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Inadimplência deve crescer do Brasil à Índia com altas de juros

O risco está aumentando à medida que governos, na luta contra inflação, elevam os juros de mínimas históricas, mostra levantamento

As previsões de inadimplência reduziram o lucro e pioram situação de emergentes, dizem analistas

As previsões de inadimplência reduziram o lucro e pioram situação de emergentes, dizem analistas

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Da Redação

Publicado em 1 de junho de 2011 às 20h29.

São Paulo - Pela primeira vez desde que a crise de crédito mundial começou a perder força, bancos de países em desenvolvimento dizem que a inadimplência deve aumentar com a elevação das taxas de juros.

O Banco Estatal da Índia, o maior instituição financeira do país, disse no mês passado que as previsões de inadimplência reduziram o lucro do quarto trimestre em 99 por cento. O Itaú Unibanco Holding SA, maior banco brasileiro por valor de mercado, destinou 12 por cento a mais de recursos no primeiro trimestre para cobrir empréstimos atrasados do que nos três meses anteriores. O Fundo Monetário Internacional alertou em 12 de maio que os bancos do leste europeu estão ameaçados pelo “grande número” de empréstimos não rentáveis.

O risco está aumentando à medida que governos, na luta contra inflação, elevam os juros de mínimas históricas. Em um ano, a taxa cobrada no Brasil para empréstimos saltou de 34 por cento para uma média de 39 por cento em março. Empresários indianos pagaram taxas acima de 20 por cento em títulos este ano, segundo a corretora sediada em Mumbai, IIFL Ltd. Empresas do setor de imóveis na China pagam taxas perto de 25 por cento ao ano à agentes fiduciários, para contornar os limites ao crédito.

“Os mercados emergentes chegaram a um ponto em que as métricas do setor de crédito começaram a se deteriorar de forma representativa”, disse Michael Shaoul, presidente do conselho da Marketfield Asset Management LLC, em Nova York, que gerencia US$ 1 bilhão em ações e títulos de países em desenvolvimento. “Vamos ver uma quantidade considerável de inadimplência nos mercados emergentes nos próximos 12 meses.”

Bancos não rentáveis

Ações de bancos vêm perdendo para índices de referência de países emergentes este ano, em parte por que eles são os responsáveis por cobrir as perdas caso os empréstimos não sejam pagos. O índice MSCI EM/Financials Index caiu 0,9 por cento desde o fechamento de 2010. O índice MSCI Emerging Markets Index, que acompanha ações dos países emergentes, subiu 1,8 por cento no mesmo período.


 

O Banco Santander Brasil SA, pior banco em desempenho no Ibovespa este ano, acumula perdas de 21 por cento, em comparação à queda de 6,8 por cento do índice no mesmo período. O banco sediado em São Paulo está elevando o número de empréstimos que faz a empresas de pequeno e médio porte para melhorar ganhos marginais e sustentar o preço da ação, disse Fabio Barbosa, presidente do conselho do banco, em entrevista em 16 de maio em Nova York.

A ação do Banco Estatal da Índia caiu 17 por cento na bolsa de Mumbai, quase o dobro do recuo de 9,3 por cento do índice Bombay Stock Exchange Sensitive Index no ano. O banco russo OAO Sberbank, maior da Rússia, teve perda de 6,5 por cento em 2011, quatro vezes maior do que a queda do índice Micex, de 1,3 por cento.

Especulações de que a inadimplência irá crescer aumentam conforme investidores compram mais papéis de países emergentes para garantir maior rendimento. O Federal Reserve, dos Estados Unidos, vem mantendo a taxa básica de juros perto de zero por mais de dois anos, enquanto bancos centrais das maiores economias emergentes subiram os custos de empréstimos.

Dívida sem classificação

Os emissores dos países em desenvolvimento captaram neste ano US$ 26 bilhões em títulos denominados em dólar sem a classificação de crédito das agências Standard & Poor’s, Moody’s Investors Service Ltd ou Fitch Ratings Ltd. Isso é o dobro do recorde de US$ 13 bilhões em 2007, segundo dados compilados pela Bloomberg.

“Há uma série de países emergentes aumentando suas taxas”, disse Tony Volpon, estrategista para América Latina na Nomura Holdings Inc., em Nova York, em entrevista por telefone no dia 13 de maio. “Quando começa a haver um aperto monetário, você começa a ver um maior número de inadimplência.”

O Banco Central brasileiro elevou a taxa Selic em 3,25 pontos percentuais nos últimos 13 meses, para 12 por cento. O aumento foi para conter a inflação, que chegou a 6,51 por cento nos 12 meses até abril, o maior nível desde julho de 2005.


O Banco Popular da China também elevou a taxa básica quatro vezes desde outubro. O Banco Central da Índia subiu sua taxa em 0,5 ponto percentual -- mais do que o esperado -- em 3 de maio, e alterou a taxa de recompra reversa nove vezes desde março de 2010.

‘Alarmante’

A dívida pública da China, relativamente baixa, pode permitir ao país absorver qualquer inadimplência sem impacto “alarmante”, disse Valentina Chen, gerente de fundos da Aviva Investors em Londres, Londres, que tem investimentos de US$ 2,5 bilhões em títulos de mercados emergentes.

“É algo que está no meu radar, eu tenho que acompanhar e saber caso venha a piorar”, disse Chen em entrevista por telefone em 16 de maio. “Mas no momento não é algo que tenha afetado minhas decisões de investimento.”

O primeiro ministro chinês, Wen Jiabao, prometeu em 5 de março conter o mercado imobiliário, dizendo que o aumento de preços “exorbitante” de imóveis residenciais em algumas cidades é uma das principais preocupações do governo.

As taxas dos títulos denominados em dólar que vencem em 2015 do Evergrande Real Estate Group Ltd., maior investidor na China, subiram de 9,6 por cento em 4 de janeiro para 11,3 por cento em 1 de junho, depois que as autoridades chinesas pediram aos bancos que realizassem mais testes de estresse nos empréstimos ao setor imobiliário.

Imóveis na China

Empresas do setor imobiliário na China gastaram entre 16 por cento e 25 por cento nos empréstimos tomados de agentes fiduciários, para se esquivarem as restrições nos empréstimos ao setor no país, segundo uma pessoa do National Trust, empresa sediada em Pequim. A pessoa pediu para não ser identificada por que não está autorizada a falar com a mídia.

A China planeja transferir cerca de 3 trilhões de yuans (US$ 463 bilhões) em dívidas dos governos locais, reduzindo a possibilidade de inadimplência que pode ameaçar a estatabilidade, disse a agência de notícias Reuters em 31 de maio, citando pessoas que não puderam ser identificadas.

A inadimplência em países como China e Brasil caiu no ano passado depois que os bancos centrais cortaram as taxas básicas de juros para mínimas históricas, a fim de estimular o crescimento. Dívidas de grau especulativo em atraso caíram para 1,2 por cento nos países em desenvolvimento no final de 2010. Em 2009, o nível era de 6,1 por cento e em 2008, 2,2 por cento, disse a S&P por email.


Dívidas em atraso na China recuaram para o recorde 1,1 por cento do total de empréstimos no quarto trimestre de 2010, segundo o Banco Central do país.

Baixas cíclicas

“Empréstimos não rentáveis no sistema bancário chinês estão na baixa do ciclo, e não acreditamos que eles continuarão assim, principalmente depois do rápido crescimento dos empréstimos nos últimos dois anos,” disse Yvonne Zhang, analista de bancos chineses na Moody’s, em Pequim, em entrevista por telefone em 20 de maio.

Empréstimos em atraso no Brasil recuaram para 4,9 por cento em abril, um ponto percentual abaixo do pico pós-crise em agosto de 2009, segundo o Banco Central. Atrasos em empréstimos ao consumidor devem atingir a alta de 7 por cento ou 8 por cento, acima dos 6,5 por cento em março, segundo Volpon, da Nomura.

Os empréstimos não rentáveis do Banco Estatal da Índia caíram para 2,5 no primeiro trimestre deste ano, menor que os 2,9 por cento do mesmo período de 2009, segundo dados compilados pela Bloomberg.

Mais indianos que tomam empréstimos vão ter dificuldade em pagar por que os juros ascendentes são “um choque nos fluxos de caixa”, disse Brian Hunsaker, analista de renda variável na KBW Inc. em Hong Kong, em entrevista por telefone em 24 de maio.

A Akarsh Residence Pvt. e a Century Real Estate Holdings Pvt. tiveram que oferecer taxas perto de 24 por cento para fazer captações no primeiro trimestre, depois de o banco central ter elevado os juros, segundo a IIFL em Mumbai.

Leste Europeu

Altos níveis de inadimplência podem segurar o crescimento do crédito no Leste Europeu, segundo relatório do Fundo Monetário Internacional de 12 de maio. Qualidade e rendimento de ativos continuarão sendo “um desafio” na Bósnia, Lituânia, Letônia, Montenegro, Romênia e Ucrânia, segundo o relatório.

Empréstimos corporativos não rentáveis e imobiliários na Hungria podem chegar a 15 por cento até o final deste ano, acima dos 12 por cento no ano passado, disse o banco central do país em relatório sobre estabilidade financeira de 20 de abril.


 

Investidores não estão incluindo o risco de mais inadimplências nos preços, disse Shaoul, da Marketfield Asset Management. As taxas dos títulos corporativos dos mercados emergentes caíram para 5,59 por cento em 20 de maio, o menor nível desde 12 de novembro, segundo o índice do banco JPMorgan Chase & Co. Diversified Corporate EMBI Composite Blended Yield. O prêmio que investidores exigem para deter títulos de emergentes em vez de papéis do governo americano era de 279 pontos base em 31 de maio, ou 2,79 pontos percentuais. A média desde o começo de 2010 é de 298 pontos base.

Antes do colapso do Lehman Brothers Holdings Inc. em setembro de 2008, esse prêmio era de, em média, 328 pontos-base naquele ano, e chegou à máxima de 1.108, em 27 de outubro de 2008.

“Se aprendemos algo nos últimos três ou quatro anos”, disse Shaoul em entrevista por telefone em 18 de maio, “é que os prêmios não servem para prever bem o risco.”

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