Simpatizantes da oposição comemoram a vitória nas eleições legislativas em Caracas (LUIS ROBAYO/AFP)
Da Redação
Publicado em 8 de dezembro de 2015 às 21h16.
Caracas - A oposição venezuelana conquistou uma vitória histórica nas eleições parlamentares de domingo, acabando com 16 anos de hegemonia chavista com uma maioria de dois terços na Assembleia Nacional.
O último boletim do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) indica que de um total de 167 cadeiras da Assembleia, 109 correspondem à Mesa da Unidade Democrática (MUD), contudo, três são para indígenas de partidos regionais vinculados à coalizão opositora, e 55 para o derrotado Partido Socialista Unido (PSUV), atualmente no poder.
Com este número de deputados, o bloco opositor supera a marca de dois terços necessária para grandes atribuições, como criar ou suprimir comissões permanentes, aprovar e modificar leis orgânicas, submeter a referendo tratados internacionais e projetos de lei, remover magistrados do TSJ, designar os integrantes do CNE, aprovar projeto de reforma constitucional e até buscar retirar de maneira antecipada o presidente do poder.
Esta é uma situação inédita em um Parlamento que foi dominado pelo governo de esquerda desde 1999, quando Hugo Chávez, que faleceu em 2013, chegou ao poder.
O presidente Nicolás Maduro, cujo mandato termina em 2019, convocou na segunda-feira o chavismo "estabelecer fileiras em união cívico militar" ante o que chamou de "situação complexa" após a vitória da oposição. Também convocou um congresso do partido do governo para fazer "críticas autocríticas construtivas".
"É um caminho repleto de possibilidades de 'concertação', mas também de resistências. O risco de gerar mais ingovernabilidade é muito grande tanto para o governo como para a oposição. Há muito em jogo", disse a cientista política Elsa Cardozo, da Universidade Simón Bolívar (USB).
Maduro aceitou a derrota, que disse receber como uma "bofetada".
Com tom moderado, Jesús Torrealba, secretário executivo da MUD, anunciou o "início da mudança na Venezuela", mas reconheceu que a oposição tem uma "responsabilidade imensa" para "enfrentar a crise".
"Esperamos que seja possível abrir um canal para que a transição na Assembleia seja mais ou menos normal, ou será uma transição selvagem", disse à AFP Colette Capriles, analista da USB.
Luis Vicente León, presidente da empresa de pesquisas Datanálisis, concordou que "tal como estão as forças políticas no país, existem apenas dois cenários: negociação ou guerra".
"Oxalá negociação", destacou.
"A maioria qualificada não é para perseguir", disse o líder da ala moderada da oposição, o ex-candidato à presidência Henrique Capriles, que descartou uma 'caça às bruxas'.
Maduro, que assumiu o poder em abril de 2013, atribuiu o "revés conjuntural" a uma "guerra econômica" de empresários de direita, admitindo o descontentamento da população com o alto custo de vida e a escassez de produtos básicos, que provoca longas filas nos supermercados.
Reconciliação e agenda econômica
A oposição venezuelana disse nesta terça-feira que dedicará seu trabalho parlamentar para promover medidas de combate à grave crise econômica e reconciliar o país.
"Nossa prioridade é a reconciliação nacional e em segundo lugar atender a agenda econômica, a urgência econômica e social do país", disse Jesús Torrealba, secretário-geral da MUD.
"Estamos desejosos de que o governo entenda e assuma que isso não é um capricho da Unidade Democrática, é um mandato da maioria dos venezuelanos que votou por essa mudança", disse o porta-voz, acompanhado por vários dos deputados eleitos no último domingo.
"Não chegamos à Assembleia Nacional para uma vendetta política, essa não é nossa proposta política", afirmou Torrealba.
"Vamos trabalhar para construir soluções para os grandes problemas dos venezuelanos, sobretudo dos mais humildes. E se o governo impedir, terá que se ver com o povo", acrescentou.
Segundo cálculos privados, a Venezuela fechará 2015 com uma inflação próxima a 205%, um déficit fiscal de cerca de 20 pontos do PIB, uma escassez média de 60% dos itens básicos, uma retração de ao menos 6% na economia e milhões de dólares em dívidas comerciais com credores internacionais.
Durante 2015, o governo de Maduro não deu cifras de inflação, crescimento ou escassez.