Falafel Sahyoun e Falafel Sahyoun: vizinhos, irmãos, e inimigos desde 2006 (Diego Ibarra Sanchez/The New York Times)
EXAME Hoje
Publicado em 15 de setembro de 2017 às 21h25.
Última atualização em 15 de setembro de 2017 às 21h25.
Beirute – “Falafel Sahyoun” lê-se no toldo de uma loja. “Falafel Sahyoun” lê-se no toldo do outra. Elas estão bem ao lado uma da outra. Apenas uma parede separa as duas. E pouco as diferencia.
Ambas têm tubos de luzes brilhantes, espelhos nas paredes, bolas de falafel borbulhando em óleo. E em ambos os balcões estão pilhas de pão, além de tigelas de aço brilhante cheias de rabanete, salsinha e um molho de gergelim batido, conhecido como tarator.
Até mesmo os menus são idênticos.
Sanduíche normal.
Sanduíche extra.
Dúzia de falafel.
Tarator pequeno.
Tarator grande.
Refrigerantes.
Iogurte.
Mas a rivalidade é profunda e tão antiga quanto qualquer uma nesta parte do mundo: irmão contra irmão, falafel contra falafel.
“Meu irmão? Eu quero que ele fique longe de mim”, garante Zuheir Sahyoun, o mais velho dos irmãos Falafel Sahyoun, com a camisa de chef aberta até o meio da barriga, numa tarde quente.
“Eu não tenho mais irmão”, revela Fuad Sahyoun, o mais novo, ao lado.
Antes havia apenas uma loja Falafel Sahyoun. Foi aberta pelo pai, Mustapha Sahyoun, na Rua de Damasco, logo acima do centro da cidade.
O falafel era considerado o almoço da classe trabalhadora, e a Falafel Sahyoun atendia a todos.
Mounjad al-Sharif era uma criança na época. Nas férias escolares, ele e seus amigos vinham buscar um sanduíche de falafel, ver um filme no Automatique e, se tivessem dinheiro, voltar para casa de bonde.
A longa e amarga guerra civil de Beirute matou a Falafel Sahyoun. A loja fechou as portas em 1978, quando a batalha piorou, e essa parte da região se tornou a linha de frente de uma cidade dividida, onde milícias rivais instalaram seus atiradores.
No ano em que a loja fechou, Mustapha Sahyoun morreu. A linha do bonde foi extinta há tempos, assim como o Automatique.
A Falafel Sahyoun reabriu em 1992, depois que a guerra terminou – e se dividiu em duas em 2006, quando Fuad Sahyoun saiu da sociedade. Ele se recusa a explicar o porquê, dizendo apenas que foi para manter sua “paz mental”.
Zuheir Sahyoun aponta para a esposa de seu irmão. “A mulher dele conspira na cama”, resmunga.
“O meu negócio não foi afetado. Eu tenho os mesmos clientes. Até mais”, acrescenta Zuheir.
A loja de Zuheir tem uma coroa azul como seu logotipo. A de Fuad tem uma coroa amarela.
Na hora do almoço, as pessoas vão para uma ou para outra. Elas saem com sacos de sanduíches, ou os abrem atrás do volante de seus carros.
Zuheir insiste que a sua é a loja original e usa a mesma receita do pai. Ele mantém uma foto de Mustapha atrás da caixa registradora. “Diga ao seu motorista ‘Sahyoun’, e ele saberá exatamente onde deve te trazer”, diz.
Fuad refere-se à loja ao lado como “um fóssil”.
Ele tem uma foto do cantor Bryan Adams comendo o seu sanduíche de falafel.
Do outro lado da rua ainda está em pé um antigo prédio de escritórios, esvaziado pela guerra, com as janelas explodidas como bocas abertas de frente para as duas Falafel Sahyoun.
Al-Sharif, que agora é documentarista, ainda vem regularmente, mas apenas para a loja de Fuad. Os falafels de lá são mais leves e melhores para o estômago e valem as 500 libras libanesas a mais, afirma ele.
Essa é uma diferença entre as lojas. O sanduíche regular de Zuheir custa três mil libras libanesas, equivalente a 2 dólares. O de Fuad custa 3.500 libras libanesas. O sanduíche normal de Fuad também tem quatro bolas de falafel, enquanto o Zuheir tem três.
Al-Sharif consideraria tentar a outra Falafel Sahyoun?
“Não. Por que arriscar?”, pergunta. Ele limpa um pouco de molho do lado de seus lábios e oferece um conselho.
“Há duas coisas na vida: quando você quer comer, coma bem. Quando quiser desfrutar, desfrute. Na próxima semana, não sei. Posso estar morto”, filosofa.
Youmna El Zein, turista que veio do Senegal com os quatro filhos, escolhe a loja de Zuheir. Seus primos libaneses lhe disseram para vir a esta Sahyoun, diz ela.
Samir Simon é menos exigente. É apenas falafel, afirma. “Este lugar, aquele lugar – não importa para mim. Eu vou para qualquer um. Não sei a diferença. É a mesma coisa”, explica.
Os irmãos têm uma coisa em comum. Ambos gostam de filosofar.
“O mais importante na vida é que a mente esteja em paz. Se a sua mente não está em paz, nada do que você faz tem sentido”, diz Fuad.
“A unidade te fortalece”, afirma Zuheir. Logo que seu irmão partiu, ele quis que os dois pudessem voltar a trabalhar juntos, mas agora parou de desejar, garante.
Ultimamente, a briga teve uma virada desagradável.
Fuad pendurou em sua loja uma notificação ampliada do departamento de saúde, penalizando a loja de Zuheir por uma violação de código. Tem uma flecha vermelha apontando para a loja de Zuheir. “Ele joga sujo”, diz Zuheir.
O que ele faria para se vingar do movimento de seu irmão? Nada, Zuheir afirma e aponta o dedo indicador para o céu. Depois, dá uma tragada em seu cigarro.
Somini Sengupta © 2017 New York Times News Service
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