Cubanos de Havana leem notícias sobre a morte de Chávez: as autoridades cubanas mantiveram silêncio sobre o impacto que a perda de seu aliado pode gerar. (AFP)
Da Redação
Publicado em 6 de março de 2013 às 14h13.
A morte do presidente venezuelano, Hugo Chávez, principal aliado político e parceiro comercial de Cuba durante 14 anos, constitui um duro golpe para a ilha comunista, e forçará o presidente Raúl Castro a acelerar as reformas econômicas, para evitar uma nova crise, disseram analistas à AFP.
Chávez, que faleceu na terça-feira em Caracas, estendeu a mão a Cuba com os vastos recursos petroleiros venezuelanos quando chegou ao poder, em 1999, ajudando a economia cubana a se recuperar progressivamente da aguda crise na qual caiu após o fim da União Soviética, uma década antes.
"Sem Chávez, as possibilidades de expansão do comércio de serviços (cubanos) por petróleo (venezuelano) são limitadas. A urgência de acelerar a transição em direção a um modelo de economia mista, com maior abertura ao investimento estrangeiro, se reforça", disse à AFP o analista cubano Arturo López-Levy, da Universidade de Denver (Colorado).
A venda de serviços profissionais, principalmente à Venezuela, é a principal fonte de divisas de Cuba e lhe fornece 6 bilhões de dólares anuais, acima das remessas familiares (2,5 bilhões em 2011), do turismo (2 bilhões em 2011) e as exportações de níquel (1,1 bilhão em 2010). Já Caracas fornece à ilha 100 mil barris de petróleo por dia em condições preferenciais.
"A morte de Chávez destaca mais uma vez as deficiências nas políticas dos Castro: não diversificar a economia cubana, não permitir que mais cubanos gerem riqueza por si mesmos e tornar o país genuinamente independente", disse à AFP Paul Webster Hale, ex-embaixador britânico em Cuba e professor da Universidade de Boston.
As autoridades cubanas mantiveram silêncio sobre o impacto que a perda de seu aliado pode gerar, enquanto o fantasma dos difíceis anos 90 se agita entre muitos cubanos e os economistas se dividem sobre as consequências que pode ter na ilha.
"Sempre vai haver um impacto, mas não acredito que, se houver uma mudança de governo (em Caracas), que ele corte abruptamente as relações econômicas que Cuba tem com a Venezuela", disse à AFP Omar Everleny Pérez, diretor do Centro de Estudos da Economia Cubana da Universidade de Havana.
Acrescentou que "Cuba tem uma quantidade de médicos (cerca de 40.000) que estão sustentando o programa social venezuelano e eliminar isto a zero seria uma coisa absurda", mas negou que a Venezuela esteja "subsidiando Cuba".
"Cuba adquire o petróleo ali, mas o paga mediante um convênio assinado no longo prazo. Qualquer governo (de Caracas) teria que respeitar os acordos" vigentes, afirmou.
Por sua vez, o economista opositor Oscar Espinosa Chepe acredita que haverá um impacto terrível na ilha, ainda pior que o ocorrido quando a ajuda de Moscou foi detida, "porque a infraestrutura cubana está em piores condições do que naquele momento".
"Nós dependemos neste momento do esquema de cooperação com a Venezuela. É terrível, penso que as consequências podem ser até piores do que quando os subsídios soviéticos foram perdidos", disse Espinosa Chepe à AFP.
Há duas décadas, Cuba perdeu abruptamente 85% de seu comércio exterior e sua indústria praticamente foi paralisada por falta de combustível e matérias-primas, após o desaparecimento da União Soviética. O Kremlin havia sido o principal sustentáculo financeiro da ilha por décadas depois que Fidel Castro chegou ao poder, em 1959.
Para enfrentar a crise, Fidel Castro impôs uma economia de guerra que foi anunciada oficialmente no jornal Granma no dia 29 de agosto de 1990 como "um período especial em época de paz", com restrições severas ao consumo e prolongados apagões.
Embora o "período especial" não tenha terminado oficialmente, a economia começou a se recuperar progressivamente a partir de 1997 graças ao turismo, tendência que foi reforçada depois que Chávez chegou ao poder, em 1999, e começou a contribuir economicamente com seu aliado.
"Dado o nível de sua aliança com a Venezuela, Cuba não pode esperar nada positivo de uma maior instabilidade política em Caracas", disse López-Levy.
Afirmou que, embora o chavismo siga governando a Venezuela com Nicolás Maduro, designado sucessor político por Chávez, Raúl Castro deve aprofundar as reformas, que abriram maior espaço à iniciativa privada, embora o Estado siga controlando mais de 90% da economia.
"Nicolás Maduro aparece como favorito (para as eleições). Tal cenário, no entanto, não reduz as enormes pressões sobre as reformas cubanas, onde as mudanças menos arriscadas já foram adotadas em 2011 e 2012", disse López-Levy.
"A lógica indica que (Cuba) tente melhorar as relações com os Estados Unidos, o que seria muito benéfico para o país, e tente acelerar as reformas", opinou Espinosa Chepe.
As autoridades cubanas deverão "também se abrir ao investimento estrangeiro, terão que se abrir mais ao mundo, estão fazendo isso, mas o ritmo precisará ser modificado, acelerado. Terão que flexibilizar ao máximo as normas, dar segurança (aos investidores), porque o país não tem recursos (próprios) para investir", acrescentou.
Além disso, "se Maduro perder - e ele tiver poucos dos atributos de Chávez como líder inspirador - os cubanos estarão perto de entrar em pânico. Mais de 5 bilhões de dólares em subsídios garantidos são difíceis de substituir", expressou o ex-embaixador Hare.