Advogados das vítimas do escândalo das próteses mamárias PIP: a empresa francesa produziu por 10 anos próteses mamárias preenchidas com gel de silicone industrial, impróprio para fins médicos. (REUTERS/Jean-Paul Pelissier)
Da Redação
Publicado em 17 de abril de 2013 às 14h12.
Marselha - O julgamento dos diretores da fabricante francesa de implantes mamários PIP, envolvidos em um escândalo sanitário que ganhou proporções globais quando revelado, em 2010, teve início nesta quarta-feira, no Tribunal Penal de Marselha, sul da França.
Cinco funcionários da empresa Poly Implant Prothese (PIP), hoje liquidada, incluindo seu fundador, Jean-Claude Mas, de 73 anos, deverão responder até o dia 17 de maior por fraude agravada em um centro de convenções especialmente organizado para acomodar centenas de reclamantes e seus advogados. Eles podem pegar até cinco anos de prisão.
Centenas de vítimas, da 5.250 que prestaram queixa, assistiram o início do julgamento, sentadas nas primeiras filas da enorme sala e usando crachás de suas associações.
A exasperação foi manifestada logo no início da audiência, quando várias autoras da ação judicial vaiaram o anúncio do valor da aposentadoria de Mas.
"O que esperamos deste processo é que os culpados tenham a punição que merecem, apesar de sabermos que não estarão à altura do que fizeram", afirmou Alexandra Blanchère, que preside a associação PPP (Portadoras de Próteses PIP).
Entre as vítimas, Angela Mauro, de 47 anos, que veio do leste da França. Suas próteses, implantadas em 2003, se romperam duas vezes provocando dores e obrigando a trocar de emprego. "Eu espero que sejamos tratadas como vítimas e não apenas mulheres que queriam próteses", declarou.
O julgamento deve esclarecer como uma pequena empresa francesa produziu por 10 anos próteses mamárias preenchidas com gel de silicone industrial, impróprio para fins médicos, sem o conhecimento dos órgãos reguladores. Estima-se que mais de 300 mil mulheres utilizaram estes implantes em todo o mundo.
Apesar de nenhuma relação entre a prótese e a ocorrência de câncer de mama ter sido estabelecida por enquanto, a espera dos resultados de um estudo epidemiológico a longo prazo, os casos de ruptura e vazamento de gel de silicone foram provados e em número muito elevado.
Foi este fenômeno que alertou as autoridades de saúde. Mais de 4.100 casos de ruptura e 2.700 reações inflamatórias foram identificadas. Como precaução, muitas mulheres optaram por remover seus implantes após a revelação do escândalo, incluindo 11 mil na França.
Os implantes foram comercializados em mais de 65 países, especialmente na América Latina (Venezuela, Brasil, Colômbia, Argentina), onde se concentrou metade do seu mercado em 2009.
Países do oeste europeu (Espanha, Grã-Bretanha, Suécia, Alemanha, Itália, Bélgica, Holanda, Portugal, Suíça) foram os segundos que mais importaram o produto. O leste europeu (Bulgária, Hungria, Rússia, Bielorrússia, Polônia, República Checa) representaram 10% do mercado. Os produtos também foram vendidos no Irã, Turquia, Israel, Síria e Emirados Árabes Unidos, bem como na Austrália, Tailândia, Japão, Cingapura e China.
O gel industrial fraudulento custava dez vezes menos do que o gel Nusil, o único aprovado pelas autoridades sanitárias, uma economia anual de mais de um milhão de euros.
"A fórmula era perfeita", assegurou Mas após a descoberta da fraude. Este megalomaníaco autoritário, preso de 6 março a 29 outubro de 2012, por não pagar fiança, é o principal acusado do julgamento.
Ele descobriu o mercado dos implantes mamários na década de 1980, num momento em que ainda não havia regulamentação do setor. Fundou a PIP em 1991 em La Seine-sur-Mer (sudeste).
Durante anos, a empresa francesa PIP escapou da vigilância da líder mundial de controle de qualidade TÜV, que certificava seus implantes mamários, recorrendo a atividades como esconder material, realizar contabilidade falsa ou produzir próteses em conformidade com as regras apenas em caso de fiscalização.
O advogado de 2.800 vítimas, Philippe Courtois, afirmou que suas clientes "estão ansiosas porque desejam o processo aconteça" - foram apresentados vários pedidos de adiamento ou cancelamento - "e impacientes porque têm muitas coisas a falar".
Para alguns advogados das vítimas, falta ainda um acusado no banco dos réus, a alemã TÜV.