Xi Jinping: “Xi é forte e cada vez mais consolida suas ideias frente ao público externo e externo,” afirma Qiao Liang (Fred Dufour/Reuters)
Da Redação
Publicado em 17 de outubro de 2017 às 19h21.
Última atualização em 19 de outubro de 2017 às 16h03.
Pequim – PEQUIM – O ar poluído é o mesmo de sempre, mas a rotina de Pequim, a capital chinesa, está diferente para o 19º Congresso do Partido Comunista Chinês (PCC), que começa nesta quarta-feira 18. Pelas ruas, a palavra maior é ordem. Policiais atentos a cada detalhe se espalham de dez em dez metros. No metrô, cada bolsa e cada bolso são verificados com detectores de metal, o que tem causado filas nas entradas das estações. Os passaportes dos estrangeiros são constantemente checados. Nos endereços mais populares da cidade, bares foram fechados ou interditados por tempo indeterminado. Prestes a receber cerca de 3.500 representantes da elite política da mais populosa nação do mundo, Pequim não abre espaço para tumulto.
Com apenas duas edições por década, a convenção é o maior e mais importante acontecimento político deste regime de partido único. É onde se elege a alta liderança da segunda maior economia do mundo para os próximos cinco anos. E é onde são esboçadas as diretrizes políticas, econômicas e sociais para o futuro do país. Por se tratar de um evento que acontece a portas fechadas, é de praxe que haja muita especulação antes que as decisões sejam oficialmente anunciadas – e que muita coisa já tenha sido decidida em reuniões com a elite do partido comunista, que no total tem 89 milhões de integrantes.
Este ano, a expectativa é mais intensa do que o usual. Não apenas por estarmos diante de um período conturbado no cenário político internacional, mas principalmente pelo alto grau de influência do presidente chinês Xi Jinping, que se consolida como o mais poderoso e popular líder nacional desde Mao Tsé-Tung. Não há muitas dúvidas quanto à decisão mais importante do congresso: Xi ficará no cargo por mais cinco anos. Sua força política é tanta que observadores já se perguntam se ele de fato deixará o cargo em 2022.
Sua força é destaque nos jornais ocidentais. O britânico The Guardian afirmou que o congresso vai reafirmar a posição dele enquanto um dos mais influentes líderes da história moderna da China. A compatriota revista The Economist o caracterizou como “o líder mais poderoso do mundo.” A americana Time diz que Xi pode atingir o status de Chairman do partido, o que significa uma concentração ainda maior do poder em suas mãos. O New York Times afirma que Xi usará o congresso para escrever seu nome na história do partido que governa a China desde 1949.
Sua eleição, em 2012, foi crucial para a atual política externa chinesa, que posiciona o país como líder dos países em desenvolvimento e, mais recentemente, como embaixador da sustentabilidade e como contraponto à impetuosidade do americano Donald Trump. Seu principal objetivo é retomar a grandeza chinesa.
Sob o respaldo de Xi, a China lançou a One Belt One Road, a mais ambiciosa iniciativa de investimentos do planeta, unindo por terra e água os países da área de influência chinesa. O governo também tem incentivado uma crescente onda de investimentos chineses mundo afora – o país já é segundo maior investidor do planeta, atrás apenas dos Estados Unidos. É, vale lembrar, o maior parceiro comercial do Brasil. “Xi é forte e cada vez mais consolida suas ideias frente ao público externo e externo,” afirma Qiao Liang, cientista político e professor da Universidade Renmin, em Pequim. “Não há dúvidas de que ele prosseguirá com seu segundo mandato e constitucionalmente não há nenhum empecilho a um terceiro.”
A permanência de Xi no poder leva especialistas a acreditar que a reunião da cúpula do Partido Comunista Chinês não trará grandes mudanças em relação às políticas já em curso. A grande questão para o 19º congresso será a eleição de uma nova geração de líderes. Exceto por Xi e pelo primeiro-ministro Li Keqiang, os outros cinco membros do conselho permanente do Politburo – a alta liderança do partido – estão atingindo o limite consensual de 67 anos para aposentadoria. “O congresso deste ano é especial porque representará uma enxurrada de novas ideias trazidas pelos mais jovens, que vão determinar o futuro do país,” diz Qiu Zeqi, diretor do Centro de Pesquisa Sociológica e Estudos de desenvolvimento da Universidade de Pequim.
É impossível saber quem entra ou quem fica, mas especialistas especulam que Wang Qishang, responsável pela campanha anticorrupção de Xi e braço direito dele, burle o consenso e não se aposente, a despeito de sua idade avançada. A manobra poderia, inclusive, abrir espaço para Xi, hoje com 64 anos, assumir novas posições no futuro. “Há muitas incertezas, mas independentemente de quem compuser a alta cúpula, todos servirão ao partido e seguirão os mesmos princípios para atingir um consenso,” explica Qiu.
O resultado desta eleição é guardado a sete chaves e será acompanhado de um grande desafio para quem permanece: produzir impactos positivos em cima das políticas já existentes e manter a legitimidade do partido. A inexistência de oposição e a iminência de inquietação social frente a problemas ainda irresolutos do país, como as questões ambiental, demográfica, e de acesso à informação, tem levado Xi a repensar parte das políticas. As informações ambientais estão mais abertas, mas a imprensa e empresas internacionais continuam sob controle estrito.
“O ‘Sonho Chinês’ e o aparente culto à personalidade do presidente Xi se ligam à necessidade de buscar uma nova base ideológica, que se associa às raízes do passado: as doutrinas maoísta e confucionista,” afirma Jean-Pierre Cabestan, professor e diretor do Departamento de Estudos de Governo e Relações Internacionais da Hong Kong Baptist University, de Hong Kong. “A fundamentação do regime de Xi se concentra na diferenciação: a China é diferente do resto do mundo e por isso pode ter sucesso.”
A força política do presidente chinês também traz especulações quanto ao modus operandi do próprio governo. Há quem acredite, por exemplo, na possibilidade de o comitê permanente do Politburo ser reduzido de sete para cinco membros. Os mais radicais ainda imaginam que o conselho seja extinto, o que causa inquietação no cenário internacional. Mas há sempre a possibilidade de que a montanha paira um rato, e o congresso não traga nenhuma grande surpresa. “Este é um país que muda e se planeja em longo prazo, não acredito que o congresso traga mudanças drásticas, especialmente no que diz respeito a alterações estruturais,” afirma Yukon Huang, pesquisador sênior do Carnegie Endowment em Washington D.C. e ex-diretor para a China do Banco Mundial, direto de Pequim. De qualquer forma, os olhos do mundo estarão voltados para Pequim, e mais especificamente para Xi Jinping, nesta quarta-feira.