"Reservatório de água a gente faz. Mas não faz reservatório de vento", disse a presidente. (Orlando Sierra/AFP)
Da Redação
Publicado em 15 de julho de 2012 às 10h28.
São Paulo - As declarações que a presidente Dilma Rousseff (PT) deu anteontem de desdém em relação à energia eólica e de ênfase à continuidade dos investimentos em hidrelétricas foram consideradas de "infelizes" e "ultrapassadas" a "retóricas" por quem vem trabalhando em apoio à energia alternativa. Dilma falou na quinta-feira em reunião do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, que ela preside, mas com o qual ainda não havia se reunido.
Para o físico Luiz Pinguelli Rosa, secretário executivo do fórum, a observação dela de que não é possível viver só com energia gerada por vento é "retórica". "Nem estamos defendendo isso. Ninguém pode depender de algo que de repente para. A eólica tem de ter back up (reserva). O que no Brasil tem, porque temos hidrelétricas com reservatórios. Elas são o back up", diz.
Complemento
Além disso, afirma o pesquisador da Coppe-UFRJ (instituto de pós-graduação e pesquisa em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro), o País tem as condições ideais para unir as duas energias.
"Há uma curva de complementaridade. Quando temos menos água no Norte, temos mais vento no Nordeste. Mas hoje estamos usando termelétricas para fazer esse complemento às hidrelétricas. O que não é bom, porque elas emitem muito mais gases de efeito estufa. A melhor ideia é usar mais eólica", diz.
Ricardo Baitelo, coordenador da campanha de energia do Greenpeace lembra que as novas hidrelétricas construídas na Amazônia também não têm segurança energética, por usarem fio d'água em vez de reservatório, ou seja, dependem do fluxo do rio. Se ele está cheio, tem energia. Do contrário, não.
"Na época de seca no Rio Xingu, Belo Monte vai gerar de 5% a 10% do que geraria. Dilma usou o argumento de que a eólica não segura (a demanda), mas Belo Monte também não. Toda energia é intermitente. Mas precisamos de algo que preencha onde temos a insegurança", afirma.
Segundo ele, não faz sentido investir em um mesmo tipo de energia só na Amazônia, mas em eólicas em vários cantos do Brasil, uma vez que, apesar de o sistema de transmissão elétrica ser integrado, quanto mais longe, mais caro é levar energia de um lado para o outro do País.
Comentário semelhante veio do Instituto Democracia e Sustentabilidade, do qual faz parte a ex-ministra do Ambienta Marina Silva. "Ninguém defende apenas eólico ou solar. O que nós defendemos e reiteramos com base em estudos que já possuímos é a diversificação da matriz energética, incluindo as hidrelétricas. Ninguém é contra as hidrelétricas, e sim contra essa visão de exclusividade", afirmou a secretária executiva do instituto, Alexandra Reschke.
"A nossa presidente vem demonstrando uma visão bem ultrapassada às vésperas da Rio+20", criticou.
Tabu
Para Pinguelli, apesar da reação "feroz" dela às críticas as hidrelétricas na Amazônia, ao menos ela se dispôs a ouvi-las. "Ainda que responda do jeito que ela pensa. Não vou dizer que a Dilma tenha coincidência com as posições ambientalistas, mas ela ouviu. E é nas discussões que convencemos as pessoas", diz.
Ele afirma achar que, apesar de essas declarações darem um sinal ruim, pode ocorrer uma situação semelhante ao que houve na Conferência do Clima da ONU, em Copenhague, em 2009. Por muito tempo o País disse que não aceitaria metas de redução das emissões de gases-estufa, mas na hora H apresentou-as voluntariamente. "Era tabu, depois foi aprovado. Pode acontecer de novo. Porque ela não manda no país sozinha." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.