Trump: o presidente atacou repetidamente o acordo do Irã e advertiu que poderia se recusar a assinar as isenções (Joshua Roberts/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 10 de março de 2018 às 12h47.
Bruxelas - O encontro entre os presidentes dos EUA, Donald Trump, e da Coreia do Norte, Kim Jong Un, planejado para até o fim de maio, tornará mais provável que a administração norte-americana acabe com o acordo nuclear iraniano, disseram algumas autoridades e ex-autoridades ocidentais.
A reunião poderia ocorrer dentro do prazo de 12 de maio definido para que Trump decida se prorroga as isenções de sanções dos EUA ao Irã. O presidente atacou repetidamente o acordo do Irã e advertiu que poderia se recusar a assinar as isenções, um passo que provavelmente violaria os termos do acordo e poderia levar o Irã a retomar a atividade nuclear.
Pessoas envolvidas nas negociações com o Irã têm dito há muito tempo que o destino desse acordo poderia pesar fortemente na diplomacia com Pyongyang. Elas argumentaram que abandonar o acordo iraniano de 2015 levará Kim a concluir que não pode confiar nas garantias que ele quase certamente buscará dos EUA em troca da redução de seu programa nuclear.
Agora, algumas das mesmas vozes dizem temer que o contrário aconteça: a janela diplomática se abrindo de repente com a Coreia do Norte poderia levar Trump a acreditar que matar o acordo do Irã pode fortalecê-lo frente a Kim.
Wendy Sherman, principal negociadora dos EUA no acordo do Irã, que também liderou por anos de diplomacia com a Coreia do Norte no governo Bill Clinton, afirmou que "a lógica é que, se os Estados Unidos deixarem" o acordo do Irã, isso prejudicaria a credibilidade de Washington. "No entanto, o presidente pode, por causa da maneira como atua, acreditar que de alguma forma, derrubando (o acordo) mostrará que ele não vai negociar o que chama de 'mau negócio'. Isso seria um desastre porque ele teria duas crises nucleares em suas mãos ao mesmo tempo ", disse.
Outro alto diplomata ocidental avaliou que as negociações com Kim provavelmente são má notícia para o acordo do Irã, que resultou na suspensão da maioria das sanções internacionais ao país em troca de restrições temporárias, mas rigorosas, sobre grande parte da atividade nuclear iraniana. "Existe o risco de ele dizer que este foi um acordo ruim e mostraremos como fazer negócios", disse, sobre Trump.
Alguns críticos do acordo com o Irã concordam. James Carafano, vice-presidente da Heritage Foundation, que trabalhou na equipe de transição de Trump, disse que o presidente é sério quando diz que o acordo iraniano não é bom o suficiente. "Kim vai aprender que se ele achar que vai conseguir um acordo, vai ter que ser muito mais impressionante do que o JCPOA", disse, referindo-se ao nome formal do acordo nuclear iraniano.
Diplomatas e analistas têm advertidos contra o esboço de um paralelo entre os desafios nucleares norte-coreanos e iranianos. O programa nuclear da Coreia do Norte está avançado e seus testes deixaram claro que o país tem armas nucleares e meios para lançá-las. Sua economia também tem vínculos internacionais limitados. Já a economia do Irã é mais aberta e suscetível a sanções. Embora Teerã tenha produzido material nuclear suficiente - urânio enriquecido - que poderia ter sido usado em uma arma, a Agência Internacional de Energia Atômica informou em dezembro de 2015 que seu trabalho em transformar esse material em armas provavelmente teria tido progressos modestos.
Uma das maiores críticas de Trump ao acordo nuclear iraniano é que deixa o problema nuclear pela estrada, da mesma forma que acordos anteriores com a Coreia do Norte não conseguiram parar a marcha de Pyongyang para a criação de uma bomba.
Defensores do acordo iraniano afirmam que as obrigações se estendem muito além do que a Coreia do Norte já concordou e permite que a comunidade internacional lide com outros desafios do Irã sem ter Teerã brandindo a ameaça nuclear.
O diretor-geral do Ministério da Inteligência israelense, Chagai Tzuriel, disse que o desenvolvimento ilícito do programa nuclear da Coreia do Norte gerou impacto nas decisões tomadas em Teerã e em Washington sobre o Irã. Às vezes, disse, a Coreia do Norte e o Irã podem ter consultado sobre como lidar com a pressão internacional para conter a atividade nuclear.
Dado o processo de tomada de decisão volátil em Washington, nem todos estão certos de como as conversas entre EUA e Coreia do Norte, se prosseguirem, influenciará no acordo do Irã.
Richard Nephew, ex-alto funcionário do Tesouro dos Estados Unidos, que fazia parte da equipe de negociação dos EUA com o Irã, disse que o aparente avanço com Pyongyang poderia dar a Trump o tipo de apoio bipartidário que reduz a pressão política sobre ele por parte dos republicanos para abandonar o acordo do Irã. "Mas também pode abrir espaço para fazê-lo, uma vez que ele não teria duas crises para gerenciar. Além disso, ele pode sentir que ameaça de guerra e as sanções maciças funcionaram" com Pyongyang "e que seria bom executar essa cena de novo com o Irã", disse.
Fonte: Dow Jones Newswire