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Europa se prepara para nova invasão de Putin em 5 anos, diz analista

Europeus temem que Putin ataque outros países após um possível acordo de paz na Ucrânia

Para o professor da ESPM, Trump joga com a teoria de que sabe qual será o próximo passo de Putin (Aleksey Babushkin/AFP)

Para o professor da ESPM, Trump joga com a teoria de que sabe qual será o próximo passo de Putin (Aleksey Babushkin/AFP)

Publicado em 19 de março de 2025 às 10h19.

Última atualização em 19 de março de 2025 às 10h20.

Mesmo que a Guerra da Ucrânia acabe, os europeus seguirão com uma preocupação: o que impedirá que Vladimir Putin decida invadir outros países nos próximos anos?

"É um consenso entre as inteligências dos governos europeus e também dos Estados Unidos, antes da volta do Trump, de que em até cinco anos Putin vai se preparar para agir militarmente de novo contra algum país europeu", diz Gunther Rudzit, professor de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e especialista em segurança internacional, em entrevista à EXAME.

"Não é à toa que as três Repúblicas Bálticas (Lituânia, Letônia e Estônia) e a Polônia anunciaram que devem sair do Tratado de Ottawa, que bane minas terrestres. Isso é uma clara evidência de que eles estão se preparando para uma futura invasão russa", aponta.

Outros sinais claros são o debate na Alemanha sobre aumentar o endividamento público para poder se rearmar, e o premiê da Polônia, Donald Tusk, declarar publicamente que o país precisa debater a obtenção de uma arma nuclear. "Se nós tivéssemos uma arma nuclear, nós não estaríamos nessa situação", disse Tusk.

Rudzit é mestre em Segurança Nacional pela Universidade Georgetown, de Washington, e doutor em Segurança Internacional pela USP. Também foi assessor do Ministério da Defesa. Veja abaixo mais trechos da entrevista

Como avalia o cessar-fogo parcial na Ucrânia? Podemos considerá-lo como uma vitória de Trump?

É um ganho dele, mas não é um cessar-fogo. O presidente Putin se comprometeu a não atacar mais a infraestrutura elétrica da Ucrânia. No campo de batalha a guerra continua, ela não parou. A meu ver, foi uma forma de tentar ajudar Trump a ter uma narrativa de vitória, mas que, na verdade, não é vitória para Trump e muito menos para a Ucrânia.

Como você vê as chances de fim deste conflito?

Enquanto o presidente Putin não conquistar aquilo que ele considera o mínimo para salvar a sua narrativa, para justificar todas essas mortes, ele não vai chegar ao cessar-fogo, muito menos a um acordo de paz. Tudo depende do resultado do campo de batalha e dos objetivos que o presidente Putin quer alcançar. Sempre é bom lembrar que a guerra é a continuação da política por outros meios. Toda guerra tem um objetivo político a ser alcançado. Putin não conseguiu o objetivo inicial que era derrubar Zelensky e colocar um governo fantoche no poder. Depois, passou a controlar territórios, "desnazificar" a Ucrânia e impedir ela de entrar na Otan. Tudo isso o presidente Trump aceitou. Agora, o quanto de território que Putin quer, aí é que vai ser o problema para Trump.

Gunther Rudzit, professor da ESPM e especialista em segurança internacional (Divulgação)

Que tipo de ações o governo Trump poderia tomar a partir de agora?

O que efetivamente o governo Trump quer é meio difícil de saber. Se o presidente Trump souber o que ele quer, já é um bom sinal, porque ele emite sinais bastante contraditórios. Podemos especular, no máximo, que ele queira efetivamente um cessar-fogo definitivo, que as pessoas parem de morrer. Na verdade, ele está construindo uma narrativa para sua candidatura ao Prêmio Nobel da Paz. Se for isso, vai ser muito difícil. A Ucrânia aceitou tudo, todas as imposições. Agora é Putin que está se aproveitando dessa situação, como o presidente Zelensky chamou a atenção naquela sexta-feira na Casa Branca. A bolha de desinformação do Putin é muito grande. O quanto esse governo Trump está sendo levado por essa bolha é a questão central. Repare, quem está negociando, quem foi para Moscou, não é o general Keith Kellogg. Esse é profissional. Trump mandou Steve Witkoff, um empresário que não tem experiência nisso. Fica difícil.

Trump tem repetido uma oferta de normalizar relações comerciais com a Rússia. Isso seria uma grande vitória para Putin depois de tantas sanções econômicas?

A economia russa está em modo de guerra, por isso que voltou a crescer. Putin sabe que vai ter problemas quando essa guerra acabar porque não vai poder desmobilizar completamente as forças, pois isso desacelera a economia, que sobreviveu com a ajuda chinesa. Pequim foi a grande responsável pela manutenção da economia russa funcionando, principalmente a indústria de defesa. Então, se o objetivo disso tudo for, como é a hipótese de alguns, de que essa aproximação com Putin é uma forma de Trump seduzi-lo e aceitar um acordo de paz, com negócios para melhorar a economia e como um instrumento para afastar a Rússia da China, tudo indica que essa estratégia não está funcionando.

Vimos nos últimos dias os europeus anunciando medidas para aumentar o investimento militar. Como avalia esse cenário? 

Assim que tiver no mínimo um cessar-fogo [na Ucrânia], porque acordo de paz eu acho difícil acontecer, começa a contar o relógio para os europeus se rearmarem. É um consenso entre as inteligências dos governos europeus e também dos Estados Unidos, antes da volta do Trump, de que em até cinco anos Putin vai se preparar para agir militarmente de novo contra algum país europeu. Não é à toa que as três repúblicas bálticas [Lituânia, Letônia e Estônia] e a Polônia anunciaram que devem sair do Tratado de Ottawa, que bane minas terrestres. Isso é uma clara evidência de que eles estão se preparando para uma futura invasão russa.  Tem mais um ponto que eu acho importante para explicar o quanto os europeus estão preocupados. Na Polônia, o premiê Donald Tusk falou no parlamento sobre a volta do serviço militar obrigatório para ter 500 mil pessoas nas forças armadas. Ele disse literalmente: 'Se nós tivéssemos uma arma nuclear, nós não estaríamos nessa situação de segurança. Isso é um longo caminho e precisa de consenso'. Ou seja, ele abriu o debate na sociedade polonesa se o país deve ou não buscar uma arma atômica. E a Polônia não pode ter, é membro do TNP (Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares). Então, teoricamente não poderia. Mas eles estão levando tão em sério a perspectiva de uma guerra com a Rússia que essa discussão foi colocada para a sociedade polonesa.

Outro conflito em andamento é o entre Israel e Hamas. O cessar-fogo foi rompido por Israel, com o governo Trump autorizando os ataques. Para onde esse conflito pode caminhar agora?

Infelizmente era até esperado que se rompesse o cessar-fogo. Desde o começo, quando foi anunciado que seria um processo de três fases, e que na segunda fase se começaria discutir o futuro de Gaza, estava claro que iria ter um choque entre a visão israelense e a do Hamas. Israel não aceita de jeito nenhum o Hamas continuar no controle de Gaza, e o Hamas não quer abrir mão. O que alguns analistas israelenses estão levantando é que essa volta da guerra teria começado porque no domingo foi anunciado que o governo Netanyahu estava para demitir o chefe do Shin Bet [o serviço de segurança interna do país], e há controvérsias jurídicas se ele pode fazer isso. Então, como as críticas cresceram sobre isso, e também com a não-libertação de reféns, esses analistas estão colocando que possivelmente essa volta da guerra serve para calar a oposição a Netanyahu.

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