O presidente da Fifa, Joseph Blatter: meta das campanhas de países para sediar a Copa, diz australiana, era descobrir o que faria cada membro da Fifa feliz e não ter o melhor projeto técnico (MICHAEL BUHOLZER/AFP)
Da Redação
Publicado em 21 de junho de 2015 às 12h36.
Genebra - A meta das campanhas de países para sediar a Copa do Mundo era descobrir o que faria cada um dos membros da Fifa feliz e não ter o melhor projeto técnico. Quem faz a revelação é Bonita Mersiades, executiva do alto escalão da candidatura fracassada da Austrália para receber o Mundial de 2022.
A Fifa vive há três semanas um terremoto diante da prisão de cartolas e das revelações de que o FBI suspeita que governos e países compraram votos de membros do Comitê Executivo da entidade que escolheu as sedes das Copas. Entre aos Mundiais sob suspeita estão os de 1998, 2002, 2010, 2018 e 2022.
Agora, uma das líderes de uma das campanhas para receber a Copa relata detalhes de como agiam para conseguir votos na Fifa. "O objetivo era fazer o dirigente feliz e descobrir o que é que lhe agradaria", contou Mersiades. "Isso era mais importante do que ter um projeto perfeito para a Copa do Mundo ou um legado".
Ela chegou a ser entrevistada pelo investigador da Fifa, Michael Garcia, e garante que repassou a ele informações importantes. Algumas delas poderiam por si só invalidar o processo de escolha das sedes. Mas acabou sendo traída pela cúpula da Fifa e, apesar do depoimento ter sido secreto, o seu nome foi revelado ao público pela entidade no ano passado. Sua tese é de que teve seu nome revelado como punição por ter entregue as práticas das candidaturas e dos cartolas em Zurique.
Segundo ela, em 2009 os australianos chegaram a gastar US$ 2,5 mil para dar um colar de pérolas para a mulher de um vice-presidente da Fifa, Jack Warner. Outras esposas também receberam presentes parecidos. Em outra ocasião, ela conta como os australianos pagaram US$ 300 mil para que a seleção sub-20 de Trinidad e Tobago viajasse para um torneio em Chipre. Quem recebeu o dinheiro das passagens e da operação foi justamente a agência de propriedade de Warner.
Ela ainda contou como o então primeiro-ministro australiano, Kevin Rudd, viajou até o Caribe para se reunir com Warner. Na viagem, o debate seria o presente que ele levaria. A ideia do político era uma garrafa cara de vinho. Mas ele foi desaconselhado e, no lugar de uma só garrafa, o presente foi substituído por uma caixa inteira de vinho. "Existia a candidatura oficial, que era a dos cadernos de encargos e todo o processo burocrático, e depois existia a candidatura extra-oficial, que envolvia tudo isso", contou.
Ela diz que nunca conversou sobre a candidatura da Austrália com Ricardo Teixeira. Mas confessou que sua equipe havia montado um dossiê sobre o brasileiro. "Você pode ter certeza que eu sei tudo sobre ele. Onde tem suas fazendas, quais são seus hobbies e até que ele tem interesse especial por certos assuntos. Fizemos um mapeamento completo de Teixeira e do que lhe agradava".
Segundo ela, tudo isso poderia ter sido legítimo. "O problema é que, ao final, o sistema convidada a que os países buscassem agradar o eleitor e não estabelecer um sistema pelo qual o melhor venceria".
Teixeira era acompanhado pelo lobista Fedor Radmann, que se ocupava em agradar e convencer o brasileiro da candidatura australiana. Se a Austrália fosse escolhida, o consultor levaria US$ 3,6 milhões. Radmann já havia trabalhado na candidatura polêmica da Alemanha para a Copa de 2006 e acabou sendo demitido em 2003 diante de um escândalo de conflito de interesses que foi revelado.
Para Mersíades, a realidade das candidaturas revela que apenas mudar Joseph Blatter não será suficiente para romper com uma estrutura de poder na Fifa. "A reforma precisa ser completa, inclusive da forma pela qual países apresentam suas candidaturas".