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La Bestia: trem com preços altos e destino pode ser a morte

"Se viaja a céu aberto, com risco de queda, sob sol forte, com fome, por lugares remotos, coisas podem cair, podem descê-lo do trem e sequestrá-lo" diz ativista

Trem em Juchitan, no México (Getty Images/John Moore)

Trem em Juchitan, no México (Getty Images/John Moore)

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Da Redação

Publicado em 1 de setembro de 2013 às 14h48.

Cidade do México - No México existe um trem de mercadorias no qual os imigrantes embarcam ilegalmente e que teoricamente é grátis, mas o preço da passagem aumenta a cada estação, graças aos subornos e percalços do trajeto em direção à fronteira com os Estados Unidos, até o ponto máximo em que, às vezes, o preço cobrado é a própria vida.

Ele é chamado de 'La Bestia' ('A Besta', tradução livre) e, segundo contam aqueles que já embarcaram nele, não poderia ter um nome melhor: 'se viaja a céu aberto, com riscos de queda, sob o sol forte, com fome, por lugares remotos, coisas podem cair em cima de você, você pode cair de sono, podem descê-lo do trem e sequestrá-lo, ou extorqui-lo'.

Quem contou isso à Agência Efe foi Rubén Figueroa, um ativista dos direitos humanos que na última década trabalhou próximo da linha do trem, ajudando às milhares de pessoas que atravessam todos os anos o México, aproximadamente 500 mil, procedentes da América Central e com destino aos Estados Unidos.

Figueroa deu essa entrevista poucas horas depois de deixar Huimanguillo (Tabasco, sudeste do México), onde estava desde o último domingo, quando um trem descarrilou com 300 imigrantes abordo, entre os quais pelo menos 12 morreram.

O acidente fez com que eles não pudessem terminar uma viagem na qual, se tudo vai 'bem' e se conseguem superar as adversidades, os passageiros levarão entre 20 e 25 dias para chegar à fronteira norte, nos quais terão desembolsado 'pelo menos 15 mil pesos mexicanos' (US$ 1,1 mil).

Figueroa realizou grande parte de seu trabalho no albergue La 72 de Tenosique, município onde começa uma das rotas feitas pelos imigrantes, já que está a cerca de 60 quilômetros da fronteira com a Guatemala.

Dali saiu o trem que descarrilou no domingo passado, mas existe outra opção similar, ainda mais ao sul, entrar por Tapachula (Chiapas) e embarcar no trem em Arriaga.

Esses dois trechos, cujos trens saem dia sim, dia não, são os 'mais tranquilos', explicou Figueroa.

As duas linhas se unem em Medias Aguas (Veracruz), continuam até o centro do país e depois voltam a se dividir, uma em direção ao Pacífico, e outra rumo ao Golfo do México, e é aí que começa o território selvagem.


O caminho do Golfo é o 'mais perigoso', a do Pacífico um pouco menos, mas 'muito mais longo', entretanto, as duas passam pelas rotas do tráfico de drogas e os imigrantes se transformam em uma mercadoria a mais, vítimas e presas fáceis para o crime organizado.

Oscar, um salvadorenho de 39 anos, conhece todos os caminhos, pois embarcou tantas vezes no trem que já se esqueceu de quantas foram. Duas vezes conseguiu chegar aos Estados Unidos, onde foi deportado, e em muitas outras ficou pelo caminho e retornou ao seu país.

Oscar viveu de tudo. Extorsões, fugas, e até uma queda do trem da qual saiu ileso e não teve o azar de muitos companheiros que morreram esmagados ou sofreram amputações.

Para ele, o pior é o sol. 'Se chove, você fica molhado, mas pelo menos fica um pouco mais fresco e você não se sente tão cansado, mas, como está o sol agora... Suportar 14, 16 horas no trem é duro', contou.

Também é duro enfrentar todas aquelas pessoas que tentam se aproveitar da vulnerabilidade dos que não têm nada, que constantemente são vítimas de extorsão.

Entre eles, assegura, estão os funcionários do trem, que pedem dinheiro para os imigrantes para poder continuar o caminho e, às vezes, ameaçam parar o trem se não pagarem.

E, o pior, as máfias e cartéis, muitas dos quais cobram uma cota fixa: US$ 100 em Ixtepec (Oaxaca), US$ 100 em Tierra Blanca (Veracruz), US$ 100 em Huehuetoca (Estado do México), e assim sucessivamente.

O trem está 'mais perigoso do que antes' e por isso, com seus quase 40 anos, Oscar decidiu deixar de imigrar, ficar no albergue Hermanos en el Camino de Ixtepec para procurar trabalho e poder trazer sua esposa e seus dois filhos.

Quem está no comando da casa é o pai, Alejandro Solalinde, que considera que, mesmo que o acidente de domingo tenha acontecido por culpa da chuva ou pelo roubo dos trilhos, a 'responsabilidade é do governo'.

'O Legislativo tinha proposto uma permissão temporária de passagem para que os imigrantes pudessem chegar aos EUA e não tivessem que ir pelos trens, mas o governo de (Felipe) Calderón negou isso', lembrou.


'Agora os imigrantes seguem como se nunca tivesse existido a lei, utilizando rotas perigosas onde são presas fáceis para o crime organizado', disse à Efe.

Na opinião desse ferrenho defensor dos imigrantes, o México não fez nada para regulamentar a passagem por suas fronteiras porque tem 'um compromisso' com os EUA, 'a contenção do fluxo migratório'.

Há 'uma caçada de imigrantes em todo o território mexicano', assegurou Figueroa após lembrar que nesse país 'é possível se deparar com blitzes e pontos de controle migratório o tempo todo'.

Se os imigrantes pudessem entrar legalmente no país, acrescentou, cairiam os lucros das autoridades provenientes das extorsões e isso não convém. Por isso as denúncias dos defensores, que muitas vezes estão sob ameaças de morte, não são levadas a diante.

Comentou que apesar de as autoridades terem o poder de deportar os imigrantes feridos no descarrilamento de domingo, vão deixá-los ir porque 'são midiáticos', mas não poderão embarcar em um ônibus tranquilos, deverão subir mais uma vez em 'La Bestia' para tentar chegar a seu destino. EFE

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