Na prisão, Mansur Dau conta que Kadafi se sentiu abandonado por Berlusconi, Sarkozy, Erdogan e Tony Blair (Philippe Desmazes/AFP)
Da Redação
Publicado em 31 de outubro de 2011 às 12h02.
Misrata, Líbia - Depois de sua prisão, uma pessoa ligada a Muammar Kadafi narrou as últimas semanas do "guia", até sua morte em Sirte no dia 20 de outubro, apresentando um homem "deprimido e ansioso" que preferia "morrer na Líbia a ser julgado" pelo Tribunal Penal Internacional (TPI).
No dia 27 de junho, o TPI emitiu um mandato de prisão para Kadafi, seu filho Saif al-Islam e Abdallah al-Senussi, ex-chefe do serviço secreto e militar da Líbia, por crimes contra a Humanidade.
Esta medida agravou as coisas, afirma Mansur Dau, ex-chefe do serviço de segurança, preso em Misrata: "O mandato do TPI fez com que ele e seus filhos decidissem ficar na Líbia (...) Kadafi dizia 'eu prefiro morrer na Líbia do que ser julgado pelo (procurador do TPI Luis) Moreno-Ocampo'".
Saif al-Islam e um outro filho, Muatassim, "queriam que Kadafi ficasse, sobretudo Saif", considerado seu sucessor, enquanto "Senussi fazia pressão para que ele partisse".
Em 19 de agosto, as forças do Conselho Nacional de Transição (CNT) chegaram a Trípoli e Muammar Kadafi fugiu para Sirte, sua terra natal.
"Kadafi sabia que era o fim (...) desde que suas tropas foram expulsas de Misrata", depois disso "ficou cada vez mais nervoso", lembra Dau.
"Ele estava sob pressão porque seus amigos o abandonaram, Berlusconi (chefe do governo italiano), Sarkozy (presidente francês), Erdogan (primeiro-ministro turco) e Tony Blair (ex-primeiro-ministro britânico). Ele considerava estes líderes como amigos próximos", disse.
No início, Kadafi viveu em um hotel em Sirte, mas com os ataques do CNT aos arredores da cidade em meado de setembro, passou a trocar de abrigo quase diariamente por medida de segurança.
Suas provisões diminuíram, começou a chover bombas, combates se intensificaram, devastando a cidade. A eletricidade e a água foram cortadas e os alimentos se tornaram raros.
Muatassim, hoje morto, comandava os combates em Sirte, enquanto Saif, atualmente foragido, "ficou em Bani Walid", outro reduto pró-Kadafi, que caiu logo antes de Sirte. "Eu nunca mais o vi desde então", contou Mansur Dau.
Os combatentes fiéis ao ex-líder caíam um após o outro sob o fogo dos pró-CNT, enquanto voluntários de Sirte sem experiência tentavam ajudar.
"Kadafi lia livros, fazia muitas anotações e dormia. Era Muatassim que comandava os combatentes. Kadafi nunca lutou. Ele estava velho", explicou.
No dia 19 de outubro, a situação ficou desesperadora: a última quadra do bairro n°2 de Sirte é cercado e bombardeado pelo CNT e pela Otan.
Ele saiu decidido partir para o sul, na direção de Wadi Djaref, próximo da cidade natal de Kadafi.
"Um erro monumental", para Dau: "Foi ideia de Muatassim. Ele tinha em torno de 45 veículos, de 160 a 180 homens, alguns feridos. A partida deveria ocorrer às 3h30 da manhã (20 de outubro), mas demoramos três ou quatro horas antes de partir (...), pois os voluntários de Muatassim estavam mal organizados".
O comboio saiu no amanhecer e foi rapidamente percebido pela Otan que iniciou um ataque aéreo. Os combatentes do CNT foram terminar o trabalho, matando ou capturando os sobreviventes.
Ferido, Kadafi foi encontrado escondido em tubulações de água e esgoto. Foi pego pelos combatentes de Misrata, apanhou, foi insultado e humilhado. Duas horas depois, estava morto com um tiro na cabeça e outro no peito.