Soldados combatem guerrilheiros: para as Farc, a criação de um partido envolve uma série de dificuldades (Luis Robayo/AFP)
Da Redação
Publicado em 12 de novembro de 2012 às 16h08.
Bogotá - As negociações de paz que serão iniciadas entre as Farc e o governo da Colômbia no próximo dia 15, em Havana, caso sejam concluídas, devem obrigar a guerrilha a se tornar um movimento político legal, enquanto as autoridades devem se preparar para garantir a segurança da organização.
Última grande guerrilha ativa na América Latina, as Farc contam atualmente com cerca de 9.000 combatentes que devem ser reintegrados à vida civil, ao mesmo tempo em que terão que responder por suas ações em um conflito armado que já dura meio século.
As experiências anteriores de pacificação de outros grupos guerrilheiros na Colômbia, que concederam anistias gerais, não funcionam como referência nesta ocasião, acreditam os analistas.
"Desta vez, não está sendo negociada uma anistia absoluta. Poderia pensar em um indulto para as tropas, mas os comandos médios e altos devem aguardar julgamento e punição, o que não significa que eles não poderão se beneficiar da redução ou suspensão das penas", disse à AFP Javier Ciurlizza, diretor para a América Latina e Caribe do Instituto Crisis Group.
Neste contexto, o governo do presidente Juan Manuel Santos aprovou este ano no Congresso o "marco jurídico para a paz", um mecanismo que deve ser regulamentado, mas que prevê a suspensão do cumprimento de pena e outros benefícios processuais aos guerrilheiros que entregarem as armas.
No entanto, as sentenças que foram proferidas à revelia para os comandantes das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) implicam a desqualificação política por toda a vida, lembrou Ciurlizza, ao lembrar que o governo deverá encontrar mecanismos que "permitam criar algum tipo de voz política".
Para as Farc, a criação de um partido envolve uma série de dificuldades. Além de ter de atender aos requisitos de número de membros e percentual de votação, Ciurlizza destaca como obstáculo a falta de um programa político claro.
"As Farc não têm um programa com o qual pode dizer a sua definição ideológica. É um movimento muito pragmático que se formou em torno da guerra, apresentado como um pouco marxista, um pouco maoísta, um pouco bolivariano", considerou .
Para Ariel Ávila, pesquisador da Corporação Novo Arco-íris, especializada no conflito armado colombiano, "as garantias judiciais irão marcar um dos debates mais intensos" na mesa de negociação.
"Por um lado, será difícil esperar que, após 50 anos de guerra, o comando das Farc abandone suas armas em troca de anos de prisão. Por outro lado, será muito complexo para a comunidade internacional e para a própria sociedade colombiana aceitar uma negociação que signifique zero prisão", opinou.
O último processo de paz bem sucedido na Colômbia ocorreu em 1990, quando as guerrilhas Movimento 19 de Abril (M-19, nacionalista), o Exército Popular de Libertação (EPL, maoísta) e o Quintín Lame (indigenista) se desmobilizaram e obtiveram uma anistia geral.
O M-19, em particular, conseguiu uma forte representação na Assembleia Constituinte de 1991, que redigiu a Constituição atual, e um de seus líderes, Gustavo Petro, atualmente é prefeito de Bogotá.
Mas, ao mesmo tempo, o M-19 sofreu a devastação do crime político, com o assassinato em 1990 de seu comandante e candidato à presidência na época, Carlos Pizarro.
Neste mesmo ano também foi assassinado Bernardo Jaramillo, potencial candidato presidencial pela União Patriótica (UP), um partido ligado às Farc, que já havia perdido em 1987 outro candidato presidencial, Jaime Pardo. No total, cerca de 3.000 líderes, militantes e simpatizantes da UP foram assassinados no final de 1980.
"A proteção dos líderes e membros das Farc após um acordo de paz é fundamental para o êxito do processo", assegurou Ávila.
Caso superem os obstáculos legais e as Farc consigam garantias suficientes de participação, a guerrilha e o governo terão de lidar com a opinião pública, depois de um processo de paz que expressamente excluiu a sociedade civil, apontou Maria Victoria Llorente, da Fundação Ideias para a Paz.
A maioria dos colombianos "entende este processo como uma negociação política, mas discorda que seja dada aos guerrilheiros participação política e exige que não haja impunidade", disse Llorente.