Hong Kong: domingo foi marcado por manifestações de milhares de pessoas (Thomas Peter/Reuters)
AFP
Publicado em 16 de junho de 2019 às 10h08.
Dezenas de milhares de pessoas saíram às ruas neste domingo (16) em Hong Kong, onde o descontentamento era palpável depois de confrontos violentos entre manifestantes e policiais, apesar do recuo do governo sobre o polêmico projeto da lei de extradições.
Os organizadores pretendem manter a pressão sobre Carrie Lam, chefe do Executivo pró-Pequim de Hong Kong, que no sábado suspendeu o projeto de lei autorizando as extradições para a China.
"Retire a lei do mal!", gritavam os manifestantes vestidos de preto. A marcha de protesto partiu de um parque na ilha de Hong Kong e seguia para o Conselho Legislativo (LegCo, Parlamento), no coração da cidade. Trata-se do mesmo percurso realizado há uma semana e que reuniu um milhão de pessoas, de acordo com os organizadores.
Segundo seus críticos, o projeto colocaria a população da ex-colônia britânica à mercê do sistema judiciário da China continental, opaco e controlado pelo Partido Comunista. A comunidade empresarial teme ainda a possibilidade de a reforma prejudicar a imagem internacional e a atratividade do centro financeiro.
"A reação de Carrie Lam não foi sincera, é por isso que estou manifestando hoje", explicou Terence Shek, de 39 anos, que veio com seus filhos.
Na quarta-feira, Hong Kong registrou os piores episódios de violência desde a devolução do território à China em 1997, quando milhares de pessoas foram dispersadas pela polícia de choque com gás lacrimogêneo e balas de borracha.
"Polícia de Hong Kong, o seu dever é nos proteger, não atirar contra nós", dizia o cartaz de um manifestante.
Lam não desistiu permanentemente do texto. Os manifestantes, portanto, exigem o abandono do projeto, a renúncia da chefe de governo e desculpas pela violência policial.
"Essa suspensão significa que o projeto pode ser reativado a qualquer momento", disse o militante Lee Cheuk-yan.
Quase 80 pessoas, incluindo 22 policiais, ficaram feridos na quarta-feira. No sábado, um homem morreu ao cair do telhado de um centro comercial, onde ele ficou por várias horas com um cartaz dizendo: "Retire completamente a lei de extradição chinesa. Não somos baderneiros. Libertem os estudantes e os feridos".
Neste domingo, as pessoas formavam enormes filas para deixar flores e origamis no local da tragédia, além de mensagens de homenagem ao falecido.
Jimmy Sham, da Frente Cívica de Direitos Humanos, comparou o projeto a uma "faca" ameaçando Hong Kong. "Quase atingiu nossos corações. Agora o governo diz que não vai avançar, mas também se recusa a retirá-lo".
A oposição ao projeto de lei é ampla, reunindo advogados, organizações jurídicas influentes, empresários, câmaras de comércio, jornalistas, ativistas, religiosos e diplomatas ocidentais.
Sob o princípio de "um país, dois sistemas", a ex-colônia britânica goza de liberdades desconhecidas na China continental, teoricamente até 2047.
Mas o movimento vai além da questão das extradições e expressa um ressentimento muito maior contra o governo e contra Pequim, acusados de tolir as liberdades do território semi-autônomo.
Nos últimos dias, a chefe de governo tem estado cada vez mais isolada, com deputados de seu próprio campo distanciando-se do texto.
"Apoiamos, respeitamos e entendemos" a decisão de suspender o texto, declarou o ministério das Relações Exteriores da China, falando da necessidade de "restaurar a calma o mais rápido possível" no território.
Os críticos de Lam culpam-na por perder várias oportunidades de se desculpar pelo comportamento da polícia.
Ela justificou a ação policial por atos de violência perpetrados por certos manifestantes. Mas a oposição a acusa de usar as atitudes de uma pequena minoria para atacar todos os manifestantes, em sua maioria pacíficos.
"Os grupos pró-democracia não vão parar por aí. Querem aproveitar o impulso contra Carrie Lam", explicou à AFP o analista político Willy Lam.
Neste momento, os manifestantes exigem que a polícia retire as acusações contra os manifestantes acusados de serem desordeiros. Eles temem represálias do governo, disse o militante Lee Cheuk-yan, e querem a garantia de que "o povo, os manifestantes, não sejam assediados e politicamente perseguidos pelo governo".