Tragédia: carro queima em frente à sede da ONU em Bagdá, após explosão em agosto de 2003 (©afp.com / Sabah Arar)
Da Redação
Publicado em 17 de agosto de 2013 às 15h04.
Bagdá - O atentado sangrento ocorrido há 10 anos em Bagdá, o "11 de Setembro da ONU", em que 22 pessoas morreram, levou ao reforço das medidas de segurança, que limitou o contato com os iraquianos.
Em 19 de agosto de 2003, um terrorista suicida detonou um caminhão carregado de explosivos perto do Hotel Canal, onde ficavam escritórios das Nações Unidas, matando o brasileiro Sérgio Vieira de Mello, enviado da ONU, e outras 21 pessoas.
No local do ataque, um dos primeiros deste tipo em Bagdá, pouco mudou em 10 anos.
Uma esquina do hotel continua parecendo como se tivesse sido recém-esmagada por um martelo gigante. O piso dos andares está danificado, e os quartos estão cheios de escombros e cobertos de pó.
O metal oxidado que reforçava as vigas pende da estrutura, e o capacete de um membro das forças de paz das Nações Unidas permanece perto do local da explosão.
Marwan Ali escapou do ataque porque foi para outra parte do prédio momentos antes da explosão. Ele chegou a cair com o impacto, mas não se feriu.
"Nasci de novo", disse Ali, atual diretor de assuntos políticos da ONU no Iraque.
"Imediatamente após a explosão, voltei para ver onde meus amigos estavam e o encontrei morto, com um colega", lembrou Ali, que tentou ajudar os sobreviventes.
"Foi o 11 de Setembro da ONU", disse, referindo-se aos atentados ocorridos nos Estados Unidos em 2001. "Mudou todo o esquema de segurança."
Antes do atentado contra o Hotel Canal e um ataque contra a ONU em setembro de 2003, podia-se viajar por todo o país em um veículo comum.
Depois dos ataques, boa parte dos funcionários da ONU deixou o Iraque. Muitos retornaram, mas a sede da ONU fica na Zona Verde de Bagdá, uma área de segurança máxima, que abriga muitos prédios do governo iraquiano e embaixadas, e cujo acesso é difícil para os cidadãos iraquianos.
A zona é cercada por um muro de cimento e defendida por soldados e tanques americanos, enquanto a sede da ONU é protegida por mais muros e guardas. Quem deixa a Zona Verde é escoltado, e viaja em veículos blindados.
As medidas, principalmente relacionadas ao deslocamento dentro da Zona Verde, limitaram o contato da ONU com os iraquianos, reconheceu Ali.
Os funcionários da ONU mantêm contato com políticos iraquianos e outras personalidades, "mas, praticamente, perdemos o contato com a população", comentou. "O problema dos deslocamentos é fundamental para nós, já que a ONU precisa de contato para saber o que acontece e ter visibilidade."
"É importante que se veja as Nações Unidas ajudando. É o que estamos fazendo, mas as pessoas não vêem", lamentou.
Enquanto o reforço das medidas de segurança cria desafios, a ONU permanece ativa no Iraque, com funcionários em todo o país.
A missão trabalha em temas como a relação entre Iraque e Kuwait, eleições e reconciliação nacional, refugiados sírios, e iraquianos obrigados a fugir por causa da violência.
Salim Lone, porta-voz da missão da ONU em 2003, é outro sobrevivente. No dia do atentado, ele deveria participar de uma reunião no escritório de Vieira de Mello, mas tinha que preparar um discurso e permaneceu no próprio escritório.
"Isso salvou a minha vida", disse Lone, que foi ferido no pescoço. "Salvo uma pessoa, todos que participavam da reunião morreram. Meu escritório ficou totalmente destruído. Havia fumaça por todos os lados, gritos eram ouvidos por todos os lados", lembrou.
Lone não renovou o contrato com a ONU após o atentado, e retornou a seu país, Quênia, onde escreve um livro.
"O ataque me deixou muito introvertido, e, durante anos, minha memória ficou terrível, embora venha melhorando", contou.
A ONU foi alvo em outros países, "mas o primeiro atentado realmente importante foi o do Hotel Canal", afirmou Ali.
Tanto os sobreviventes quanto todo o sistema das Nações Unidas ainda sentem os efeitos da explosão.