Morte de Kadafi: ditador deixou seu palácio no dia 22 de agosto (Mahmud Turkia/AFP)
Da Redação
Publicado em 20 de outubro de 2011 às 14h53.
Conhecido por suas excentricidades e por um estilo político no mínimo controverso em 42 anos de onipresente ditadura, o ditador deposto da Líbia, Muammar Kadafi, cuja morte foi anunciada nesta quinta-feira pelas tropas rebeldes do Conselho Nacional de Transição (CNT), encontrou refúgio apenas em sua cidade natal, Sirte.
Com paradeiro desconhecido desde a notícia de que no dia 22 de agosto teria deixado o palácio de Bab Al Azizia em Trípoli, Kadafi havia sido acolhido pela tribo Gadadfa, das qual era membro.
Sirte, cidade à qual costumava levar governantes e outros hóspedes internacionais para as celebrações com as quais tentava edificar sua imagem de líder africano e pan-árabe, foi seu último reduto.
Todos os suntuosos palácios e avenidas da cidade com as quais em sua megalomania pretendia impressionar seus hóspedes foram testemunhas e locais dos violentos combates que devastaram a cidade e explicam a ferrenha resistência dos últimos combatentes pró-Kadafi, que se mantiveram leais até o fim.
Seus caprichos sem fim não lhe renderam simpatias nas capitais árabes ou ocidentais, e seus aliados dos países africanos, muitos dos quais receberam dele doações e também intromissões, não foram suficientes para evitar este desfecho.
Nascido em 1942 e criado em uma família de pastores de camelos, Kadafi conseguiu estudar para chegar à Academia Militar, onde aprendeu sobre doutrinas de liderança. Ele assumiu o poder na Líbia após um golpe de Estado em 1º de setembro de 1969, quando derrubou o rei Idris I, no poder desde a independência do país, em 1951.
Seu confonto com os Estados Unidos teve um episódio bélico com os bombardeios, em 1986, de seu palácio em Trípoli e da cidade portuária de Benghazi por ordem do então presidente americano, Ronald Reagan, em represália a um atentado terrorista em uma discoteca berlinense frequentada por militares norte-americanos.
A escalada teve seu ápice com a aprovação de sanções em 1992 pelo Conselho de Segurança da ONU devido à recusa de Kadafi de entregar dois suspeitos do atentado ao avião da Pan Am em Lockerbie (Escócia), em 1988, no qual 270 morreram.
O desmoronamento de sua 'Yamahiria' (República) Árabe Líbia Popular Socialista, com uma fuga do posto de seus principais dirigentes, incluindo seus familiares, revelou um regime de latrocínios e repressão completamente inerte e incapaz de combater os rebeldes.
Sua presença em Sirte, explica agora seu empenho em defender este reduto desde o início dos combates, há oito meses, e a fragilidade de suas tropas na capital Trípoli, muito castigadas pelos bombardeios da Otan.
Na fuga para Sirte, ele perdeu seu filho Hamis, encarregado da frente militar, morto nos combates de 29 de agosto. Além disso, sua mulher Safia e três de seus filhos - Mohammed, Aníbal e Aisha - se exilaram na Argélia.
De Seif al Islam, pouco se soube nos últimos dias, a não ser esporádicos apelos à guerra. Já outro filho de Kadafi, Mustasam, assessor de segurança nacional desde 2010, também teria sido capturado nesta quinta, de acordo com o conselho rebelde que agora governa o país.
Entre suas 'genialidades' políticas - além de seu Livro Verde - em torno da unidade do mundo árabe, Kadafi quis estabelecer alianças que o colocariam à frente de uma espécie de 'Estados Unidos do Saara', ou efêmeras fusões com Egito, Tunísia, Argélia e Marrocos.
Enquanto o chefe do clã dedicava o tempo ao culto a sua personalidade, seus filhos acumulavam propriedades suntuosas, pouco de acordo com uma república popular, e desfrutavam de amplos contatos nos circuitos internacionais de poder e dinheiro.
Implacável na repressão de qualquer dissidência, ele conseguiu sobreviver ao embargo ao qual foi submetido, e apesar de seus contatos clandestinos desde 1984 com a rede de tráfico nuclear do engenheiro paquistanês A.Q. Khan, em 2003, Estados Unidos e Líbia iniciaram uma aproximação depois do anúncio da desistência de Kadafi ao desenvolvimento de armas de destruição em massa.
Sua saída do chamado 'eixo do mal' culminou na troca com Washington de embaixadores em 2008, mas sua aproximação de um Ocidente ávido por provisões de petróleo não evitou que a repressão interna despertasse uma rebelião popular que acabou com seu regime.