Escolas no Japão: os japoneses aprendem em aula como lidar com questões da vida adulta, como finanças, e a debater política desde cedo (Thinkstock)
Da Redação
Publicado em 24 de setembro de 2016 às 16h44.
Não é só você: nós também estamos bem confusos com as mudanças propostas para o Ensino Médio público no Brasil.
Ontem (22), o Ministério da Educação deixou muita gente brava (e muita gente feliz) ao divulgar que, entre outras mudanças, artes, educação física, filosofia e sociologia seriam retiradas da grade obrigatória, como parte de uma medida provisória para melhorar a educação no país.
Não deu nem um dia e o MEC voltou atrás, dizendo que não era bem assim, que tudo não tinha passado de um erro de divulgação etc.
Verdade ou não, o fato é que o Brasil precisa de uma boa reforma na educação pública - e nisso todo mundo concorda, não importa se a camisa é vermelha ou verde e amarela.
Mas será que essa reforma precisa apagar matérias como artes, sociologia, filosofia e educação física? Será que os alunos precisam mesmo de mais horas de estudo? E será que professores menos qualificados são a solução?
Conheça quatro casos de sistemas nacionais de educação que deram muito certo de um jeito especial (e nada parecido com o que propõe o MEC):
O que tem de especial?
Nos dois países, os alunos de 11 a 18 anos são levados ao cinema, de graça, pela escola. Depois do filme, eles debatem a narrativa, fotografia, iluminação e outros elementos cinematográficos.
Pra que isso?
A França e a Argentina são dois polos de cinema muito fortes. Os objetivos são aumentar a bagagem cultural dos alunos, acender o interesse profissional na área e manter o público dos filmes nacionais, para garantir que a indústria continue firme e forte.
Na França, onde o projeto já existe desde 1989, a estratégia funcionou: hoje, 34% dos lançamentos cinematográficos no país são nacionais - aliás, o modelo francês incentivou a Argentina a adotar o projeto, no início desse ano.
Comparando com o Brasil...
Não existe programa como esse - o máximo é o professor passar um filme em sala de aula. E a matéria que mais se aproxima disso, artes, está entre as que o MEC disse (e depois "desdisse") que sairiam do currículo. Fora que a produção nacional ainda é muito pequena, se comparada à da França e à da Argentina.
O que tem de especial?
Interdisciplinaridade e integração das matérias básicas em um mesmo assunto, pequena carga horária escolar, mais recreio e menos dever de casa. Também há poucos alunos nas salas, ensinados por professores altamente qualificados de forma personalizada - mais focado nas dúvidas de cada aluno do que no desenvolvimento da sala como um todo. A escola também começa mais tarde na vida, aos 7 anos, e eles têm artes e música, além de matérias de humanidades, como filosofia e sociologia.
Pra que isso?
Os finlandeses não setorizam o ensino como nós: eles pegam um mesmo assunto e o analisam sob diferentes pontos de vista, envolvendo várias disciplinas. Por exemplo: eles podem estudar a história de alguma guerra e, ao mesmo tempo, calcular a balística das armas usando física, ensinar a topografia da região usando geografia e por aí vai. O resultado é um pensamento crítico e amplo, e não uma coisa fechada em caixinhas.
Por lá, as crianças também têm permissão para curtir a infância - daí o início da vida escolar ser "tardio". Aliás, por isso mesmo é que há menos dever de casa e mais tempo livre: para a criança ou o adolescente poder se desenvolver com mais calma. As aulas só começam depois das 9h para garantir que os alunos tenham uma boa noite de sono e estejam mais aptos a aprender. E o período também dura menos: a aula acaba entre 2h e 2h45.
A carreira de professor por lá também é uma das mais competitivas do país, principalmente os do Ensino Fundamental: nas escolas públicas, só 10% de todos os candidatos a vagas de professor são aceitos, por ano. Tudo isso gera uma confiança entre pais, alunos e a escola: ou seja, todo mundo sabe que a educação é boa, o que faz o sistema continuar funcionando. E dá certo: há 16 anos, a Finlândia é o país com a melhor educação da União Europeia.
Comparando com o Brasil?
Ao contrário da Finlândia, por aqui, a vida escolar começa bem mais cedo - aos 2 anos, a pessoinha já pode estar em ambiente escolar, onde, em geral, risadas e brincadeiras já são desencorajadas desde cedo. O tempo livre também não é muito valorizado: a nova proposta do MEC quer aumentar o tempo de permanência na escola, de 800 horas anuais para 1.400 horas anuais (o chamado ensino integral), na esperança de melhorar o desempenho dos alunos. Além disso, os professores por aqui não são exatamente os trabalhadores mais valorizados - a maioria ganha pouco e não tem muitos incentivos ou recursos para dar aulas - e agora, a coisa pode piorar: as mudanças do MEC acabam com a necessidade de concursos públicos - para lecionar, a pessoa só vai precisar "notório saber" sobre aquela matéria.
O que tem de especial?
Além das matérias básicas, o Japão tem cursos de economia doméstica, caligrafia, educação física e sociologia, e conta com aulas opcionais de artes, música e esportes. Desde 2016, os alunos também participam de discussões sobre política nacional e de simulações de eleições. Tradição mais antiga ainda é a de os próprios alunos e professores limparem a classe depois da aula - não há faxineiros nas escolas -, e a criançada também recebe aulas de defesa pessoal contra eventuais intrusos, chamadas sasumata.
Pra que isso?
O objetivo é deixar o aluno preparado tanto para os desafios do dia a dia quanto para entrar na universidade. Às vezes, os japas até exageram - existem cursinhos pré-vestibular que dão aula até de madrugada. Mas, seja como for, esse sistema deu frutos: foi pela educação de ponta que o Japão conseguiu se reerguer depois da Segunda Guerra Mundial. Hoje, o país tem um dos sistemas educacionais mais incríveis do mundo: é a quarta melhor do mundo, segundo a Organizacão para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Comparando com o Brasil?
Enquanto o governo japonês inseriu o debate político nas escolas, no Brasil, tramita o projeto de lei (PL) 7180, conhecido como "Escola sem Partido", que tem como objetivo banir o debate político do ambiente escolar - pelo menos, se o debate for contrário às convicções dos pais. E do outro lado do mundo, a importância das artes e dos esportes é bem maior que aqui.