Muammar Kadafi enfrentou revoltas populares neste ano (Joseph Eid/AFP)
Da Redação
Publicado em 22 de agosto de 2011 às 09h22.
Redação Central - O líder líbio, Muammar Kadafi, conhecido por suas excentricidades, enfrentamentos com o Ocidente, vaidades sem fim e o mais longevo dos ditadores do continente africano, está cercado após uma rebelião que derrama sangue no país há meses.
Presidente e chefe do Conselho Revolucionário da Líbia, Kadafi nasceu em Sirte em 1942 no seio de uma família de beduínos influente nas esferas do poder.
Seu pai, pastor de camelos, garantiu os estudos primários e secundários do filho. A formação de Kadafi foi completada na Academia Militar.
Em 1º de setembro de 1969, ajudado por um grupo de oficiais, tomou o poder seguindo o modelo egípcio e derrubou o rei Idris quando este visitava Atenas, na Grécia.
Herdeiro do pan-arabismo do ex-presidente egípcio Abdel Nasser, quando chegou ao poder copiou a constituição egípcia e emulou seu lema nacional: "Liberdade, socialismo e unidade".
Assumiu a Presidência do Conselho de Comando da Revolução e proclamou a República Árabe Líbia, que a partir de 1977 adotou o nome de Grande Jamahiriya Árabe Popular Socialista da Líbia.
Sua política girou em torno da unidade do mundo árabe. Por isso buscou alianças que o levaram a sonhar com os Estados Unidos do Saara, e fusões efêmeras com o Egito, Tunísia, Argélia e Marrocos. Em 1971 criou a União Socialista Árabe, único partido no país.
Em 15 de abril de 1973, após um fracassado golpe de Estado, anunciou uma revolução cultural com a inclusão dos chamados comitês populares de base (que atuam como pequenos ministérios).
Dois anos depois, ele superou uma tentativa de golpe de estado causado pelo mal-estar social e no ano seguinte publicou o Livro Verde, uma espécie de Constituição onde defendia a "terceira teoria universal" na qual rejeitava o capitalismo e o socialismo, por considerá-los alheios ao contexto social árabe.
Em 1977, proclamou a República de Massas com a qual tentou dar voz ao povo por meio da criação do Congresso Geral do Povo (fórum legislativo que serve de intermediário entre as massas e a liderança do executivo) e os chamados comitês revolucionários (organizações de base que controlavam a atividade política do país) do novo Estado.
Contrário à paz com Israel, em 1977 se opôs à iniciativa proposta pelo presidente egípcio Anwar Al Sadat.
Em 1984 renovou o Congresso Geral do Povo e criou duas novas secretarias, a de Universidades e de Segurança Exterior. A criação do organismo e a repressão aos dissidentes aumentaram a atividade de grupos opositores, principalmente a Frente Nacional para a Salvação da Líbia, segundo Kadafi, patrocinado por Governos estrangeiros.
Enquadrado por parte dos Estados Unidos na órbita do terrorismo internacional, em abril de 1986 aviões norte-americanos bombardearam Trípoli e Benghazi.
Ao menos 40 pessoas morreram no ataque, entre elas uma das filhas adotivas de Kadafi. Paradoxalmente, a chegada ao poder de Kadafi foi bem recebida pelos EUA e a CIA (órgão de inteligência americano) ajudou-o em três ocasiões a sufocar golpes de Estado.
Com relação à política externa, em 1988, reconciliou-se com a Tunísia e a Argélia e em 1989 aderiu à União Árabe Norte Africana. No que diz respeito à política interna, ele voltou a mandar prender fundamentalistas islâmicos.
Em 1992 a ONU impôs embargo aéreo pela recusa de entregar aos EUA e ao Reino Unido dois suspeitos do atentado contra um avião de Pan Am na localidade escocesa de Lockerbie em 1988, no qual morreram 270 pessoas. Depois da mediação de Nelson Mandela em 1999, Kadafi entregou os líbios para que fossem julgados.
Em tentativa de aproximação com o Ocidente, em 2002, ele anunciou a detenção na Líbia de membros da Al Qaeda que eram acusados pelos atentados contra os EUA em 2001, apesar de ter se mostrado contrário ao ataque dos EUA contra o Iraque.
Além disso, em 2004 anunciou a indenização às vítimas (160 ao todo) do atentado contra a discoteca berlinense "La Belle" em 1986, do qual foram acusados os serviços secretos líbios, como parte de seus esforços para retornar à comunidade internacional
Esse ano 2004, o Governo líbio e os familiares das 170 vítimas do atentado contra o avião da companhia UTA em 1989, que a Líbia também foi culpada, assinaram em Paris um acordo de indenização de US$ 1 milhão, o que melhorou os laços entre Paris e Trípoli. Pouco depois, os EUA levantaram várias sanções.
No final de 2010, relatos de diplomatas americanos divulgados pelo site Wikileaks classificaram o líder como "volúvel e excêntrico", afetado por graves fobias e de atuar conforme seus caprichos.
Em fevereiro de 2011, por causa dos protestos populares na Tunísia e no Egito que acabaram com seus respectivos regimes, enfrentou uma revolta similar contra si e em menos de duas semanas as forças da oposição assumiram o controle de 85% do país.
Os protestos, que foram violentamente reprimidos pelas forças de segurança, causaram, segundo as organizações humanitárias, ao menos 10 mil mortos, situação que levou em março a intervenção militar de uma força internacional da Otan.
Kadafi continuou negando ter perdido o controle da situação na Líbia, diante da justificativa de que "tinha o amor do povo", apesar de ter sido isolado pela comunidade internacional e estar entrincheirado no quartel-general de Trípoli ao lado de seus filhos.
Em maio de 2011, após o país estar imerso no conflito civil, o Tribunal Penal Internacional emitiu ordem de detenção contra ele, seu filho Saif al Islam e o diretor da inteligência militar do regime, seu cunhado Abdullah al Senussi, por supostos crimes de lesa-humanidade.