Trump: a porta-voz da Casa Branca, afirmou que o presidente tem "um estilo de liderança diferente dos seus antecessores" (Joe Raedle/Getty Images)
EFE
Publicado em 12 de fevereiro de 2019 às 10h48.
Washington — O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, dedica mais da metade da sua agenda diária ao que a Casa Branca define como "tempo executivo": horas que o governante pode se dedicar a fazer ligações, ver televisão e escrever no Twitter, livre das amarras e da transparência de um calendário definido.
Um funcionário anônimo da Casa Branca vazou recentemente à imprensa todas as agendas diárias do presidente desde o começo de novembro até o último dia 1º de fevereiro, em uma aparente tentativa de pôr o presidente em evidência e corroborar sua afeição pelo "tempo executivo", um termo que suscita brincadeiras em Washington.
Esses documentos, publicados no site "Axios", indicam que Trump passa cerca de 60% do seu horário de trabalho em atividades indefinidas, com quase 300 horas "livres" e apenas 77 dedicadas a reuniões programadas nos últimos três meses.
A revelação foi um prato cheio para os mais críticos a Trump, que viram nela o mais parecido com uma confirmação de que o presidente passa os seus dias no Twitter e vendo sua emissora de televisão favorita, a "Fox News", sem trabalhar quase nada.
A porta-voz da Casa Branca, Sarah Sanders, tentou dissipar essa ideia ao assegurar que Trump tem "um estilo de liderança diferente dos seus antecessores", e que suas horas flexíveis estimulam sua "criatividade" e o tornam "mais produtivo".
Trump nunca gostou de se restringir a um horário fixo, como já reconheceu em 1987 no seu livro "A Arte da Negociação".
"Tento não programar muitas reuniões. Deixo a minha porta aberta. Não se pode ser imaginativo nem empreendedor se tudo está estruturado demais", escreveu então o magnata imobiliário.
Foi o segundo chefe de gabinete de Trump, o general John Kelly, quem inventou o conceito de "tempo executivo" para apaziguar o presidente, que detestava ter uma agenda regular, segundo o "Axios".
Embora seus tweets matutinos demonstrem que acorda cedo, Trump prolonga seu tempo na residência e não costuma chegar ao Salão Oval antes de 11h da manhã, bem mais tarde que seus antecessores.
São poucas as vezes que Trump recebe pessoalmente o relatório diário de inteligência - apenas 17 em três meses - e muitas vezes também não o lê quando o entregam por escrito, de acordo com a emissora "NBC News".
A Casa Branca insiste em dizer que o presidente dedica boa parte do seu "tempo executivo" a fazer ligações e ter reuniões privadas, e uma análise do jornal "The Washington Post" demonstra que Trump nem sempre escreve no Twitter durante seus momentos flexíveis.
Mas o fato de que esses contatos não estejam na agenda de Trump significa que os seus subordinados não estão necessariamente a par deles, o que dá rédea solta aos seus frequentes impulsos de ligar para seus aliados na "Fox News" para pedir-lhes conselhos, ou aos jornalistas do jornal "The New York Times" para criticar sua cobertura.
"O preocupante a respeito do presidente Trump é que permite que os caprichos do ciclo de notícias determinem sua agenda, e que sinta que suas opções estão determinadas por quem quer que tenha falado com ele nesse dia", considerou à Efe o professor de Política Matthew Beckmann, da Universidade da Califórnia em Irvine.
Beckmann está escrevendo um livro sobre a forma como os presidentes americanos manejam o seu tempo, e lhe parece difícil encontrar um precedente para a agenda semivazia de Trump.
"Todos os presidentes tentam ter flexibilidade na sua agenda diária, mas normalmente isso inclui uma hora aqui e outra lá, no contexto de um horário repleto", explicou Beckmann.
"O que parece único no caso de Trump é que sua agenda é basicamente o contrário: muitas atividades ad hoc e apenas umas poucas planejadas", acrescentou.
Beckmann não acredita, no entanto, que a pouca transparência da agenda de Trump signifique necessariamente que não esteja fazendo nada, e não descarta que, como diz Sanders, esse estilo de governo seja o mais adequado para ele.
"A presidência é tão complexa, e cada presidente tão diferente, que não há uma forma correta de fazer o trabalho", opinou.
No entanto, sua tendência a deixar-se levar pelas manchetes das emissoras de televisão, recompiladas a cada tarde para ele em um documento especial, "significa que suas posições podem variar drasticamente de um dia para outro, e isso faz com que seu pessoal não as leve muito a sério", advertiu.