Nova York: morador de rua em ponto turístico da cidade ( UCG/Getty Images)
Agência de notícias
Publicado em 15 de janeiro de 2024 às 06h24.
Francisco Palacios, que cresceu em uma família pobre no Equador, chegou à cidade de Nova York em 1986. Seu objetivo era ganhar o suficiente para que, um dia, conseguisse se aposentar em sua terra natal.
No entanto, após ficar preso em empregos mal remunerados em restaurantes, canteiros de obras e uma lavanderia, o equatoriano, agora aos 70 anos, não tem economias e está apenas tentando sobreviver. Nos dias úteis, ele permanece em uma esquina no Queens na esperança de que alguém o contrate para pintar casas. Ele disse sentir que ainda tem “a energia e a força para trabalhar”, embora acredite que não possua futuro.
Imigrantes idosos como Palacios agora compõem um pouco mais da metade da população de Nova York com 65 anos ou mais. Desde 2010, os números aumentaram mais que o dobro da taxa de idosos nascidos nos EUA, principalmente devido ao envelhecimento de imigrantes que chegaram décadas atrás como jovens adultos e trabalhadores. Muitas dessas pessoas afirmam nunca ter esperado envelhecer na cidade — e, após anos dizendo que irá embora “amanhã”, não estão preparados para essa realidade quando ela chega. Outros ficaram por não conseguir imaginar deixar os filhos e netos que têm no local.
O crescimento rápido da população de 65 anos ou mais na cidade, hoje estimada em 1,4 milhão, é impulsionado pelos imigrantes idosos. De acordo com uma análise do censo pela Social Explorer, empresa de pesquisa de dados, em 2022 havia 713 mil imigrantes idosos. O número representa um aumento de 57% desde 2010. Durante o mesmo período, a quantidade de residentes idosos nascidos nos EUA aumentou 25%, totalizando 678 mil. Os idosos que nasceram em outros países tornaram os bairros da cidade mais diversos, e ajudaram a manter a economia em movimento, embora hoje ameacem sobrecarregar os serviços sociais limitados em uma cidade que já enfrenta a crise imigratória.
Ainda que muitos idosos enfrentem dificuldades financeiras e isolamento social, os imigrantes podem ser os mais afetados, segundo especialistas em imigração. Eles tendem a ter menos educação do que os nascidos nos Estados Unidos, e são menos propensos a ter renda de aposentadoria ou investimento, apontou a análise do censo. A renda anual média para um imigrante idoso foi de US$ 14,5 mil (R$ 70 mil), quase metade dos US$ 30 mil (R$ 145 mil) para um idoso americano. Sem reserva financeira, alguns imigrantes idosos também recebem ajuda limitada devido a barreiras linguísticas e culturais, e os que não possuem documentos não têm direito a receber nenhum valor.
Alguns imigrantes idosos já caíram na pobreza e na falta de moradia, e mais seguirão o mesmo caminho caso os líderes da cidade não encontrem maneiras de ajudá-los, afirmou Jonathan Bowles, diretor executivo do Center for an Urban Future, organização sem fins lucrativos que tem relatado sobre imigrantes idosos. Em 2022, havia 163 mil imigrantes idosos vivendo na linha da pobreza ou abaixo dela, um aumento de 37% em relação a uma década antes, segundo o centro.
— Os imigrantes deram muito à cidade em suas vidas profissionais — disse Bowles. — Seria impensável para a cidade virar as costas para os imigrantes à medida que envelhecem e suas necessidades aumentam.
Apesar de estarem desproporcionalmente concentrados em empregos mal remunerados, os imigrantes são uma parte importante da economia local, sendo responsáveis por cerca de 31% de todos os bens e serviços produzidos na área metropolitana de Nova York, segundo David Dyssegaard Kallick, diretor da Immigration Research Initiative, um grupo de pesquisa sem fins lucrativos. Ainda que os benefícios de aposentadoria sejam principalmente determinados pelo governo federal, autoridades locais buscam fornecer assistência médica e serviços de apoio aos imigrantes, independentemente de seu status legal.
A NYC Aging, uma agência da cidade com um orçamento anual de US$ 523 milhões (R$ 2,5 bilhões), continuará a fornecer refeições gratuitas e outros programas para idosos, mesmo quando a cidade enfrenta uma crise fiscal, incluindo os custos de abrigar migrantes que buscam asilo, disse Edgar Yu, um porta-voz. Mas isso não é suficiente para atender às necessidades da crescente população idosa, disse a vereadora Crystal Hudson, uma democrata do Brooklyn que, como presidente do comitê de envelhecimento do conselho, apontou que menos de 1% do orçamento geral da cidade é gasto em serviços para idosos.
As dificuldades dos imigrantes idosos acrescentaram uma camada adicional ao debate sobre imigração, com alguns críticos afirmando que isso é resultado de políticas federais que falharam em desestimular a imigração ilegal e atrair mais trabalhadores altamente qualificados. Curtis Sliwa, fundador dos Guardian Angels, que concorreu à prefeitura em 2021, protestou contra migrantes indocumentados, mas disse que “não será possível deportá-los aos 75 ou 85 anos”, especialmente quando “muitos deles podem nem ter um lugar para voltar”.
A maioria desses imigrantes mais velhos chegou em ondas nas décadas de 1970, 1980 e 1990, após mudanças significativas na lei de imigração federal que suspenderam cotas antigas para muitos países e deram início a um período de aumento da imigração global, disse Jeanne Batalova, analista sênior de políticas do Migration Policy Institute, um grupo de pesquisa em Washington. A maioria desses imigrantes antigos se tornou cidadão dos EUA desde então.
Gustavo Rincón chegou a Nova York em 1973, vindo da Colômbia, e mais tarde trabalhou como desenhista na Con Edison antes de se aposentar há mais de uma década com uma pensão. Rincón, agora aos 69 anos, pensou em voltar para Cartagena — “Eu amo minhas raízes, minha cultura”, ele disse —, mas descobriu que estava muito quente e que o padrão de vida local “ainda tem um longo caminho a percorrer” antes de melhorar.
Sara Melendez deixou seus cinco filhos no Equador em 1991 para encontrar trabalho em Nova York e sustentá-los. “Eu estava vivendo dia a dia”, disse a Melendez, falando em espanhol por meio de um intérprete, enquanto recordava o trabalho como costureira em uma fábrica de roupas. Hoje, quatro de seus filhos ainda moram no Equador, junto de 11 netos, mas ela, agora com 89 anos e cidadã dos EUA, mora sozinha em um projeto habitacional subsidiado no Lower East Side.
Melendez, que tem diabetes, disse que fica porque o atendimento médico é melhor do que no Equador. Ela também conta com uma rede de serviços para idosos fornecidos pelo Henry Street Settlement, uma agência de serviços sociais, incluindo um assistente social bilíngue, uma cuidadora de saúde domiciliar, verificações de nutrição e um grupo de apoio emocional para mulheres chamado “Esperanza” (“Esperança”).
A New Immigrant Community Empowerment, um grupo de defesa em Queens que administra programas de treinamento e desenvolvimento profissional, começou a ensinar habilidades financeiras, técnicas e de vida aos imigrantes para ajudá-los a se preparar para o longo prazo. Hildalyn Colón Hernández, diretora adjunta do grupo, disse estar “considerando o envelhecimento deles”, acrescentando que muitos “nunca pensam no futuro”.
A organização tem tentado ajudar Palacios, o idoso pintor de casas, que espera na calçada com outros trabalhadores diários mesmo quando suas pernas doem e ficam dormentes. Ele, que não tem documentos, disse que não voltou para o Equador desde que saiu há quase quatro décadas porque teme que não seja permitido retornar aos Estados Unidos. Lágrimas escorriam por seu rosto ao lembrar que nunca teve a chance de ver seus pais novamente e teve que perder os funerais de ambos.
— Eu vim em busca do sonho americano — disse ele. — [Mas acabei com] arrependimento de que tudo que tentei fazer aqui não deu certo.