Atenas - O novo primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, apresentou nesta terça-feira a composição de seu governo, cuja prioridade será renegociar a dívida externa do país e terminar com a política de austeridade que empobreceu a população.
O professor de economia de 53 anos é considerado um dos "radicais" do partido antiliberal Syriza, ao qual pertence há pouco tempo, e chamou a atenção por seus ataques contra as políticas de austeridade impostas por Bruxelas, considerada a responsável por "uma crise humanitária" em seu país.
Tsipras também nomeou como vice-primeiro-ministro um economista mais moderado, Ioannis Dragasakis, de 68 anos, defensor da reestruturação da dívida e de uma reforma do Estado.
Dragassakis, um quadro veterano do partido, coordenará as pastas de Economia, Turismo, Marinha Mercante e Infraestrutura.
O novo governo só conta com uma dezena de ministérios, incluídos quatro super ministérios (Economia, Interior, Cultura e Saúde).
O partido nacionalista de direita Gregos Independentes (ANEL), que fechou um acordo de governo com o Syriza, obteve o ministério de Defesa para seu presidente Panos Kammenos.
Nikos Kotzias, um universitário e antigo conselheiro do ex-primeiro-ministro socialista Yorgos Papandreu, é o novo ministro das Relações Exteriores.
Primeiras reuniões
A bolsa de Atenas caiu 6,4% após o anúncio do novo governo, e o título grego a 10 anos subiu a níveis próximos a 10%, longe dos 8,7% da semana passada.
Nos próximos dias as personalidades europeias começam a chegar a Atenas. Na quinta-feira, é o dia do presidente Parlamento Europeu, Martin Schulz, que se reunirá com o novo primeiro-ministro grego.
O presidente do Eurogrupo, o ministro holandês da Economia Jeroen Dijsselbloem, que na segunda-feira conversou por telefone com Yannis Varoufakis, se reunirá na sexta-feira em Atenas com Tsipras e com o novo ministro grego da área, disse à AFP um porta-voz do Eurogrupo.
Dijsselbloem lembrou na segunda-feira que "os problemas da Grécia continuam" e que "esperava conhecer a posição do novo governo".
A União Europeia exigiu que antes do fim de fevereiro a Grécia adote novas medidas de ajuste para obter a entrega da parcela de 7 bilhões de euros de ajuda.
Tsipras disse, após sua histórica vitória nas eleições de domingo, que a austeridade é coisa do passado, mas que está disposto a negociar.
Reestruturar a dívida para crescer
"Se houver boa vontade dos dois lados, se chegará a uma decisão", disse Yannis Dragassakis à AFP, antes das eleições.
"A reestruturação da dívida é um dos fatores que podem contribuir com a reativação. O outro (fator) é a necessidade de reformas", lembrou.
O Syriza deseja organizar uma conferência europeia que aborde as dívidas dos países, como a que foi celebrada em Londres em 1953, levando a uma redução substancial da dívida de uma Alemanha arruinada na Segunda Guerra Mundial.
A questão da reestruturação divide os europeus, embora a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, tenha dito que não é contra a ideia de uma conferência para discutir o tema.
No contexto interno, o governo grego destinará 1,2 bilhão de euros à luta contra a "exclusão social" sofrida por centenas de milhares de gregos depois de seis anos de crise econômica e política de austeridade.
O novo governo prometeu, também, aumentar o salário mínimo de 580 para 751 euros, cortar alguns impostos e implementar um plano contra o clientelismo e a corrupção.
Essas medidas, contudo, geram calafrios em alguns países produzem calafrios em alguns países da Europa, particularmente na Alemanha, guardiã do rigor orçamentário.
A chanceler alemã, Angela Merkel, demorou 48 horas para enviar uma mensagem de felicitação a Tsipras, uma demora inusitada. Finalmente, lhe desejou nesta terça-feira "muita força e sucesso".
Tsipras, cujo partido obteve 149 assentos dos 300 no parlamento grego. Foram apenas dois a menos do que o necessário para atingir a maioria absoluta de 151, e por isso optou por uma aliança com o ANEL, com 13 deputados.
O Syriza e o ANEL têm muitas diferenças, mas nos últimos três anos convergiram na oposição à política de austeridade e de submissão do governo à troika de credores formada por Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI.
-
1. Renegociação à vista?
zoom_out_map
1/7 (Yannis Behrakis/Reuters)
São Paulo – Após as eleições parlamentares no final de semana, a
Grécia está
hesitante quanto a manutenção das medidas de austeridade. A maioria do eleitorado rejeitou o compromisso firmado pelo país com a
União Europeia e o FMI, gerando
medo nos mercado globais. Mesmo os partidos que, na semana passada, garantiram que aplicariam o plano da UE e do FMI tem considerado a possibilidade de renegociar os acordos para fazer a economia respirar. No ultimo final de semana, aproximadamente 70% dos eleitores gregos votaram em partidos anti-austeridade para o parlamento. O resultado deixa claro o que a população pensa sobre o uso da austeridade para combater a crise na região. E eles não estão sozinhos. Entre os economistas, a austeridade está longe de ser unânime. Clique nas fotos para ver o que alguns economistas pensam sobre a austeridade na Grécia.
-
2. Luiz Gonzaga Belluzzo: “Alguém precisa gastar”
zoom_out_map
2/7 (Agência Brasil)
“É como encher um saco furado”, disse Luiz Gonzaga Belluzzo, economista e professor, sobre as medidas de austeridade na Grécia. Para Belluzzo, é necessário reestruturar a dívida e abrir espaço fiscal para os governos gastarem a fim de começar a recuperação econômica, o crescimento da receita e a diminuição do déficit. “Alguém precisa gastar. A economia não funciona com todo mundo cortando gastos”, afirmou. Se o Estado tenta economizar em uma situação em que a demanda já está deprimida, a receita do Estado cai ainda mais e a dívida aumenta, de acordo com Belluzzo. “Tem que reativar a economia para as pessoas terem dinheiro para gastar e as empresas também. Ao mesmo tempo, tem que reduzir a dívida”, afirmou. Para o economista, é necessário penalizar “quem pode ser penalizado”, ou seja, quem detém papéis da dívida grega, e não a população. “A Angela Merkel quer que os outros façam austeridade para pagar os bancos alemães. Como os bancos alemães são credores dos bancos estrangeiros, eles exigem austeridade”, disse. Mas é uma austeridade ineficaz, segundo o economista. Para Belluzzo, a crise grega é uma sucessão de piores momentos. “Não vejo como a Grécia vai sair dessa situação. Ou sai do euro ou faz uma reestruturação profunda da divida”, disse.
-
3. Maílson da Nóbrega: Austeridade tem lógica, mas não mostra resultado esperado
zoom_out_map
3/7 (RICARDO BENICHIO/VEJA)
A austeridade tem sua lógica, segundo o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega. Mas é necessário pensar se ela deve ser preservada da forma como está sendo feita, já que há uma “evidência inequívoca” de que ela não está produzindo o resultado que se esperava. O ideal seria atrelar a austeridade no longo prazo a gastos no curto, o que é fácil de falar e difícil de fazer, segundo o consultor. “O ideal é gastar mais agora, sinalizando que lá na frente a dívida cai como proporção do PIB e o déficit público também. Como fazer isso, tem que ter muita arte. Eu, sinceramente, não sei como faz”, disse. Segundo o ex-ministro, também é necessário convencer os financiadores do governo de que eles serão pagos no futuro. A eleição de François Hollande para presidente da França, no último domingo, mostra que os eleitores francesas optaram por um candidato que prometia lutar contra a austeridade – e que terá de convencer seus pares na Europa disso, segundo Maílson. “Os europeus estão preferindo privilegiar o corte de gastos no curto prazo, mas eu acho que isso está se esgotando politicamente”, disse.
-
4. Alexandre Schwartsman: “Esquece a Grécia, é um caso perdido”
zoom_out_map
4/7 (Germano Lüders/EXAME.com)
“Esquece a Grécia”, afirmou Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central. “É um caso perdido. Se há algum dinheiro, deve ser usado para ajudar quem tem condição de se salvar”, disse. Para Schwartsman, as medidas para a Grécia serem muito ou pouco austeras não é o centro do problema. A expansão fiscal é “absolutamente impensável” para a Grécia, segundo Schwartsman. “Por isso eles estão numa sinuca de bico, um país que não tem estímulo fiscal, não pode fazer, tem uma taxa de juros alta, e não tem câmbio que desvalorize. Não tem o que segure. Por isso precisa dar estímulo de demanda vindo de fora”, disse. Para o economista, os países da zona do euro que podem fazer expansão fiscal deveriam faze-la para mitigar os efeitos da recessão nos países periféricos. Uma expansão fiscal na Alemanha, por exemplo, geraria demanda para o resto da zona do euro, estimulando países como a Espanha. “Não dá pra ficar só na austeridade fiscal, quem pode fazer expansão fiscal deve fazer hoje pra melhorar sua situação daqui a uns anos. Mas isso é para um conjunto limitado de países, como Alemanha, Holanda e Finlândia. França já tenho minhas dúvidas”, afirmou.
-
5. Luiz Carlos Mendonça de Barros: Ajuste é condição necessária, mas não é suficiente
zoom_out_map
5/7 (EXAME.com)
A atual situação fiscal – ruim – da Europa demanda redução de déficits e estabilização da dívida dos países em relação ao PIB, segundo Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES. “Mas quem conhece um pouco de situações similares, sabe que esse ajuste é condição necessária, mas não é suficiente”, afirmou. A ideia que prevaleceu desde o começo da crise – de que se não houvesse uma prioridade ao ajuste fiscal, países como Grécia e Itália e outros que tem déficits muito grandes não tomariam as medidas necessária – vem mostrando uma nova face, segundo Mendonça de Barros. “Agora está se vendo outro lado da moeda: que a austeridade sozinha leva a recessão, que acaba fazendo com que o ajuste fiscal seja muito mais difícil porque o PIB cai na mesma proporção que caem os gastos do governo”, explicou. O discurso europeu está mudando, segundo o economista, e caminha para a defesa de reformas, com um certo alívio para os países que estão com mais problemas.
-
6. Paul Krugman: É tempo de seguir em frente
zoom_out_map
6/7 (Jeff Zelevansky/Getty Images)
Para Paul Krugman, as eleições parlamentar na Grécia e presidencial na França no último final de semana funcionaram como referendo da estratégia econômica da Europa – e os dois países indicaram oposição à austeridade. “Cortes de gastos em uma economia deprimida apenas deixam a depressão mais profunda”, escreveu Krugman em
artigo no The New York Times. Krugman, sobre a situação europeia. Os últimos dois anos mostraram que cortar os gastos do governo não incentivou consumidores e empresas a gastarem mais, segundo o economista. A eleição de Hollande quebra a aliança “Merkozy” (entre Sarkozy e Angela Merkel, da Alemanha) que guiava o regime de austeridade. “Isso seria perigoso se a estratégia estivesse funcionando, ou tivesse uma chance razoável de funcionar. Mas não está. É tempo de seguir em frente”, disse Krugman.
-
7. George Soros: Austeridade deve vir com programas de estímulo
zoom_out_map
7/7 (Getty Images/Alex Wong)
O empresário e megainvestidor George Soros defende que as reformas estruturais e a austeridade sejam acompanhadas por programas de estímulo, como forma de evitar que a Europa caia em uma “armadilha deflacionária da dívida”. “O empurrão de Berlim para a austeridade e regras mais duras para o déficit no orçamento no pacto fiscal da região está empurrando a Europa para uma armadilha deflacionária da dívida”, afirmou o empresário ao
Wall Street Journal. Soros
criticou a atuação da Alemanha durante a crise. Para ele, as medidas de restrição de crédito tomadas pelo Bundesbank, o Banco Federal Alemão, podem contagiar outros países, além de frear a demanda de consumo necessária para que os países devedores possam ganhar fôlego e cumprir suas metas junto aos credores. Para Soros, os problemas fundamentais não foram resolvidos e que o gap entre países credores e devedores vai continuar a crescer.