Mundo

Netanyahu pede destituição de diretor da agência de segurança interna de Israel

Medida repentina gerou chamados para protestos em massa no país e foi alvo de críticas de líderes empresariais e da procuradoria-geral

Benjamin Netanyahu: premier enfatizou o que chamou de necessidade de “restabelecer a organização, alcançar todos os objetivos de guerra e impedir o próximo desastre (Ohad Zwigenberg/AFP)

Benjamin Netanyahu: premier enfatizou o que chamou de necessidade de “restabelecer a organização, alcançar todos os objetivos de guerra e impedir o próximo desastre (Ohad Zwigenberg/AFP)

Agência o Globo
Agência o Globo

Agência de notícias

Publicado em 17 de março de 2025 às 18h11.

Última atualização em 17 de março de 2025 às 19h05.

Tudo sobreIsrael
Saiba mais

Menos de duas semanas após o serviço de segurança interna de Israel assumir parte da responsabilidade por não ter dado atenção aos sinais de alerta sobre os planos do Hamas para o atentado contra o Estado judeu em outubro de 2023, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, informou ao chefe da organização que pedirá ao governo sua destituição.

Em declaração no domingo, o premier enfatizou o que chamou de necessidade de “restabelecer a organização, alcançar todos os objetivos de guerra e impedir o próximo desastre”.

"Devido à contínua falta de confiança, decidi apresentar uma proposta ao governo para encerrar o mandato do chefe do Shin Bet, [Ronen Bar]", disse Netanyahu, dias após ter acusado Bar de estar por trás de uma “campanha de ameaças e vazamentos na mídia” para impedir que ele “tome as decisões necessárias para redirecionar” o órgão. "Sempre, mas sobretudo durante uma guerra como esta, existencial, deve haver total confiança entre o primeiro-ministro e o chefe do Shin Bet".

Ainda no domingo, Bar afirmou, em comunicado, que sua destituição não tinha relação com o ataque do Hamas. O atual chefe do serviço de segurança interna destacou ter assumido a “responsabilidade pela parte da agência [em não impedir o ataque]”, reforçando que “está claro que o motivo” de sua demissão não tem a ver com o atentado terrorista.

A tensão entre ambos já era grande antes do ataque do grupo palestino, especialmente por um projeto de reforma da justiça que havia provocado manifestações massivas de protesto no país alguns meses antes. No entanto, a relação piorou significativamente desde que, em 4 de março, foi publicado o relatório de investigação interna que apontava falhas na transmissão de informações de inteligência que poderiam ter alertado as autoridades sobre a magnitude da invasão do Hamas a Israel.

O documento também critica o Executivo e, indiretamente, Netanyahu, ao considerar que “uma política [israelense] de calma permitiu que o Hamas acumulasse um impressionante arsenal militar”. As conclusões do Shin Bet foram publicadas dias após uma investigação semelhante das Forças Armadas de Israel ter revelado que oficiais de alta patente subestimaram o Hamas no passado — e interpretaram de forma equivocada os alertas iniciais de que um grande ataque estava por vir.

Interesses de Netanyahu

A tentativa repentina de Netanyahu é o mais recente passo de uma campanha de dois anos do governo israelense para exercer maior controle sobre diferentes setores do Estado. A medida gerou chamados para protestos em massa nesta segunda-feira e foi alvo de críticas de líderes empresariais e da Procuradoria-Geral, evocando memórias da turbulência social de 2023, desencadeada pela tentativa anterior de reduzir o poder dos órgãos de fiscalização do país.

O plano de Netanyahu de realizar uma votação no Gabinete sobre o futuro de Bar foi anunciado menos de um mês após seu governo declarar uma intenção semelhante de demitir Gali Baharav-Miara, a procuradora-geral de Israel. A medida também ocorre em meio a um esforço renovado no Parlamento pela coalizão de direita de Netanyahu para dar aos políticos maior controle sobre a seleção de juízes da Suprema Corte.

Essas ações marcam um retorno às tentativas fracassadas de Netanyahu em 2023 de reduzir o poder de instituições que atuaram como contrapeso ao seu governo, incluindo a Suprema Corte e a procuradoria-geral. Esse programa — frequentemente descrito como uma reforma judicial — foi altamente divisivo, desencadeando meses de protestos em massa e aprofundando as divisões na sociedade israelense.

A campanha foi suspensa apenas após o ataque liderado pelo Hamas contra Israel em 7 de outubro de 2023, que reavivou um senso de unidade nacional. Agora, com um cessar-fogo instável em Gaza, a redução das tensões parece ter chegado ao fim.

"A remoção do chefe do Shin Bet não deve ser vista isoladamente", disse Amichai Cohen, professor de direito e pesquisador do grupo de pesquisa Instituto da Democracia de Israel, ao New York Times. "Faz parte de uma tendência geral de enfraquecer essas agências independentes e aumentar o poder do Executivo. A reforma judicial está de volta".

Resposta da oposição

A tentativa de demitir Bar levou líderes da oposição e ativistas a convocarem, nesta segunda-feira, protestos em frente à sede do governo em Jerusalém para quarta-feira, quando o Gabinete deve votar o futuro do chefe do Shin Bet. Uma coalizão de 300 grandes empresários também emitiu uma rara declaração criticando a decisão.

A procuradora-geral Baharav-Miara afirmou que Netanyahu não poderia iniciar o processo de demissão de Bar antes que se determinasse se isso seria legal. Ela disse que há preocupações de que a ação configuraria um conflito de interesse para Netanyahu — levantando a possibilidade de uma crise constitucional caso o primeiro-ministro ignorasse seu aviso.

O contexto da tentativa de demissão de Bar também inclui uma disputa pessoal entre o chefe de segurança e Netanyahu. Durante meses, Bar irritou o premier ao investigar funcionários do Gabinete dele por supostamente divulgar documentos sigilosos e por possíveis vínculos com pessoas associadas ao Catar, próximo ao Hamas. Netanyahu negou qualquer irregularidade, e o Catar não comentou.

O que pode ter sido a gota d’água para Netanyahu foi uma rara intervenção pública na semana passada do ex-chefe do Shin Bet, Nadav Argaman. Em entrevista à televisão, Argaman disse que poderia revelar novas acusações contra o primeiro-ministro caso acreditasse que Netanyahu estava prestes a violar a lei. Para Nadav Shtrauchler, ex-assessor do premier, comentários desse tipo foram “demais” para Netanyahu, que os interpretou como “uma ameaça direta”.

Futuro de Israel

Mas o contexto mais amplo, dizem analistas, é uma disputa muito maior sobre a natureza e o futuro do Estado de Israel. A coalizão governista de Netanyahu é composta por partidos que representam, de um lado, judeus ultrarreligiosos que buscam preservar seus privilégios e, de outro, ativistas do movimento de colonos que querem aprofundar o controle israelense sobre a Cisjordânia e restringir mais os direitos palestinos.

Por anos, esses grupos manifestaram ressentimento contra a independência de órgãos como o Judiciário, a procuradoria-geral e os serviços de segurança, que, em diferentes ocasiões, buscaram limitar alguns privilégios dos ultraortodoxos, impedir certas ações do movimento dos colonos e processar Netanyahu por corrupção. O primeiro-ministro está sendo julgado por acusações que ele nega.

O governo e seus aliados argumentam que restringir o Judiciário e outros órgãos de fiscalização como o Shin Bet fortalece a democracia, pois permite que os legisladores tenham mais liberdade para implementar as políticas para as quais foram eleitos. Eles também dizem que Bar deveria renunciar por não ter conseguido impedir o ataque de 7 de outubro de 2023, liderado pelo Hamas, que deu início à guerra em Gaza.

A oposição, por outro lado, afirma que essas ações prejudicariam a democracia ao eliminar um contrapeso essencial ao abuso de poder do governo, permitindo que a coalizão de Netanyahu, a mais conservadora e nacionalista da história de Israel, transforme o país em uma sociedade menos pluralista e mais autoritária. Para os opositores, Netanyahu também deveria assumir a responsabilidade pelo ataque de 7 de outubro.

Acompanhe tudo sobre:Donald TrumpBenjamin NetanyahuIsrael

Mais de Mundo

Macron pede que Rússia aceite paz e que Europa concorde com plano de garantias

Exército dos EUA vai encerrar tratamentos para transição de gênero

Consumidores estocam tequila temendo tarifas de Trump

EUA nega devolução da Estátua da Liberdade: 'Graças a nós, a França não fala alemão'