- como o ex-secretário de Defesa Robert Gates, o grande pensador Fareed Zakaria e talvez até mesmo o casal Clinton em si -- provavelmente serão eclipsados por alguém que não estará apto a entrar no circuito antes do meio-dia de 20 de janeiro de 2017: Barack H. Obama. O 44º presidente tem todas as credenciais corretas.
Ele se tornou candidato não com suas propostas políticas, mas falando na Convenção Nacional Democrata em Boston, em 2004, onde deslumbrou os dignatários democratas com aforismos instantâneos como “a audácia da esperança”.
Quatro anos depois, seu discurso na corrida para sua primeira campanha para presidente lhe rendeu comparações com Robert Kennedy e Abraham Lincoln.
“Ele terá um tremendo apelo”, diz Richard Henning, fundador da Celebrity Forum Speakers Series, com sede na Califórnia, que contratou todos os presidentes desde Gerald Ford, exceto Bush, que se recusou a discursar para uma plateia do Vale do Silício, um reduto democrata.
“Eu tenho o sonho de encerrar minha carreira aos 50 anos com Obama. Uma grande maneira de me retirar”.