Ian Bremmer: Netanyahu também será cobrado a prestar contas (Richard Jopson/ Divulgação/Site Exame)
Agência de notícias
Publicado em 15 de outubro de 2023 às 11h31.
Enquanto os terroristas do Hamas tinham como objetivo fazer Israel ser visto como um monstro, seu ataque ao país deverá cobrar um preço alto do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, na avaliação do diretor do grupo Eurasia, Ian Bremmer.
Para ele, assim como aconteceu com a então primeira-ministra Golda Meir, que viu sua carreira política acabada após a guerra de Yom Kippur, Netanyahu também será cobrado a prestar contas.
"No longo prazo, Netanyahu estará fora porque seu legado será esse ataque", disse Bremmer, em entrevista ao Estadão.
Como Israel deve lidar com a questão dos reféns?
Avalio que já existam negociações de terceiros com as lideranças do Hamas. É importante para a população israelense que os civis consigam ser resgatados. É bem possível que o Hamas liberte alguns mesmo que os israelenses não deem nada em troca, em um gesto de boa vontade para o mundo árabe. O Hamas quer criar uma imagem positiva com o Egito e com os países do Golfo, e quer estar em uma posição mais forte. Eles querem que os israelenses sejam vistos como monstros.
A situação pode voltar ao que era antes de 2005 com Israel governando Gaza?
É muito cedo. Neste momento, há violência relativamente limitada na Cisjordânia. Mas é claro que a intenção do Hamas é exatamente a oposta, o grupo quer radicalizar os palestinos na Cisjordânia e fazê-los derrubar a Autoridade Palestina, para depois serem governados por radicais que se recusam a reconhecer o direito de Israel à existência.
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Essa é a estratégia?
A estratégia do Hamas é fazer com que os israelenses se tornem monstros. Israel tem ignorado a situação palestina há algum tempo, com a expansão de assentamentos na Cisjordânia - e tornou a vida dos palestinos muito mais difícil, principalmente na Faixa de Gaza, onde 90% da população não tem acesso à água potável e 50% vive abaixo da linha da pobreza. Isso vai piorar muito nos próximos dias, semanas e meses. Israelenses que têm ignorado os palestinos não podem mais fazer isso agora. No curto prazo, será tudo sobre a guerra, mas no longo prazo haverá uma exigência muito significativa em Israel para encontrar uma forma de resolver a questão palestina. A única forma de fazer isso é os palestinos serem capazes de se governar, de se defender no seu território, e eles não podem ser governados pelo Hamas, que se recusa a reconhecer o direito de existência de Israel. Só existirá paz com ambos os lados exaustos e certamente estamos mais perto disso agora do que há seis meses.
É possível a abertura de uma frente no norte?
Claro, é possível. O maior perigo para Israel é o Hezbollah, não os iranianos. Teerã deixou claro que não quer participar diretamente desta guerra. O primeiro-ministro Binyamin Netanyahu não mencionou o Irã em seu discurso e os americanos também disseram aos israelenses para serem cautelosos sobre isso. Mas o Hezbollah é muito mais treinado e bem armado que o Hamas. Temos de observar com cuidado a questão do Hezbollah, porque esse é o único fator que pode realmente expandir a guerra.Netanyahu pode ter o mesmo destino de Golda Meir, que depois da guerra de Yom Kippur teve a sua carreira política acabada?Isso deve acontecer, como aconteceu com Golda Meir. No curto prazo, teremos um governo de unidade nacional e todos estarão focados apenas na guerra, mas, no longo prazo, Netanyahu estará fora porque seu legado será esse ataque. Israel, que historicamente é cercado de inimigos, um país que leva muito a sério a questão da segurança de suas fronteiras, não pode deixar isso acontecer. O país deveria estar preparado para esse tipo de ataque e não estava. Não é como nos EUA no 11 de Setembro, onde todos ficaram totalmente surpresos.
Qual o impacto para os acordos de paz que Israel quer fazer com países da região?
O acordo entre Arábia Saudita e Israel está fora de questão no futuro próximo. No longo prazo, pode acontecer. As relações diplomáticas costuradas nos Acordos de Abraão, com Marrocos, Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Sudão permanecerão intactas. Há muito investimento e turismo. Mas os países árabes vão se tornar muito mais anti-israelenses e haverá hostilidade contra judeus na região. A questão palestina vai se tornar relevante e irá restringir a capacidade dos países árabes de aumentarem o relacionamento com Israel. O país estava na melhor posição geopolítica em décadas. Porém, a questão palestina estava se tornando irrelevante para a região. Os palestinos não tinham nenhuma perspectiva de futuro, então o Hamas lançou esses ataques e isso certamente levará à destruição da organização.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.