Papa é recebido por comunidades cristãs de e outras religiões no norte do Iraque (Vincenzo PINTO / AFP/Getty Images)
Carla Aranha
Publicado em 7 de março de 2021 às 10h40.
Um dos momentos mais aguardados da peregrinação do Papa pelo Iraque, país que foi devastado pela guerra e o terrorismo especialmente nos últimos 18 anos, era a visita à cidades de Mossul, invadida pelo Estado Islâmico em 2014 e libertada em 2017, depois de uma intensa batalha. Muçulmanos, cristãos e pessoas de outras religiões chegaram em peso à cidade neste final de semana. Logo cedo, muitos já estavam na rua.
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O Papa chegou a Mossul por volta das 9h30 -- seu comboio dirigiu-se à parte antiga da cidade, da Idade Média, que foi destruída durante a guerra pela libertação do Estado Islâmico. A batalha, que deixou 40 mil mortos, é considerada o pior conflito armado em centros urbanos desde a Segunda Gurra Mundial.
O destino final de Francisco, que está com 84 anos, foi a Praça da Igreja, coração cristão da cidade antiga. O Papa foi recebido com grande alegria pelos moradores. "Foi o melhor dia dos últimos anos, estou sem palavras", diz o fotógrafo muçulmano Ali Al-Baroodi, de Mossul. "Foi uma reunião de família, com irquanos de diferentes origens e religiões que vieram à cidade para a visita do Papa. Essa é a essência do país, em que todos são bem-vindos".
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O pontífice foi recebido em um clima de alegria, com cantos e homenagens. Ao redor, na Praça da Igreja, buracos de bala, paredes destruídas por morteiros e escombros lembravam os horrores da guerra. Antes da invasão do Estado Islâmico, essa parte da cidade abrigava igrejas centenárias e ruas em que, por séculos, muçulmanos conviveram com cristãos e judeus.
Em um pequeno palco com uma cruz de madeira simples e uma poltrona branca, o pontifície fez uma prece pelo amor, o respeito e a aceitação do próximo. O Papa também rezou pelas vítimas do terrorismo e da guerra, assim como por seus algozes.
"A fraternidade é mais forte que o fratícidio, a esperança é mais forte que a morte, a paz é mais forte do que a guerra", disse o Papa em seu pronunciamento. "Senhor, confiamo-vos as pessoas cuja vida terrena foi abrevida pelas mãos violentas de seus irmãos e imploramos também, para quantos fizeram mal, que se arrependam, tocados pelo poder de sua misericórdia".
Em Mossul e pelo Iraque afora, várias pessoas choraram de emoção pela visita do Papa e sua palavras. Francisco foi um dos primeiros ocidentais a visitar Mossul, que foi declarada "capital" do Estado Islâmico em 2014 pelo grupo terrorista. Durante a cerimônia realizada na cidade, o Papa lembrou também a importância histórica e religiosa do local.
"Foi muito emocionante", diz a advogada iraquiana Zinah Mohammed. "Ver o Papa no meio das ruínas de Mossul me deixou arrepiada. Estamos sendo finalmente vistos pelo mundo, o que me deixa muito feliz e me faz sentir menos uma cidadã de segunda classe".
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Um dos primeiros impérios do mundo, o Assírio, nasceu ali, há quase 3 mil anos. No século 7º a.C, o rei Assurbanipal criou a primeira biblioteca da história, com centenas de livros escritos em tabuletas de argila. Perto da entrada da cidade, uma mesquita, construída sobre uma antiga igreja, homenageia o profeta Jonas, que, segundo a Bíblia, teria sido despejado pela baleia na região.
"A planície de Nínive, onde fica Mossul, tem uma rica história, assim como o restante do Iraque, que fica na antiga Mesopotâmia, berço da civilização", diz o historiador Omar Mohammed.
Ur, ao sul, é considerado o local de nascimento do profeta Abrãao, patriarca das religiões monoteístas -- o Papa promoveu uma cerimônia interreligosa no local neste sábado, dia 6. Ainda neste domingo, Francisco vai para Erbil, a menos de cem quilômetros de Mossul, no norte do Iraque onde deve rezar uma missa em um estádio. Nesta segunda, dia 8, ele embarca para Roma. Foi a primeira viagem de um pontífice ao Iraque.