Novos membros herdam uma China mais rica, mais confiante e mais poderosa do que seus antecessores encontraram há dez anos (Carlos Barria/Reuters)
Da Redação
Publicado em 16 de novembro de 2012 às 10h14.
Pequim - Por mais que os novos líderes da China queiram protelar as reformas no país e na sua forma de governo, eles devem enfrentar na próxima década crescentes pressões para promover mudanças.
Os futuros presidente e premiê, Xi Jinping e Li Keqiang, foram nomeados na quinta-feira para a cúpula do Partido Comunista, marcando a segunda transição pacífica dentro do regime desde sua instauração, em 1949.
A dupla herda uma China mais rica, mais confiante e mais poderosa do que seus antecessores, o presidente Hu Jintao e o premiê Wen Jiabao, encontraram há dez anos.
Mas eles também precisam confrontar imensos desafios sociais, econômicos e políticos, que, se não forem habilmente geridos, podem abalar o Partido Comunista.
Sem essa visão, disse David Shambaugh, diretor do programa de Política Chinesa da Universidade George Washington, nos EUA, "ficarei surpreso se eles tiverem um 19º congresso partidário". O PC chinês realiza seus congressos a cada cinco anos, e acaba de encerrar o 18o.
A opinião de Shambaugh pode soar exagerada, mas muitos especialistas em China concordam que a nova liderança precisará realizar reformas ousadas se quiser manter o controle sobre um país em rápida transformação.
Tratados como crianças
Graças ao sucesso do regime em promover um rápido crescimento econômico e tirar centenas de milhões de chineses da miséria, Xi, Li e outros membros da cúpula terão de lidar com uma população mais exigente e mais disposta a se insurgir contra qualquer coisa.
E os chineses comuns têm muitos motivos para queixas. Mais de 40 por cento dos rios nacionais estão gravemente poluídos, segundo diversas estimativas; a China é um dos piores países do mundo nos rankings de corrupção; e cerca de 150 milhões de trabalhadores migrantes estão privados de benefícios sociais nas cidades onde trabalham.
Essas estatísticas ilustram um dos desafios da ascensão chinesa. Apesar da melhora nas condições de vida nas últimas décadas, muitos chineses estão insatisfeitos com os efeitos colaterais do crescimento e com o paternalismo do regime.
"Os chineses são realmente tratados como crianças. Você pode ouvi-los um pouquinho, mas no fim das contas é o papai quem sabe melhor o que é do interesse de vocês, e não acho que isso possa durar por muito tempo", disse Tony Saich, professor da Escola de Governo Kennedy, em Harvard.
A China está mais próspera do que há dez anos, quando Hu e Wen assumiram, mas a disparidade entre ricos e pobres se elevou drasticamente, enfurecendo muitos cidadãos comuns.
A ONU estima que 13 por cento dos 1,3 bilhão de chineses ainda sobreviva com menos de 1,25 dólar por dia. Mas o país também tem 2,7 milhões de milionários (pessoas com patrimônio acima de 1 milhão de dólares), e 251 bilionários, segundo uma lista elaborada pela editora Hurun Report, de Xangai, voltada para o mercado do luxo.
Os chineses comuns estão especialmente irritados com a riqueza acumulada por muitos membros do partido.
A questão nunca foi tão delicada quanto atualmente, por causa do escândalo que envolve Bo Xilai, ex-dirigente comunista na cidade de Chongqing, que foi acusado de corrupção e abuso de poder. Reportagens da imprensa internacional sobre a fortuna das famílias de Wen e Xi também geraram indignação na Internet.
Em discurso depois de ser apresentado como novo secretário-geral do partido, Xi disse que o PC precisa combater a corrupção. Em seu último relatório de trabalho como secretário-geral, na semana passada, Hu disse que essa é uma questão de "vida ou morte" para o partido.
Crescer não basta
Há inquietação tanto nas áreas urbanas quanto nas rurais. O número de protestos continua crescendo, e os avanços tecnológicos das últimas décadas permitem que os chineses registrem manifestações e discutam --enviando mensagens instantâneas, escrevendo blogs ou tirando fotos-- questões como a corrupção e a degradação ambiental. Essa é uma tendência que contraria os esforços do regime para controlar o fluxo de informações dentro das fronteiras nacionais.
O fio que liga o que é bom ao que é ruim --a prosperidade com a desigualdade; a expansão da classe média com a corrupção-- é o incessante crescimento econômico chinês. Mas mesmo ele, segundo muitos economistas, está em dúvida.
A necessidade de re-estruturar a forma como a China obtém seu crescimento --enfatizando o consumo em detrimento dos investimentos públicos e das exportações-- implicaria importantes mudanças políticas, como reduzir o papel das empresas estatais em diversos setores.
"A esta altura, se (a nova liderança) não se mexer rapidamente, as consequências serão claras e imediatas", disse o economista Daniel Rosen, diretor da consultoria Rhodium Group, de Nova York.
"O crescimento do PIB irá se deteriorar dentro de seis a nove meses, e isso terá consequências. Não acho que eles terão nem um ano de lua de mel." O partido conquistou sua legitimidade junto a uma grande fatia da população graças ao rápido crescimento econômico. No entanto, esse crescimento cai há sete trimestres consecutivos, registrando uma taxa anualizada de 7,4 por cento no terceiro período do ano. Caso a taxa continue a se contrair, o descontentamento tende a crescer.
Embora a economia pareça estar ganhando fôlego para o curto prazo, analistas ainda esperam que o índice de expansão do PIB chegue ao final da década mais próximo de 5 do que de 10 por cento.
Dentro e fora da China, há quem tema que o governo possa então, para desviar as atenções, recorrer ao nacionalismo e ao populismo, fenômeno que já foi visto em mensagens do Weibo (espécie de Twitter chinês) sobre disputas territoriais nos mares do Leste e Sul da China.