Presidenta Dilma Rousseff com Sua Santidade, em fevereiro, em Roma: vontade de renovar a Igreja Católica, especialmente a Cúria, deu a Francisco grande simpatia na América Latina (Roberto Stuckert Filho/PR)
Da Redação
Publicado em 11 de março de 2014 às 17h04.
Bogotá - Francisco, o primeiro papa originário da América Latina, despertou em seu primeiro ano de pontificado entusiasmo, esperanças de mudança e uma quase unânime opinião favorável na região com seu estilo simples e sua pontaria certeira para identificar as causas dos males que afligem os indivíduos e a sociedade.
Poucos são os líderes latino-americanos que não encontraram com Francisco desde sua escolha, em 13 de março de 2013, mas não somente para eles as portas do Vaticano foram abertas. Por ela também entraram opositores, dissidentes, os que sofrem e os que clamam por justiça.
Como afirmou em seu dia de encontro o presidente do Equador, Rafael Correa, católico praticante, o papa "está falando muito claro, muito forte" e é "muito próximo das pessoas, dos problemas locais e mundiais".
Em sua primeira reunião com o papa, há quase um ano, Cristina Kirchner, presidente da Argentina, país natal de Francisco e por esse motivo a primeira chefe de Estado que ele recebeu, o encontrou "ocupado e preocupado com a enorme tarefa de dirigir o Vaticano e o compromisso de mudar as coisas que ele sabe que tem que mudar".
É exatamente a vontade de renovar a Igreja Católica, especialmente a Cúria, que já deu frutos no seu primeiro ano de pontificado, que deu a Francisco grande simpatia em sua região.
Sua defesa do perdão e da misericórdia, sua aposta pelos pobres e seu espírito tolerante como com as questões dos homossexuais e do divórcio - não com o aborto - aproximaram muitos desencantados da igreja.
O que já é chamado de "efeito Francisco" é de vital importância para que a igreja não perca mais espaço na América Latina frente aos evangélicos e outras religiões. É nessa região que se concentra a maior quantidade de católicos do mundo, mais de 500 milhões ou 42% do total, e também onde há uma maior desigualdade na divisão das riquezas.
Em seu primeiro encontro com a imprensa internacional, Francisco exclamou há um ano: "ah, como gostaria de uma igreja pobre e pelos pobres!"
Opiniões como essa fizeram com que inclusive um ateu declarado, como o presidente do Uruguai, José Mujica, tenha ido a Roma para conhecê-lo, e, recentemente, tenha lido e falado em seu programa semanal na emissora estatal Rádio Uruguai sobre a exortação apostólica "Evangelii Gaudium" (A alegria do Evangelho).
"Neste documento, o papa está nos sacudindo, nos apontando coisas que seguramente machucam, mas que nos retratam em profundidade os problemas que o mundo de hoje enfrenta", disse Mujica no começo de fevereiro.
Francisco adotou uma postura firme contra a corrupção, a injustiça, os traficantes, aos quais chama os "mercadores da morte", o tráfico humano e a exploração dos imigrantes, todos eles temas muito delicados na América Latina.
"Ter um papa latino-americano é uma vitória para os pobres desta parte do continente", declarou recentemente João Pedro Stédile, líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que foi recebido por Francisco e participou de um seminário no Vaticano.
Francisco também deu atenção aos problemas políticos. Neste primeiro ano de pontificado, foi convidado para mediar a disputa anglo-argentina pela soberania das Malvinas, ajudar a conseguir a paz na Colômbia e a servir de "guia" para o futuro da Venezuela.
Francisco não se encontrou com o presidente cubano, Raúl Castro, mas sim com Berta Soler, líder do grupo opositor Damas de Branco, que pediu "ajuda para o povo de Cuba", e também escutou o líder da comunidade indígena argentina Qom, Félix Díaz, que expôs "as graves violações aos direitos humanos que os povos originais sofrem no continente latino-americano".
Para este mês está prevista uma audiência com representantes de organizações de imigrantes latino-americanos nos Estados Unidos, que querem pedir que ele interceda em favor da reforma migratória e a paralisação das deportações.
No Paraguai, o ativista de direitos humanos Martín Almada solicitou que seja divulgado o que é guardado nos arquivos do Vaticano sobre as ditaduras do Cone Sul nas décadas de 70 e 80, "para que se saiba a verdade e que a justiça aja".
Em novembro do ano passado, Francisco enviou uma carta em que afirmava que tem muito presente em suas orações os cidadãos dominicanos que sofrem por causa dos "pecados dos homens e mulheres da igreja", em referência às denúncias de abusos sexuais por parte de religiosos e um ex-núncio.
Francisco também se compadeceu das vítimas dos desastres naturais na América Latina, como as deixadas pelo furacão "Ingrid" e a tempestade tropical "Manuel" no México em setembro do ano passado.
Chovem convites para o papa visitar os países do continente, mas, por enquanto, ele só esteve no Brasil, onde liderou em julho do ano passado a Jornada Mundial da Juventude, evento que reuniu mais de 3,5 milhões de pessoas no Rio de Janeiro.
A presidente Dilma Rousseff, que se encontrou com Francisco em três ocasiões e brincou que se "o papa é argentino, Deus é brasileiro", já fez um novo convite: chamou o pontífice para assistir à Copa do Mundo.