Jochen Köchler, presidente da Deustche Messe, maior operadora de feiras da Alemanha Hannover Messe Preview 2025 (Rainer Jensen/Divulgação)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 20 de fevereiro de 2025 às 06h04.
Hannover, Alemanha* - A economia alemã, em recessão há dois anos, enfrenta problemas de várias frentes. Do Oriente, a China tem barateado produtos de forma artificial. Do outro lado do Atlântico, os Estados Unidos ameaçam tarifas e fechar sua economia. E, no nível local, falta uma ação mais firme do governo, avalia Jochen Köchler, presidente da Deustche Messe, maior operadora de feiras de negócios da Alemanha, que faz mais de 100 eventos por ano.
"Nos livramos do carvão, nos livramos do gás, e aí há uma guerra na Ucrânia. A energia ficou muito cara e não temos muitas opções para armazenar energia renovável", disse à EXAME. "Se não estiver ventando e não estiver ensolarado, você, como país industrial, tem um problema."
Köcler é presidente da Deutsche Messe, a maior empresa organizadora de feiras de negócios da Alemanha, desde 2017. Antes, trabalhou na direção da DLG (Sociedade Agrícola Alemã, uma entidade setorial) e se formou em engenharia agrícola. A Deutsche Messe organiza eventos na Alemanha e em países como Arábia Saudita e China. No ano fiscal de 2023, a empresa faturou 354 milhões de euros e lucrou 46 milhões de euros.
O empresário espera que o novo governo da Alemanha, a ser eleito no domingo, 23, tome medidas mais firmes para gerar um "impacto profundo" na indústria do país e seja mais firme para defender os interesses nacionais.
Ele conversou com a EXAME em Hannover, durante um evento de apresentação da feira Hannover Messe, um dos maiores eventos industriais do mundo, que será realizada a partir de 31 de março e reunirá mais de 4.000 empresas. Em 2026, o Brasil será o país parceiro da feira. Leia abaixo a íntegra da conversa.
Como vê o momento da economia alemã hoje?
Os alemães estão enfrentando uma situação em que o governo da China decidiu subsidiar [produtos], porque o país não tem mais taxas de crescimento de 15% como há duas décadas, chega a apenas 3%. Os chineses estão realmente preocupados com a situação do mercado imobiliário e o desemprego entre os jovens. E, sim, a qualidade [dos produtos] está melhorando a cada ano. Isso é algo que, nos últimos dois ou três anos, realmente surpreendeu muitos exportadores alemães e europeus para a China. Os exportadores europeus estão um pouco chocados que este “fantástico mercado”, após 20 anos, desapareceu. Ao olhar para o nosso vizinho do outro lado do Atlântico [Estados Unidos], ele está organizando tarifas de 25% sobre todos os produtos alemães.
Como reagir a isso?
Agora temos algumas semanas para entender [as tarifas]. E então precisamos de uma reação. Os políticos da Europa, esperamos, estão unidos e encontrarão uma reação para essas tarifas e acordos comerciais. Precisamos de impulsos para nossa economia aqui na Alemanha e na Europa, para sermos mais fortes. Talvez por 25 anos, a Alemanha tenha tido energia barata da Rússia, um mercado fantástico na China, e a defesa feita pelos Estados Unidos. Esses dias acabaram, então precisamos trabalhar.
Haverá eleições na Alemanha no domingo, 23. O que o novo governo poderá fazer para tentar tornar a Alemanha mais forte e lidar com todos esses desafios?
O novo governo, antes de mais nada, tem que cuidar dos interesses alemães de uma maneira adequada. Antes, o governo era formado por uma coalizão [que caiu no fim do ano] que gostaria de conduzir nossa economia de uma maneira mais sustentável. Então, nos livramos do carvão, nos livramos do gás, e aí há uma situação de que há uma guerra na Ucrânia. A energia ficou muito cara e não temos muitas opções para armazenar energia renovável. Se não estiver ventando e não estiver ensolarado, você, como país industrial, tem um problema. Na nossa política externa, talvez não tenhamos usado a diplomacia para os negócios, mas para outras coisas.
Que ações espera em relação à indústria?
Esperamos que o novo governo promova um grande impacto na indústria para torná-la mais competitiva. É fácil: se você fizer mais investimentos, paga menos impostos. É uma forma de impulsionar a inovação. Temos muitas oportunidades para a IA aqui. Então, é preciso tornar as empresas mais eficazes e motivar nossos talentos a aprender o suficiente e a trabalhar duro. Temos que motivar as pessoas a não falar tanto sobre equilíbrio entre vida profissional e pessoal. Eu adoro não trabalhar, mas temos que ter algumas atitudes. Ainda somos um país fantástico. A Alemanha é a terceira maior economia do mundo, mas temos que fazer o nosso dever de casa para manter essa posição.
O que você acha da proposta de tentar mudar a regra do teto de endividamento que a Alemanha tem hoje?
Do meu ponto de vista, o limite está correto. Você não pode pegar muito crédito, não pode gastar mais do que tem. Mas, neste momento, temos uma situação especial com a China, que está nos inundando com produtos subsidiados, e com os Estados Unidos, que estão impondo tarifas e dizendo "America first". Talvez fosse uma ideia fazer um programa de investimentos especial, mas isso deveria ser uma decisão realmente séria. Há ainda o aspecto da Defesa, algo realmente novo na Alemanha.
Por que a questão da Defesa é realmente nova?
Eu tinha 20 anos durante a unificação alemã, servi no Exército. Comecei em maio, quando havia dois Estados alemães, e quando terminei, se tornaram um só, sem um único tiro, sem sangue. Eu realmente nunca imaginei que veríamos uma guerra na Europa. E vamos realizar aqui em Hanover, pela primeira vez, uma grande feira sobre defesa militar, a DSEI Alemanha, em janeiro de 2027.
Como vê as relações comerciais entre Brasil e Alemanha? O acordo UE-Mercosul ajudará em que medida a ampliar os negócios?
Em uma perspectiva global, fizemos negócios demais com a China em exportação e importamos muita energia da Rússia. É mais fácil falar depois, mas é algo que deveríamos ter evitado. E o Brasil é a maior economia da América do Sul, temos relações de longa data. Primeiramente, devemos tentar aumentar as exportações e importações. Mas há muitas tarifas no Brasil sobre a importação de produtos. O segundo aspecto é que, se realmente vamos usar mais hidrogênio para nossa produção de aço e em outras fábricas, o Brasil é um bom parceiro para esta e outras novas energias.
O Brasil será parceiro da Hannover Messe em 2026. Como está o andamento dessa parceria?
Estamos muito felizes que o Brasil será o país parceiro da Hannover Messe em 2026. Esse é o momento perfeito, não apenas para olhar para inovações na indústria, mas também para negócios, trazendo empresários e delegações. Eu vou viajar em três semanas para o Brasil com nosso governador aqui da Baixa Saxônia, que era membro do conselho da Volkswagen. Vocês têm um país fantástico, são uma sociedade jovem. Vocês têm muitas possibilidades. Olhem para a Alemanha.
* O jornalista viajou a convite da Hannover Messe.