Planeta Terra: Cientistas acreditam que alguém no Leste Asiático parece estar desrespeitando um tratado ambiental global em vigor há três décadas (NASA/Divulgação)
Gabriela Ruic
Publicado em 20 de maio de 2018 às 06h00.
Última atualização em 20 de maio de 2018 às 10h12.
Os cientistas se depararam com um caso de detetive atmosférico: alguém no Leste Asiático parece estar desrespeitando um tratado ambiental global em vigor há três décadas que proibiu produtos químicos que destroem a camada de ozônio.
Pesquisadores dos EUA, do Reino Unido e da Holanda descobriram novas emissões de um refrigerante responsável por cerca de um quarto do cloro que atinge a camada de ozônio, que bloqueia a radiação, segundo um artigo publicado na quarta-feira na revista Nature.
Os níveis de clorofluorcarboneto (CFC) vêm caindo constantemente desde a eliminação gradual estabelecida pelo Protocolo de Montreal, de 1987 -- que o ex-secretário-geral das Nações Unidas Kofi Annan classifica como “possivelmente o acordo ambiental internacional mais bem-sucedido da história”.
Os níveis atmosféricos dessa substância química, o CFC-11, se estabilizaram em torno de 2002, apesar de a produção global ter sido diminuída até cessar, em 2010. Mas de repente, em 2012, a taxa de declínio caiu misteriosamente 50 por cento.
Nenhuma explicação se encaixa melhor nos dados do que uma produção nova, relatam os cientistas. Eles detectaram um aumento na diferença entre os níveis atmosféricos nos hemisférios Norte e Sul que sugere a existência de instalações no Norte, que é altamente industrializado. A partir disso, fizeram um modelo da poluição atmosférica para recuperar as possíveis origens do ar da amostra avaliada: o Leste Asiático. Cerca de 13.000 toneladas de CFC-11 estão chegando à atmosfera todos os anos.
Se “13.000 toneladas escapam para a atmosfera, quanto está sendo produzido? Há algum vazamento”, disse Johannes Laube, pesquisador da Universidade de East Anglia que avaliou o artigo para a revista.
Stephen Montzka, principal autor do estudo e químico atmosférico da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos EUA (NOAA, na sigla em inglês), disse que o estudo apresenta “evidências sólidas” de produção renovada, apesar de possíveis fatores complicadores, como os movimentos variáveis de massas de ar em grandes altitudes e a emissão residual de CFC-11 de materiais que eram comuns na construção civil.
O estudo é raro porque pode ter profundas implicações tanto ecológicas quanto políticas. É difícil dizer quais são mais pronunciadas.
Cálculos feitos depois que o autor principal e seus colegas terminaram o artigo sugerem que algumas décadas de produção de CFC-11 pelos níveis observados poderiam atrasar em apenas uma década as estimativas para quando o buraco na camada de ozônio retornará à escala de 1980 -- meados do século.
“O céu não está desabando”, disse Montzka.
Os diplomatas podem não pensar exatamente assim.
“É essencial que haja uma análise cuidadosa, porque qualquer alegação sobre emissões novas – e, portanto, ilegais -- terá implicações políticas”, escreveu Michaela Hegglin, química atmosférica da Universidade de Reading, em ensaio paralelo para a Nature.
Os países se mexeram bastante rapidamente em meados da década de 1980 para assinar o tratado, em parte porque a indústria havia descoberto químicos refrigerantes substitutos que não destroem a camada de ozônio na estratosfera. Contudo, depois concluiu-se que esses químicos, os hidrofluorcarbonetos (HFCs), são grandes causadores do efeito estufa, e muitas centenas de milhares de vezes mais potentes que o CO2, embora não contribuam tanto para o aquecimento global geral porque são menos abundantes.
Os signatários do Protocolo de Montreal se reuniram em 2016 em Kigali, Ruanda, pelo 30º aniversário do tratado e assinaram uma emenda que proibiria os hidrofluorcarbonetos (HFCs). Ela entrará em vigor em 1º de janeiro de 2019.