Ex-mordomo: em 19 de maio foi publicado o livro "Sua Santità", com 100 novos documentos vazados do Vaticano e, em 24 de maio, Gabriele foi preso (Alberto Pizzoli/AFP)
Da Redação
Publicado em 1 de outubro de 2012 às 14h14.
Cidade do Vaticano - Com o interrogatório de Paolo Gabriele, de 46 anos, o ex-mordomo do papa, será retomado amanhã, terça-feira, no Vaticano, o julgamento em que Gabriele foi acusado de roubar centenas de documentos confidenciais enviados a Bento XVI, pelos quais pode ser condenado a até quatro anos de prisão.
O julgamento, que começou o passado 29 de setembro, se retomará às 9h locais (4h de Brasília) de amanhã na sala do Tribunal de Justiça do Vaticano, com a presença dos juízes Giuseppe della Torre, Paolo Papanti Pelletier e Venerando Marano, encarregados de julgar o mordomo que confessou ter traído a confiança do pontífice.
A audiência de amanhã, segundo foi informado na anterior, será dedicada ao interrogatório de "Paoletto", como é conhecido Gabriele.
Não se descarta que possam ser chamados também algumas das 13 testemunhas convocados, entre elas, o secretário particular de Bento XVI, o sacerdote alemão George Gänswein, de cujo escritório tirou Paoletto os documentos que depois filtrou à imprensa e publicados no livro-escândalo "Sua Santità", do italiano Gianluiggi Nuzzi, que revela enfrentamentos e intrigas vaticanas.
Para o julgamento também estão convocados como testemunhas Cristina Cernetti, uma das laicas que fazem parte da chamada "Família Pontifícia", que cuida do apartamento papal, e o chefe da Gendarmaria Vaticana, Domenico Giani.
Estarão também o padre da Secretaria de Estado Carlo Maria Polvani, e o vicecomandante da Guarda Suíça, William Kloter. As outras testemunhas são agentes da Gendarmaria Vaticana.
Gabriele, que no primeiro dia de julgamento manteve atitude impassível, ausente e fria e só em um momento de descanso foi visto sorrindo, é defendido pela advogada italiana Cristiana Arru.
Junto com Paoletto, casado e pai de três filhos, também será julgado o técnico de informática Claudio Sciarpelletti, de 48, acusado de encobrimento, mas já na primeira audiência o tribunal decidiu separar ambos os casos.
Sciarpelletti, que pode ser condenado a até um ano de prisão, será julgado quando for concluído o julgamento a Gabriele.
O tribunal espera concluir o julgamento de "Paoletto" no final desta semana, após realizar quatro sessões.
Embora Gabriele já tenha se declarado culpado, isso não influenciará os juízes, já que quem se confessa culpado - segundo fontes judiciais vaticanas - pode estar na realidade encobrindo outras pessoas.
O ex-mordomo, que foi preso em 24 de maio e passou 53 dias detido em uma cela do Vaticano, perto da casa onde vive com sua esposa e três filhos, disse aos investigadores que roubou e divulgou os documentos para ajudar Bento XVI.
"Vendo mal e corrupção por toda parte na Igreja, estava convencido de que um impacto midiático (a publicação dos documentos) podia ser bom para levar de novo à Igreja ao bom caminho", afirmou.
"Paoletto" disse ainda que se sentiu "levado pelo Espírito Santo", que lhe pedia isso.
As declarações das 30 de pessoas interrogadas pela Comissão Cardenalicia criada pelo papa para investigar o escândalo, presidida pelo cardeal espanhol Julián Herranz, não serão utilizadas no julgamento.
Isso porque, segundo decidiu o tribunal, essa Comissão Cardenalicia foi criada segundo o Código de Direito Canônico e só pode responder diante do Pontífice, enquanto o julgamento se desenvolve segundo o Código Penal do Estado da Cidade do Vaticano.
O escândalo, conhecido como "Vatileaks",começou no início do ano, quando um canal de TV italiano divulgou cartas enviadas a Bento XVI pelo núncio nos Estados Unidos, o arcebispo Carlo Maria Viganò, em que denunciava a "corrupção, prevaricação e má gestão" na administração vaticana.
Em 19 de maio foi publicado o livro "Sua Santità", com 100 novos documentos vazados do Vaticano e, em 24 de maio, Gabriele foi preso.
Além do roubo de documentos, entre o material retido com "Paoletto" foi encontrado um cheque a nome de Bento XVI com um valor de 100 mil euros, presente da Universidade Católica de Múrcia (Espanha).
Durante a primeira audiência, o Promotor de Justiça do Vaticano, Nicola Piccardi, detalhou que o cheque foi entregue ao papa em Havana, durante sua visita a Cuba, em março.
O julgamento não encerra as investigações sobre o roubo de documentos nem se exclui a possibilidade de que o mordomo tenha cúmplices e até mesmo ordens internacionais.