O presidente cubano Raúl Castro (E) e o presidente americano Barack Obama: Kerry abrirá formalmente nesta sexta-feira a embaixada, onde hasteará novamente a bandeira americana (Mandel Ngan/AFP)
Da Redação
Publicado em 11 de agosto de 2015 às 17h33.
Pela primeira vez desde 1959, opositores cubanos protestaram em Havana contra o presidente Barack Obama porque temem perder seu principal aliado em função do restabelecimento dos laços diplomáticos bilaterais e a visita histórica à ilha do secretário de Estado americano, John Kerry.
Cerca de 90 opositores cubanos, entre eles meia centena de Damas de Branco, foram detidos no domingo em Havana após protestarem com máscaras do presidente americano contra a reabertura da embaixada americana.
Kerry abrirá formalmente nesta sexta-feira a embaixada, onde hasteará novamente a bandeira americana (retirada em 3 de janeiro de 1961), colocando simbolicamente o fim do último vestígio da Guerra Fria na América, oito meses depois de Obama e seu colega cubano Raúl Castro anunciarem o fim de meio século de conflito entre ambos países.
"Ele (Obama) tem a culpa pelo que está acontecendo (em Cuba), o governo cubano se encorajou com as negociações com Washington", declarou o ex-preso político Ángel Moya durante o protesto.
"Como todos sabemos, a partir do dia 17 de dezembro será anulado todo o tema Cuba, realmente há muitas pessoas a favor, outros consideramos que o processo deveria estar condicionado" a avanços nos direitos humanos, disse à AFP o dissidente Antonio Rodiles.
"O tema da promoção da democracia ficou em um segundo plano e se falou muito sobre a promoção de negócios e investimentos estrangeiros", completou Rodiles, outro dos organizadores do protesto contra Obama.
Em Cuba, durante mais de meio século, todos os protestos contra o presidente dos Estados Unidos - desde Dwight Eisenhower (1953-1961) até George W. Bush (2001-2009), passando por John F. Kennedy (1961-1963) e Ronald Reagan (1981-1989) - haviam sido organizadas pelo próprio governo comunista de Fidel Castro (que entregou o mandato a seu irmão Raúl em 2006 por motivos de saúde).
Aproximação com os EUA rompe com a inércia
As manifestações mais numerosas contra os Estados Unidos ocorreram na época da invasão anticastrista da Baía dos Porcos, em 1961, que constituiu a "primeira derrota do imperialismo na América Latina", segundo Fidel Castro; assim como nos dias do êxodo de Mariel, em 1980; e mais recentemente durante a saga de sete meses pelo regresso à ilha do menino "barqueiro" Elián González, de novembro de 1999 a junho de 2000.
Contudo, nem todos os dissidentes estão contra a normalização dos laços com Washington, o que causou, mais uma vez, a discórdia entre os opositores cubanos, que jamais conseguiram ter uma plataforma comum após a revolução de 1959.
"Eu sou do setor que acredita que isto é bom para Cuba (...) porque tira a pressão que o regime tratou de manter durante 50 anos para explicar sua imobilidade, e esta pressão estava relacionada às diferenças com os Estados Unidos", declarou à AFP o dissidente moderado Manuel Cuesta Morúa.
"A normalização com os Estados Unidos é um passo positivo para Cuba por uma razão: cria uma expectativa, rompe a inércia e abre um espaço para que o povo imagine coisas que podem acontecer de outra maneira, ainda que não aconteçam", disse à AFP Tania Bruguera, que se define como uma "artista plástica que discorda", que esteve presa em dezembro após convocar para uma "performance artística", na qual qualquer cubano poderia dizer o que quisesse diante de um microfone na Praça da Revolução de Havana.
Washington foi o principal apoio político e econômico dos adversários do governo cubano desde os tempos da planificação da invasão da Baía dos Porcos, lançada no dia 17 de abril de 1961, três meses depois de Eisenhower romper as relações diplomáticas com Havana.
Por décadas Washington destinou a cada ano milhões de dólares do orçamento federal para a "promoção da democracia em Cuba", o que facilita que Havana chame os dissidentes de "mercenários" dos Estados Unidos.
No entanto, a maior parte deste dinheiro jamais chega aos dissidentes da ilha, pois fica nos Estados Unidos financiando grupos anticastristas de Miami e a Rádio e TV Martí, emissoras que recebem anualmente milhões de dólares.