Desde 2015, vários franceses prestam assistência aos migrantes, geralmente africanos que fogem da instabilidade de seus países (Jon Nazca/Reuters)
AFP
Publicado em 6 de julho de 2018 às 13h27.
Última atualização em 6 de julho de 2018 às 13h31.
O Conselho Constitucional da França reconheceu nesta sexta-feira (6) que as pessoas que ajudam de forma desinteressada os migrantes em condição ilegal não podem ser julgadas, consagrando desta maneira o "princípio de fraternidade".
Dessa forma, o Conselho Constitucional ordenou aos legisladores que modifiquem antes de 1º de dezembro de 2018 vários artigos de lei que punem a ajuda à circulação e estada de estrangeiros em situação clandestina, agora considerados inconstitucionais.
Em compensação, o Conselho Constitucional reafirmou que a ajuda à entrada irregular de migrantes continua sendo castigada pela lei francesa.
Esta decisão responde a um processo de Cédric Herrou, um agricultor que se tornou símbolo da ajuda aos migrantes na fronteira franco-italiana, condenado pelo "delito de solidariedade".
"É uma grande vitória que proíbe castigar atos puramente humanitários", destacou o advogado Patrice Spinosi, falando à AFP.
Herrou e outro militante foram condenados por terem ajudado migrantes que atravessaram a pé a fronteira com a Itália.
É a primeira vez que o Conselho Constitucional, que vigia a conformidade da lei com a Constituição, reconhece o "princípio de fraternidade", recordando que "o lema da República francesa é 'Liberdade, Igualdade, Fraternidade'".
"Como a liberdade e a igualdade, que são os outros dois lemas de nossa República, a fraternidade deverá ser respeitada como um princípio constitucional pelos legisladores e poderá ser invocada ante as jurisdições", disse à AFP o presidente desta jurisdição, Laurent Fabius.
A maioria dos princípios gerais do Direito francês foi aprovada depois da Segunda Guerra Mundial, e é muito raro que novos sejam aprovados.
Os dois ativistas que recorreram ao Conselho foram condenados pela Justiça francesa por terem prestado auxílio aos migrantes clandestinos no Vale de La Roya, na fronteira entre a França e a Itália, uma rota pela qual transitam diariamente pessoas que buscam refúgio na Europa.
Desde 2015, vários habitantes deste vale prestam assistência aos migrantes, geralmente africanos que fogem da instabilidade de seus países.
Ante os tribunais, Herrou explicou que o que fez foi um "ato político ante o sofrimento de famílias inteiras frente a um Estado que impôs fronteiras, mas que não assume em absoluto suas consequências".
Os legisladores terão de modificar, assim, o artigo 622-1, que castiga a ajuda à entrada, circulação e estada de migrantes em situação ilegal com cinco anos de prisão e uma multa de 30.000 euros.
Em sua decisão, o Conselho determina que se pode ajudar os migrantes com "conselhos jurídicos, alimentos, alojamento e atenção médica (...), ou qualquer outra ajuda que busque preservar sua dignidade e integridade física".
Esta decisão foi tomada em um contexto de grande tensão em relação ao tema da migração.
Na semana passada, os dirigentes da União Europeia (UE) adotaram uma série de propostas para fazer frente à chegada de migrantes, incluindo a criação de centros de controle para migrantes, de caráter voluntário, em solo europeu.
No entanto, vários países rejeitaram abrigá-los em seu território.