O presidente eleito, Jair Bolsonaro: embaixador chinês no Brasil vê clima como "positivo" em Pequim para o novo governo do Brasil (Adriano Machado/Getty Images)
Gabriela Ruic
Publicado em 1 de dezembro de 2018 às 06h00.
Última atualização em 1 de dezembro de 2018 às 06h00.
São Paulo – O clima na China em relação ao governo de Jair Bolsonaro, parece ter esfriado depois do encontro do embaixador chinês, Li Jinzhang, com o presidente eleito. Pequim, agora, está “escutando e observando” o que acontece em solo brasileiro, disse a EXAME o diplomata, que esteve em São Paulo para o evento “Brasil-China: Propostas Para o Futuro”, realizado pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI)
Desde que intensificou seus esforços rumo à Presidência, Bolsonaro colocou as relações com a China no centro das declarações sobre política externa e disse até que o país teria o desejo de “comprar o Brasil”. Essas falas foram vistas com preocupação por empresários e diplomatas, já que a China é o principal parceiro comercial do Brasil.
Durante a breve entrevista, no entanto, Jinzhang amenizou a tensão entre os países, cuja relação entrou em crise após a confirmação da vitória do candidato e a publicação de um duro editorial do jornal estatal China Daily, espécie de porta-voz do governo chinês. No texto, o jornal deu “alertas” para “lembrar” o presidente eleito da importância desse vínculo.
“Há verdades e inverdades circulando”, disse o diplomata acerca do que é divulgado sobre a ligação entre os países. No entanto, sua “impressão é positiva” no que diz respeito às expectativas do seu país para o novo governo, uma vez que “os laços de cooperação vêm de muitos anos e são benéficos para todas as partes”. E completou: “Não temos argumentos para mudar a relação com o Brasil. Se for para mudar, que seja para fortalecer”.
Brasil x China
Para especialistas ouvidos por EXAME, qualquer rusga com a China não deve ser levada adiante pelo governo eleito. “Abrir um flanco crítico à Pequim é um erro econômico e político muito grande, uma postura totalmente desnecessária”, explicou Anna Jaguaribe, diretora do Centro de Estudos Brasil-China e conselheira do CEBRI.
Anna lembrou que o mundo vive o que chamou de “situação esdrúxula”, e que é a guerra comercial entre os Estados Unidos, de quem Bolsonaro quer se aproximar, e a China. “Os EUA vêm se retraindo no campo internacional”, analisou a especialista, “quem está ativo no mundo hoje são os chineses e são eles que investem na América Latina”.
Segundo ela, a ideia de alinhamento aos EUA “faz pouco sentido quando lembramos que o mundo não está mais dividido entre dois poderes, mas numa multiplicidade deles”. No seu diagnóstico, a equipe que assumirá o Palácio do Planalto a partir de 2019 precisa “atualizar a conversa e analisar os verdadeiros fluxos de poder”. E é frente a esses desafios que o Brasil precisa se situar e “não num mundo que fazia sentido antes da queda do muro de Berlim”.
Já o embaixador José Alfredo Graça Lima, que também está no conselho do CEBRI e atuou como subsecretário para Ásia e Pacífico, encara as declarações de Bolsonaro com um “grão de sal”. “Não acredito que declarações de teor mais político que econômico possam prejudicar uma relação comercial. Aí temos a equipe econômica para dizer que a China é prioridade e não pode deixar de ser”, enfatizou.
Na sua análise, “a relação entre China e Brasil são as melhores, embora isso não impeça que possa haver certas reservas com relação a sistemas específicos, mas a complementariedade que já existe é fruto das vantagens comparativas dos dois países”. “Sempre pode melhorar, mas no caso do Brasil isso só acontecerá quando nos tornarmos mais competitivos com produtos de maior valor agregado”, ponderou.
“Trump Tropical”
O governo chinês se mostrou atento aos movimentos de campanha de Bolsonaro, que chegou a visitar a ilha de Taiwan enquanto deputado, ato visto como provocativo por Pequim. Já em campanha, diferentes declarações criticas aos chineses foram dadas, sugerindo um desequilíbrio nas relações comerciais entre os países.
No dia seguinte da confirmação da vitória de Bolsonaro, e logo após o gesto protocolar de "felicitação" pela eleição, veio o alerta. Chamando o ex-deputado de “Trump tropical”, o China Daily lembrou que o custo econômico da interrupção da parceria entre os países seria “duro para a economia brasileira, que se recupera da pior recessão da sua história”.
“Não acreditamos em suposições de que promessas de campanha são apenas promessas de campanha”, continuou a publicação, “ou que o presidente Bolsonaro irá ‘engolir’ as palavras mais extremas do candidato”. Ainda assim, segue o texto, “esperamos que ele tenha um olhar objetivo e racional” para o país.